sábado, 16 de junho de 2012

Le Marron Glacé: nome francês para um doce italiano.


Caríssimos Confrades e Consórores, tudo bem? Espero que sim.
Estava aqui relendo um material sobre os hábitos alimentares da Família Imperial Brasileira que foi me enviado pelo arquivo histórico do Museu Imperial a meu pedido para fundamentar uns artigos científicos que estou escrevendo... e aproveito esta oportunidade para agradecer, especialmente, à Sra. Fátima Argon, que realizou o levantamento preliminar das comidas e bebidas do século XIX, a partir da Família Imperial do Brasil, cuja pesquisa contou com a colaboração de Átila Beppler Meirelles, Fernanda Moutinho de Almeida e Mônica Salem de Zayas. Meus sinceros agradecimentos a vocês.

No conteúdo do material recebido encontrei muitos fatos interessantes que, ao longo do tempo, irei compartir estas curiosidades com vocês. Começarei isso hoje, revelando uma peculiaridade gastronômica da princesa Isabel: o fascínio da princesa pelos doces.

Trechos extraídos da obra de Guilherme Auler A Princesa e Petrópolis:


Comentários da princesa Isabel sobre a festa de aniversário sua mãe, a Imperatriz Dona Teresa Cristina: [...] “Ontem me diverti muito e também dancei muito. Vou lhes contar o que fiz: primeiro, toquei de quatro mãos com a Mana, dancei a Favorita, a Polca, a valsa lisa e a valsa pulada, o schottish, a varsoviana, duas contra-danças, os lanceiros a galope figurado, tomei sorvete, bebi meia xícara de chá com pão-de-ló."

Na quaresma de 1858 ela confidencia: “Hoje fiz uma verdadeira penitência; como não me deram senão peixe de lata, que não gosto nada, não comi senão arroz de manteiga e batatas”.

“Eu lhe mando estes marrons-glacês para Mamãe, posto que Papai não gosta de castanhas”.

No verão de Petrópolis, em 1860: “Acabo de tomar sorvete; desejava que Papai estivesse aqui para tomar conosco”.

No dia 28/03/1860: “Não vão os figos, porque não se puderam achar em Petrópolis”.

Ao longo dos meus estudos o doce sempre se fez muito presente, principalmente, pelo fato do Brasil já ter sido uma “Açúcarocracia”. Em função disso o nordeste brasileiro, até hoje, exibe sua doçaria com orgulho e revela seu potencial nato para a fabricação de doces.

Porém, é sabido que o povo brasileiro comemora muitas datas especiais com simbologia importada, principalmente vindas da Europa. Não se pode negar este fato, e bata-se olhar para as nossas mesas onde as preparações iram nos denunciar (por conta de suas influências). Assim, hoje tratarei de um dos doces bastante citado nas frases de Isabel, princesa imperial do Brasil, em suas cartas a parentes: o Marrom Glacê.

Marrom Glacê
O Marron Glacê já foi uma sobremesa muito cobiçada em outras épocas: era preparação cara, geralmente importada, e com requeria habilidades de confeiteiros com experiência na técnica delicada do preparo para sair um produto final bem-feito. Se pudesse lhe comparar, bem genericamente, o seu sabor com algum doce típico brasileiro, estaria próximo a um doce de batata doce bem elaborado – mas as castanhas em glacê não devem ter comparações.
Contudo, trata-se de um doce ainda refinado e delicado, preparado a partir das castanhas europeias inteiras. O doce tem nome francês, a escrita original é Marron Glacé. Mas, apesar do nome francês, ele surgiu na Itália.
Acredita-se que o Império Romano já preparava sobremesas semelhantes, onde as castanhas eram cozidas e mergulhadas numa ânfora abundante em mel. Tal doce romano fazia o deleite da bela Amarílis, personagem cantada nas Bucólicas, primeira obra importante do poeta latino Virgílio, entre os séculos 42 e 39 a. C.
Entretanto, a receita contemporânea teria surgido em Turim, no fim do século XVI, na corte dos Savoia, antiga e poderosa família feudal do Norte do país. A ela pertencia Vittorio Emanuele II, o rei que unificou a Itália em 1861.
Mas se o marrom glacê nasceu em terras italianas, por que batizá-lo com um nome francês? 
Em italiano, o doce deveria chamar-se de marrone candito, mas os Savoia julgavam mais elegante falar francês. E assim, o resultado final para batizar o doce que surgiu por acaso, quando um cozinheiro distraído que trabalhava para o duque Carlo Emanuele I de Savoia (1562-1630), cozinhou na calda, em vez de água, as castanhas destinadas ao recheio de um javali.
A história nos conta que a cidade italiana de Turim comprava açúcar de Veneza, também ao Norte da Itália e, por muito tempo, conservou seu monopólio na Europa. Ao ser incorporado pelos confeiteiros da corte de Luís XIV (1651-1715), o marrom glacê adotou cidadania francesa.
Posteriormente, a receita foi aperfeiçoada na Ardèche, pequena região do sudeste do país, com fama de produzir as melhores castanhas. Assim a França se encarregou de difundir este doce pelo mundo como forma de valorizar suas castanhas.
A técnica contemporânea de preparo do doce começa com uma rígida seleção das castanhas: somente as maiores, perfeitas e macias - cerca de 20% de um total - se transformarão em doce.

Depois de descascadas, as castanhas são envolvidas em véu de tule para serem, em seguida, cozidas na água quente por um tempo preciso. Posteriormente, eliminam-se as que não resistiram ao calor e racharam. O passo seguinte consiste em colocar as castanhas numa grelha, onde elas receberão um banho de xarope de açúcar. Depois de alguns instantes no forno, o preparo termina.


Os marrons glacês são acondicionados individualmente em papel alumínio (ou papel manteiga ou em papel encerado) e colocados em embalagem de papelão ou vidro.
Uma variação do doce é apresentá-lo macerado em calda, licor, rum ou cerveja. Existe também o creme de marrons (um tipo de geleia feito com açúcar), o purê de castanhas (o mesmo produto, sem açúcar) e a conserva de castanhas em pedaços.
Não existe relação, entretanto, entre o marrom glacê e o doce homônimo brasileiro, feito à base de batata-doce, xarope de glicose, espessante e acidulante. Não que o doce de bata seja um doce ruim ou sem qualidade. Mas é um marrom glacê tão falso quanto uma nota de três reais.


As castanhas europeias (portuguesas)


Castanheira
A castanha é o fruto de uma árvore de origem asiática, do gênero Castanea. Foi levada para a Líbia e dali se alastrou pela bacia do Mediterrâneo.

Hoje, encontra-se desde o Norte da África à Dinamarca, dos Estados Unidos ao Brasil. Alcança de 20 a 30 metros de altura e passa a dar frutos aos 25 anos. No início, cada pé fornece de 15 a 20 quilos anuais de castanhas. Aos 50 anos, a produção sobe para 80 a 110 quilos.


No Sul da Itália, perto do Monte Etna, o maior vulcão europeu, existe uma castanheira com mais de 400 anos de idade. Isso lhe confere o status de árvore longeva.
O fruto se desenvolve no interior de uma carapaça espinhosa, conhecida como ouriço. No outono, amadurece e despenca dos galhos. Não pode ser comido cru. Só quando assado ou cozido revela suas deliciosas características.
Divide-se em dois tipos: a castanha propriamente dita e o marrom. No primeiro, o ouriço acomoda dois ou três frutos. O marrom nasce solitário.

A castanha-do-Pará (ou Castanha do Brasil) e a castanha de caju têm papéis importantes na economia brasileira. Mas não pertencem ao mesmo gênero. A castanha europeia contém elevado teor calórico: é ainda, rica em proteínas, vitaminas A, B e C; além de ser dotada com sais minerais, magnésio, enxofre e cloro, ajudou populações inteiras de camponeses franceses e italianos do passado a enfrentar a fome no inverno europeu.

Marrom Glacê de Castanha (simples)
Ingredientes:
40 unidades de castanha portuguesa grandes
quanto baste de açúcar

Preparo: Escolha 40 castanhas bem grandes e robustas. Tire as cascas grossas e retire as peles, deitando-as em água fervendo e deixando amolecer. Trabalhe sem deixar a água esfriar. Feito isso, coloque as castanhas, duas a duas, em quadrados de filó, e amarre com linhas, como trouxinhas. Então, pese as trouxinhas e, com o mesmo peso, pese a quantidade de açúcar. Deite as castanhas num tacho cubra com bastante água morna e deixe cozinhar até ficarem bem tenras, que cedam ao apertar com os dedos. Do açúcar, faça uma calda em ponto de pasta, com uma fava de baunilha. Escorra as castanhas e deite-as bem quentes na calda também quente, leve-a a tomar ponto de novo e guarde. No dia seguinte, repita a operação, juntando 1/2 kg de açúcar e guarde. No terceiro dia, leve o tacho ao fogo, apure mais o ponto e retire as castanhas para uma peneira. Junte as partidas, a fim de colocá-las com a calda. Leve de novo a calda ao fogo, tome ponto de açúcar e enrole-os em papel alumínio. No dia seguinte o açúcar se funde e elas ficam no ponto.

Marron Glacê com whisky
Ingredientes:
1 ½ kg de castanhas portuguesas
500 g de açúcar
250 ml de água
1 colher de sopa de whisky
1 colher (chá) de essência de baunilha
Prepare: Coloque as castanhas para cozinhar na panela de pressão; Após a panela pegar pressão, deixe cozinhar por mais 30 minutos; Depois de cozidas, descasque as castanhas e passe-as pela peneira ou pelo multiprocessador e reserve; Em uma panela, coloque a água, o açúcar, o whisky e a baunilha; Leve ao fogo e quando a calda estiver bem dissolvida, acrescente a massa da castanha, sem parar de mexer para não empelotar; Quando estiver desgrudando do fundo da panela, tire do fogo; Coloque em uma vasilha para esfriar e sirva.

Marron-Glacê de Batata Doce
Ingredientes
1 1/2 kg de batata doce
1 kg de açúcar
200 ml de água de coco fresca
2 colheres (sopa) cheias de cacau em pó
2 colheres (sopa) de óleo
1 colher (chá) de essência de baunilha
100 g de coco ralado
Coco ralado ou açúcar para enfeitar
Preparo: Cozinhe as batatas descascadas com 1 colher de açúcar até que fiquem macias, mas não totalmente cozidas. Escorra bem a água e passe no espremedor de batatas. Coloque numa panela a massa da batata doce, adicionando o restante dos ingredientes. Cozinhe em fogo brando, mexendo sempre com colher de pau até soltar do fundo da panela. Deve ficar bem firme. Com uma colher de sobremesa, pegue pequenas porções de massa e enrole na palma das mãos untadas, dando a forma que desejar. Ou, se preferir enforme no formato que desejar. Passe no açúcar ou no coco e deixe secar. Deixe pernoitar na geladeira antes de servir.

5 comentários:

  1. Olá meu amigo,adorei seu blog,simplesmente divino!!!Estava pesquisando sobre Marrom Glacé e aqui me deparei.Eu adoro doces e convido-lhe a conhecer um dos meus blogs(sentindosabores.blogspot.com),espero que aprecie lá tbm,só posto doces :).Gostei muito de sua colocação sobre a tradição nordestina de doces...Bjos e até,parabéns!!!

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  2. Foi uma surpresa pra mim, hoje eu pude conhecer um pouco mais do marrom glacé, já havia comido mas não sabia a sua história.

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  3. ótimo texto! estou produzindo o creme de marrom glacê em Bragança Paulista. por isso resolvi pesquisar um pouco sobre a história do doce e encontrei o teu blog. agora está explicado porque as castanhas glaceadas têm um preço tão elevado... no ano que vem vou tentar preparar delas também. grata _/\_

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  4. Adorei suas informações. Pretendo fazer estes doces para serem apreciados no Natal..

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