Acabo de perceber o
vento soprando do meu ouvido, avisando que a contagem regressiva para o meu
aniversário começou. Isso me fez pensar, automaticamente, em vinho e numa fala
da minha professora do Mestrado em Negócios Turísticos, Dra. Luzia Neide Coriolano,
quando ela explanava sobre como Milton Santos tornou-se um clássico... Fiz uma
analogia maluca, rapidamente, e agora já posso dizer que: EU NÃO ESTOU FICANDO
VELHO, ESTOU ME TORNANDO UM CLÁSSICO. SÓ QUE EU NÃO SOU UM CLÁSSICO QUALQUER.
SOU UM CLÁSSICO COMO A PINOT NOIR – que eu não sou bobo.
Se você gosta de
vinho, e conhece esse tipo de casta, vai saber que tipo de vinho eu sou (ou
estou me tornando). Se não, vou tentar explicar...
Dizem os produtores
de Pinot Noir, nos países que a conseguem produzir, que Deus criou a Cabernet
Sauvignon e o diabo a Pinot Noir (risos). E tem fundamento nisso: A Pinot Noir
não se adapta em qualquer região. É uma casta muito complexa de cultivar, quase
temperamental.
A quem diga,
apreciadores experientes, que a Pinot Noir perfeita e única, só existe numa
região que vale a pena, a Borgonha – local de sua origem na França. Mas outros,
menos xiitas, constatam que pode-se haver boas Pinot Noir na Nova Zelândia e
Califórnia - e até no Brasil (tá, não precisa avacalhar tanto! Mas considerando
que eu sou Pinot Noit, tenho que relevar rsrsrs). Essa divergência de opiniões
não esconde o consenso de que ninguém faz Pinot Noir como a Borgonha. Lá ela
mostra-se mostra soberba, majestosa, insuperável. E assim surge uma
personalidade marcante...
A Pinot noir é uma
casta vigorosa mas que requer equilíbrio e bom cuidado: Apresenta cachos bem
estruturados e de cor violeta profunda, os seus bagos são pequenos, bem
redondos, delicados e de casca fina. Necessita de clima fresco bem equilibrado.
Floresce e amadurece mais cedo. O excesso de frio produz vinhos pálidos e de
sabores pobres. O excesso de calor amadurece a Pinot Noir, provocando sabores e
aromas excessivamente tostados e de geleias, afastando sua marcante elegância.
Trata-se de uma casta
visada e invejada. Conta a lenda que este tipo de uva foi batizado devido ao
formato de seu cacho – semelhante ao um pinheiro de cabeça para baixo. Ela
tornou-se então um “Pinheiro Negro”. É responsável pelo mistério na composição
de vinhos que a leva integral ou como elemento de alquimia e sofisticação para
alguns dos espumantes mais famosos do mundo. Resumidamente, a Pinot Poir um
luxo necessário!
Mapa da Borgonha |
A Pinot Noir
tornou-se uma estrela no momento em que apareceu na composição do famoso
Champagne Dom Pérignon: reza a lenda que o próprio Dom Pérignon favorecia as
uvas tintas em lugar das brancas, dada a sua tendência a dupla fermentação. Mas
o fato era que ainda assim, quando guardado na garrafa, o caldo das Pinot Noir
interrompia sua fermentação com a chegada do Outono, e a recomeçava na
Primavera, originando o gás que conformava, portanto, o primeiro Champagne. À
vezes um estouro – como eu também sou às vezes.
E eu não poderia
deixar de citar os aromas da pinot noir, quando eu mesmo não vivo sem bons
aromas. Em linhas gerais, os aromas primários mais encontrados são: frutas
vermelhas (cereja, framboesa, morango, ameixa), florais (violeta, rosas),
especiarias (alcaçuz, açafrão, canela, orégano, chá verde) outros (vegetação
rasteira, terra molhada, chão de terra, almíscar, azeitona preta). Com o tempo
de guarda, os melhores vinhos podem apresentar: amadeirados (sândalo, incenso,
cedrinho, caixa de charutos), animal (couro velho, suor), outros (ervas,
especiarias, funghi, trufa).
Mas é na boca que o
fascínio da Pinot Noir aumenta. Dizem os especialista do vinho que ela remete
às lembranças, às boas coisas; traz uma deliciosa sensação sedosa; sua acidez
se destaca com taninos e álcool bem equilibrados e discretos; Possui boa
estrutura, intensidade, complexidade e apresenta-se marcante, apesar de seu
corpo ser médio (na maioria das vezes). A passagem por madeira é bem vinda
desde que não destrua sua delicadeza.
A Pinot Noir é uma
casta para ser apresentada sozinha (varietal). Poucas experiências de corte
(assemblage) deram certo. Champagne é uma delas, onde se pode cortar com a
Pinot Meunier e a Chardonnay. Ela pode originar alguns vinhos prontos para o
consumo logo que são engarrafados. Mas os melhores precisam de alguns anos para
evoluir. Os vinhos jovens devem ser consumidos até 05 anos. Os vinhos de guarda
seguem a seguinte linha: de 05 a 12 anos (EUA e Nova Zelândia), de 05 a 20 anos
(Côte D’Or).
Um espumante brasileiro 100% Pinot Noir - aromas sutis de morango e melancia |
Definitivamente, A
Pinot Noir não é uma casta para iniciantes, mas ela é sempre bem-vinda à mesa.
Compreenderam as entrelinhas?
