Hoje
é 02 de fevereiro, e aqui no Brasil a data comemora no candomblé o Dia de
Iemanjá (Salve Odoyá); enquanto os católicos celebram o Dia de Nossa Senhora da
Candelária, a Senhora dos Navegantes; festividades que também envolvem comidas
de celebração como o mugunzá branco (canjica branca) adoçado com mel (para
Iemanjá) e o pirão de peixe (para a Candelária). Mas você sabia que, na França
essa data é chamada de "Fête de la Chandeleur" (Festa da Candeláriia,
em francês), uma celebração que relembra a Apresentação de Jesus no Templo?
Pois é, mas que na França é também um dia em que se faz festa para comer crepes
e galettes (esse é o nome que se dá para os crepes salgados) por todo o país.
Agora, você deve estar se perguntado o que tem a ver a religião com os crepes?
Antes
que apareça alguém reclamando por eu estar usando “O Crepe’ ao invés de “A Crepe”,
eu devo salientar que essa confusão ocorre pelo fato da palavra crepe vem do francês,
onde o termo é substantivo feminino. Contudo, no português, o substantivo é
masculino. Logo, a maneira correra aqui no Brasil é “O Crepe” – por isso está
assim. Dito isso, volto ao que interessa.
Nossa Senhora da Candelária
Iemanjá
A
Apresentação de Jesus no Templo é um dia religioso comemorado em vários países.
Então, a Festa da Candelária na França, onde também é chamada de Fête des
Chandelles (Festa das Velas), embora hoje ela esteja ligada à religião
católica, tem origens nas antigas religiões a muitos séculos.
Os
Celtas, que também viveram em várias partes da França, tinham uma tradição de
fazer uma procissão cheia de tochas para celebrar Brigit, deusa da fecundidade,
que abençoava as sementes que seriam plantadas em breve. Os romanos retomaram
esse costume e organizavam as Lupercales, que eram procissões com tochas em
honra a Lupercus ou Pan, deus da fecundidade. Era uma forma de comemorar o
final do inverno e a chegada de dias mais clementes e fecundos para a
agricultura.
Lupercalia
Outra
interpretação para a origem de La Chandeleur é que a festa seria dedicada à
deusa Ceres (Deméter na Mitologia Grega), que representava a colheita e não
fertilizava a terra durante três meses, ou seja, no inverno. Uma procissão com
tochas era realizada, lembrando a procura da deusa por sua filha, Proserpina
(ou Perséfone para os gregos), raptada por Plutão (Hades), o deus dos infernos.
A luz das tochas na procissão simbolizava a vitória sobre as sombras da morte.
Nos dois casos de origem pagã, a festa era realizada em torno de 15 de
fevereiro.
Foi em 472 que o papa Gelásio I decide “cristianizar” a comemoração, tornando-a símbolo da Apresentação de Jesus no Templo. Segundo a tradição hebraica, os bebês primogênitos do sexo masculino deveriam ser levados ao templo, quarenta dias após o nascimento, para serem apresentados a Deus. Quarenta dias após o Natal (nascimento de Jesus) cai em 2 de fevereiro.
De
acordo com a Bíblia, um velho homem, Simeão, e a profetisa Ana reconheceram o
menino como Deus, a luz de Israel. Por isso, Gelásio associa a antiga festa
pagã das velas com a comemoração cristã. Nesse dia, é celebrada também a
Purificação da Virgem Maria, outra tradição hebraica que diz que as mulheres
deveriam ser purificadas 40 dias após o parto.
Mas,
onde os crepes entram nessa história? Ocorre que, o papa Gelásio I apropriou-se
a antiga festa pagã dos romanos. Então, no dia 2 de fevereiro, começaram a ser
organizadas em Roma procissões, só que em vez de tochas eram velas bentas. No
século VII, Festa do Candelarum se tornou tão popular, que antes mesmo da
Aurora já havia fiéis chegando à cidade. Aí, para matar a fome dessa multidão,
começaram a distribuir os crepes de trigo ‘candial’ (muito branco).
Essa
tradição dos crepes com a Chandeleur (Apresentação de Jesus no Templo) continua
na França. Na Idade Média, os camponeses iam à Missa pela manhã já com a velas
para serem benzidas. Aí eles voltavam para casa, com a vela acesa, e percorriam
todos os cômodos da residência, para levar luz e prosperidade ao lar. Durante
essa procissão doméstica, a vela deveria ficar acesa. Se ela apagasse, era
sinal de azar. Depois, ela era guardada em uma gaveta e só era retirada dali em
situações dramáticas, como no caso da morte de alguém da família.
No
mesmo dia, à noite, os crepes eram degustados. Pela sua forma redonda, a cor
dourada e o fato de ser quente, o crepe lembrava o sol. O que combinava também
com a festa religiosa, pois, para os cristãos, Cristo é a luz do Mundo. A
tradição mandava que os crepes deveriam ser feitos com o trigo excedente do ano
anterior, para trazer prosperidade na colheita do ano que começava. Também era
uma forma de aproveitar o que sobrava do cereal.
E
não para por aí! Os primeiros crepes deveriam ser feitos no fogo e jogados para
o alto várias vezes com a mão direita, enquanto a mão esquerda deveria segurar
uma moeda. Isso tudo para atrair a prosperidade. Depois, a moeda era enrolada
no crepe, levada em procissão até o quarto para ser jogada em cima do armário,
onde deveria ficar até o ano seguinte. Deixar a moeda cair, era azar para o ano
todo.
Há
historiadores que estabelecem a origem do crepe em 7000 a.C. Naquela época, era
uma panqueca bem grossa, feita com uma pasta misturando água e vários cereais
triturados. Uma pedra chata, muito quente, permitia o cozimento.
Na
Bretanha, região francesa, foi no século XIII que surgiu o crepe. O trigo
sarraceno, trazido de volta à França após as cruzadas na Ásia, possibilitou
fazer essa fina camada de massa, de forma redonda. Este é o início da
tradicional galette bretã! Pois, lá, os crepes salgados são sempre preparados
com farinha de trigo sarraceno, também chamada de “farine de blé noir’, a
vantagem desta farinha é que não contém glúten.
A
galette de trigo mourisco deve ser distinguida do crepe doce, para a qual são
utilizados farinha de trigo, leite, ovos e manteiga. Mas em ambos os casos, a
preparação ganha em gula com as suas guarnições de recheio – que podem ser os
mais variados possíveis.
Graças
ao seu percurso histórico, o crepe tem alma viajante e hoje pode ser encontrado
em todo o mundo, com pequenas variações: desde a famosa panqueca americana, que
é menor e mais grossa; o bonitinho blini do Leste Europeu, ou ainda na tortilla
mexicana, preparada com farinha de milho. O crepe francês ainda é primo da
piadine italiana ou do baghrir norte-africano, e até da bruaca cearense do
nordeste brasileiro. Todos, umas delícias de se perder o rumo.
Hoje
não é preciso fazermos tantos rituais. Mas, sem dúvida, crepes e galettes, são
excelentes opções para se deliciar.
Crepes (Massa Tradicional)
Para a Galette (massa salgada de crepe):
1
xícara de leite
5
colheres (sopa) de manteiga derretida
1 ovo
1
xícara de farinha de trigo
uma
pitada de sal
Para a massa doce de crepe:
Adicione
1 colher (sopa) de açúcar.
Preparo: Numa tigela grande,
misture o leite, a manteiga e o ovo, batendo com um fouet ou garfo. Vá
colocando a farinha de trigo pouco a pouco, misturando bem. Adicione a pitada
de sal e/ou, para a versão doce, o açúcar. Misture. Leve à geladeira por uma
hora para a massa “descansar”. Para fritar os crepes, esquente bem uma
frigideira e coloque uma colher de manteiga. Disponha uma concha da massa e
espalhe bem por toda a frigideira. Quando estiver cozido o lado de baixo, vire
e deixe cozinhar do outro lado. Retire, reserve num prato e recheie/sirva como
quiser! Rende de 6 crepes.
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