E se você quer preparar
algo para comer e usar Pinot Noir, veja exemplos de compatibilização, por
região:
Borgonha – Os parceiros
ideais são as aves de caça, como o pato, especialmente se servidos com cerejas
cozidas; galinha d’angola, carré de vitela, trufas. Os tintos da Côte de Beaune
combinam mais com caças de sabores suaves como o faisão, javali e coelho.
Enquanto os tintos da Côte de Nuits, precisam de sabores mais marcantes, como o
pombo, pato selvagem, veado e lebre. Não esquecendo do clássico Boeuf à la
Bourguignonne;
Nova Zelândia e Austrália – Combinam com
codorna, pato, peru, presunto e peixes carnudos. Por sinal, Atum e Salmão são
boas escolhas para Pinot Noir mais leves e jovens;
EUA - seguem a mesma compatibilização dos
neozelandeses.
Mais sobre a Pinot Noir
A Pinot Noir é uma
casta tinta, originária da França. Originalmente a Borgonha tem sido seu torrão
natal há mais de 02 mil anos. Os primeiros registros de seu cultivo remetem aos
Gauleses em torno de 150AC. Sua importância e reconhecimento são antigos. Em
1395, o então Duque da Borgonha, Felipe, proíbe o plantio e cultivo da casta
Gamay na Côte D’Or por considerá-la de qualidade inferior, privilegiando a
Pinot Noir.
Por ser tão antiga, a
Pinot Noir originou toda uma família de uvas: Pinot Gris e Pinot Blanc. Além
disso, segundo recentes estudos de DNA, 16 castas distintas têm a Pinot Noir na
sua origem, dentre elas: Chardonnay, Gamay, Melon de Bourgogne (Muscadet) e
Auxerrois (Malbec). O cultivo em outras partes do mundo só começou na década de
1990 (Nova Zelândia, Califórnia, Oregon, Austrália).
No século XV, a Pinot
Noir começa a ser plantada na região que hoje conhecemos como Champagne, mais
precisamente na sub-região de Epernay. Dom Pérignon utilizava apenas Pinot
Noir, alegando que as uvas brancas tinham uma tendência latente à
re-fermentação. Acontece que mesmo assim o vinho produzido possuía uma
instabilidade enorme, tendendo a interromper a fermentação com o início do frio
(Outono) e voltando a fermentar no calor (Primavera). Dom Pérignon acreditava
que guardar os vinhos em barris de carvalho fazia com que eles perdessem os
aromas, portanto, ele os guardava já nas garrafas. Quando a segunda fermentação
ocorria, o gás (dióxido de carbono) ficava retido na garrafa. E assim, segundo
a lenda, nascia o Champagne. Champagne feito somente de Pinot Noir.
Voltando para a
Borgonha... Foi a partir de 1631, com a venda do La Romanée em Vosne pela
abadia de St.Vivant, que os burgueses de Dijon começaram a investir na região.
Rapidamente, o reconhecimento surgiu e os vinhos de Vosne, Chambertin, Clos de
Bèze, Fixin, Volnay ocuparam lugar de destaque para os franceses. A primeira
classificação oficial data de 1861 e deve-se ao Dr. Jules Lavalle, do Comitê
d’Agriculture de Beaune, que a elaborou para a Exposição Universal do ano
seguinte.
Isso posto, só me
resta dedicar-me aos delírios de Baco e preparar algo pra servir um bom Pinot Noir
– oportunidade perfeita pra testar uma receita que vi outro dia na Revista
Prazeres da Mesa, na edição de comemoração pelos 10 anos da revista.
Confit de pato com risoto de Pinot Noir
4 Coxas cortadas junto com as sobrecoxas de
Pato
400 g de banha de porco
300 g de sal grosso
1 maçã ácida
3 dentes de Alho
1 ramo de tomilho
2 folhas de louro
8 pimentas em grão amassadas
óleo de milho
Risoto
1 garrafa de vinho tinto elaborado com a uva
Pinot Noir
300 g de arroz arbóreo
1 cebola grande finamente picada
100 g de manteiga
1 litro de caldo de frango
150 g de queijo coalho cortado em cubos pequenos
100 g de queijo parmesão ralado
1/2 maço de rúcula
1 taça de vinho branco seco
Sal e Pimenta a gosto
Preparo: CONFIT DE PATO - De
um dia para outro coloque as coxas com sobrecoxas no sal grosso. No dia
seguinte retire o sal e lave. Derreta em uma panela a banha de porco. Junte as
coxas com sobrecoxas, a maçã cortada em quatro sem as sementes, os dentes de
alho, o tomilho, o louro e as pimentas em grãos. Cuide para que a gordura cubra
o pato. Cozinhe em fogo baixo por mais ou menos 2 horas. Retire a carne e
frite-a em uma frigideira antiaderente com óleo bem quente. Deixe a pele em
contato com a gordura até ficar bem crocante. RISOTO - Em uma panela deixe reduzir a 1/3 o vinho
tinto Pinot Noir. Reserve. Em outra panela, refogue a cebola em 50 g de
manteiga. Junte o arroz arbóreo e refogue por mais algum tempo em fogo
moderado. Adicione o vinho branco e deixe que se incorpore ao arroz.
Alternadamente, acrescente uma concha de caldo de galinha e uma concha do vinho
tinto reduzido mexendo sempre até chegar ao ponto de cozimento al dente.
Acrescentar o queijo coalho em cubos, o restante da manteiga, o parmesão ralado
e, por último, a rúcula rasgada. Misture os ingredientes até obter uma
consistência cremosa. Tempere com sal e pimenta. MONTAGEM - Sirva a coxa de
pato confit junto com o risoto e decore com alecrim, alho caramelizado e
aspargos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário