terça-feira, 29 de outubro de 2024

Hingabana, o lírio-aranha vermelho: Morte, perda, separação e abandono – os muitos simbolismos de uma flor..

.Neste lado ocidental do mundo alguns países, influenciados pelas veias da colonização ou pelo marketing avassalador do capitalismo, estão se preparando para comemorar o Halloween, o Dia das Bruxas, uma tradição que se iniciou com celtas e druidas no pré-cristão para celebrar uma transição do ano que eles chamavam de Samhain, cujo vinculo religioso se constituía como “a morte do Deus” (que trazia consigo o fim da colheita e o inverno); deus esse que ressuscitaria na estação seguinte, ainda mais forte. No meio disso tudo, se construiu um folclore com muitas lendas, estórias e mitos que converteram antigas tradições camponesas em celebrações vinculadas à bruxaria e aos espíritos malignos, que acabaram sendo usadas, pela disseminação do medo, em uma ferramenta poderosa para manter a hierarquia e controlar a sociedade, promovendo uma visão de mundo que favorecia a Igreja.

Sabe-se que, as populações mais ignorantes, em grande parte devido à falta de acesso à educação e ao conhecimento científico, tornaram-se presas fáceis dessas crenças. A Igreja, que monopolizava a educação e a interpretação da Bíblia, moldou a cosmovisão das pessoas, fazendo-as acreditar que qualquer desvio das doutrinas aceitas poderia levar à condenação. Essa manipulação do conhecimento resultou em uma sociedade onde a superstição prevalecia sobre a razão, perpetuando uma cultura de medo e controle.

O Halloween é um exemplo fascinante de como crenças errôneas podem ser perpetuadas por instituições em busca de controle. A Igreja, ao manipular o medo e a ignorância, conseguiu moldar a forma como as pessoas viam o sobrenatural, influenciando suas práticas culturais – ao longo desse percurso, muitas pessoas, na maioria mulheres, foram assassinadas acusadas de bruxaria pelo simples fato de terem um maior domínio sobre o conhecimento de uso de plantas, unguentos e venenos. Contudo, a evolução do Halloween também demonstra a capacidade humana de resistir e reinventar tradições, transformando medos em celebrações. Essa dinâmica continua a refletir a complexidade da interação entre cultura, religião e conhecimento ao longo da história.


Para não ficar muito repetitivo, e ter que tratar novamente sobre o Halloween, algo que já apresentei em algumas postagens que você pode conferir AQUI, AQUI, AQUI, AQUI, AQUI, AQUI, AQUI, AQUI e AQUI. E, hoje queria seguir o clima da estação e a linha do “pouco aterrorizante”, mas fugindo do óbvio. Para isso, resolvi procurar argumentos fora do mundo ocidental. Assim, hoje vou falar do simbolismo de uma pequena flor que poder ser tão fatal quanto a ignorância.

Num mundo onde se redescobre a imensidade de formas, usos e gostos com as plantas comestíveis não convencionais – PANCs, também se encontra plantas altamente tóxicas e letais.  Logo, é altamente importante e necessário o domínio do conhecimento sobre plantas para que não haja um pandemônio, sobretudo na cozinha.

O conhecimento antigo do mundo das plantas dominado inicialmente por mulheres ainda no período horticultural, antes mesmo do surgimento da agricultura já demonstrava a importância de se entender de plantas, seus ciclos e suas produções, particularmente para a sustentar a alimentação. Mais tarde, esses conhecimentos ganhariam ainda mais poder e seriam ampliados por xamãs, curandeiros e bruxas, que aumentaram exponencialmente o uso da flora para alimentação, fármacos, produtos de beleza, construção dentro outros fins.


Nesse sentido, hoje você vai conhecer um pouco mais sobre o Lirio-aranha vermelho – que, no final, serviu para inspirar uma bebida interessante que você pode servir na sua festa de Halloween e, com ela, ter mais conteúdo de conversas que fujam do óbvio.

A história do lírio-aranha vermelho começa com uma bela cena outonal no final de setembro durante o feriado budista de Ohigan (o O é um título honorífico e Higan significa “a outra margem”).  Por um lado, esse feriado tem algo semelhante com o Halloween, pois, na verdade, Higan é uma abreviação de Tôhigan, onde Tô significa “atravessar” e como Higan quer dizer “A Outra Margem”, Tôhigan que dizer “atravessar para a outra margem”. Tô é a parte mais significativa da palavra Tôhigan. Higan, a menos que sejamos muito cautelosos, torna-se um conceito. Mas Tô (atravessar, ir) não é um conceito; é a experiência, é a vivência. Desse modo, o importante é atravessar para a outra margem, e eu gostaria de enfatizar mais o Tô do que o Higan. Ele recomenda viver o dia-a-dia. O destino, a meta, o fim, o Higan, acaba por ser alcançado se você dá cada passo no caminho perfeito. Se os meios são perfeitos, é natural que alcancemos o objetivo perfeito. Assim, os meios são mais importantes que o objetivo. Eu não deveria dizer “mais importantes”, pois isso divide os meios e os fins em duas coisas, enquanto que os meios são fins e os fins são os meios. Sabendo-se isso, a palavra Higan torna-se perfeitamente compreensível sem o acréscimo do verbo Tô. Atravessar é dar vida à outra margem – logo, seria acreditar também que essa outra margem é puramente real.


É esse período de tempo, logo antes do equinócio de outono deu origem a um dos folclores mais fascinantes para a existência de qualquer flor do mundo. No Japão, Ohigan é uma época para voltar para casa para visitar túmulos e prestar homenagem aos ancestrais. Também coincide com o breve período de floração do lírio-aranha vermelho (Lycoris radiata), que floresce incomumente no outono. Por causa da associação da flor com Ohigan (お彼岸) e o equinócio de outono (彼岸), essa flor é conhecida em japonês como Higanbana (彼岸花).

A primeira vez que eu me deparei com esses seres florais requintados, aqui mesmo no Ceará, paralisei, mas nem sabia que ela era tudo isso – admirei a cor, a beleza e segui. É uma flor impressionante, elegante e intimidadora. Ela é alta e sem folhas, seu longo caule se ergue do chão e no topo, fica uma linda coroa de flores com longos tentáculos esticados ao redor dela. Ela exige respeito e espaço para exibir sua opulência.

O lírio-aranha vermelho pode ter muitos nomes diferentes, seu nome latino é Lycoris radiata, mas ela é conhecida como flor do inferno, lírio mágico vermelho, flor do equinócio, flor da morte, dentre outros.

Por enquanto, vamos chamá-la apenas de Lycoris. E ela é muito mais do que apenas uma flor bonita: em cada centímetro de seu corpo botânico, o veneno corre em suas veias. Sua raiz bulbosa, folhas elegantes e coroa de flores que contêm um alcaloide tóxico chamado licorina que tem comprovada ação emética, analgésica, anti-inflamatória, estimulante respiratória, anticancerígena, antiviral e expectorante. Mas, em contrapartida, se ingerida causará dor abdominal, salivação, tremores, náusea, vômito, convulsões, paralisia e se for ingerido em grandes quantidades é letal.

As flores de Lycoris não nascem com a primavera, nem florescem no verão. Ela floresce com a cortina do outono, depois que todas as suas folhas murcham. Na mitologia chinesa, há uma lenda sobre a singularidade dessa flor. Ela é cercada por um mito de morte, perda e tristeza, porque por trás de sua beleza há uma história trágica.

Um outro nome para o lírio-aranha vermelho é "Mañjusaka" (em chinês) e "Manju-syage" (em japonês), e eles fazem relação direta com a existência de seres mitológicos que você conhecerá a partir de agora. Essa história tem raízes japonesas, mas foi levada para partes da China, o que explica as versões variadas e, as vezes confusas, que se encontra por aí.

                                          Amaterasu, a deusa do sol japonesa 

Tudo começa com a deusa do sol Amaterasu (cujo epiteto completo é Amaterasu-ōmikami, ou seja, "a Grande Deusa Augusta que ilumina o céu”, deusa do círculo mitológico japonês que domina o panteão do Xintoísmo), designando dois espíritos da natureza que aqui vamos identificar como elfos (mas, há quem diga que eram fadas) para proteger as flores e as folhas de forma independente.

Lycoris (vamos chamar assim, o lírio-aranha vermelho) nem sempre foi assim, costumava haver estações em que ela estava inteira. Um breve momento no tempo em que suas folhas e flores se cruzavam e naquele pico de sua magia ela era bem protegida por dois elfos leais. Um, chamado Mañju, que protegia a flor, enquanto o outro, chamado Saka, protegia as folhas.

A maioria dos elfos encarregados de proteger a flora sagrada trabalhavam juntos em harmonia; as folhas captavam a luz do sol e forneciam nutrientes para a flor que criava sementes e pólen para uma nova vida.

Lycoris era diferente, ela esperava seu tempo, armazenando sua energia de suas folhas durante toda a estação e esperando até o outono para florescer. Ela preferia apresentar sua beleza então, depois que toda a outra flora começasse a perder vitalidade e murchar. Até que fossem apenas ecos de beleza e ela sozinha brilhasse, como uma flor brilhante de fogo no campo. Uma surpresa etérea e deslumbrante para todos os seus espectadores. Uma estação em que ela seria a flor mais bonita.



Mañju e Saka gostavam bastante dos caprichos de Lycoris. Apesar de todo seu orgulho intimidador, a flor era imensamente charmosa e gentil com seus servos élficos. Embora eles perdessem o luxo da companhia élfica, eles tinham muito orgulho e cuidado em proteger a flor mais mágica do reino.

Haveria um ano ocasional, quando a estação mudava para o outono, onde os elfos se cruzavam. Eles nunca tinham muito tempo para conversar, mas os dois se cortejavam através da linguagem da doação de presentes de colheita.

Alguns anos, Saka pedia às abelhas para enviarem mel e delícias para Mañju durante a floração do outono, e Mañju coletava cristais extravagantes e deixava pólen brilhante no caule para decorar o retorno de Saka.

Naturalmente, com o passar dos séculos, os elfos ficaram cada vez mais curiosos um sobre o outro. Lycoris gostava bastante das brincadeiras entre os dois. Ela era uma entidade antiga e lhe dava alegria ver os dois elfos flertando. Ela nunca admitiria, mas ela adorava participar de ideias de presentes e surpresas sazonais. Em noites calmas, Lycoris permitia que os elfos lhe contassem histórias. Depois, ela ilustrava para Mañju as histórias de Saka; como durante dias tempestuosos, quando parecia que seus caules iriam quebrar, seu protetor abraçava Lycoris através dos ventos fortes e da chuva para manter seu caule firme e gracioso. Ou, como ela observava com admiração enquanto a bela Saka trabalhava na luz do sol com a força de um javali, revirava o solo novo sobre seu bulbo de raiz e coletava composto para nutrição. Lycoris amava que Saka arrancasse suas folhas menos atraentes e massageasse o novo crescimento para garantir que ela tivesse a vegetação mais forte para coletar nutrientes para sua semente.

A estação da floração passou e Mañju e a floração retornaram à hibernação, e Saka e as folhas despertaram da delas. Lycoris, é claro, contava as histórias de ambos. Entretendo Saka com histórias de Mañju. Afinal, era sua época favorita do ano. Ela adorava o olhar aguçado de Mañju para a beleza.

Mañju garantiria que a luz do sol atingisse sua flor perfeitamente durante sua floração. Usando uma colocação metódica de pedras e cristais para refletir a luz em sua flor das maneiras mais lisonjeiras. Ela se orgulhava quando humanos e animais paravam para encará-la. Mañju cuidava de seus estames, certificando-se de que seu pólen estivesse fofo, saudável e brilhante e que suas pétalas estivessem brilhantes e perfeitamente enroladas. Seu tempo com Saka a fez se sentir protegida, vital e forte, enquanto seu tempo com Mañju a fez se sentir confiante, fértil e opulenta.

Ambos os elfos estavam apaixonados, eles ouviam as histórias repassadas por Lycoris com admiração, mas sempre havia uma pontada de melancolia puxando o coração. Um amor que nunca poderia ser. Deveres que não podiam ser abandonados. Os elfos fantasiavam em conhecer o outro, dançar juntos e contar histórias da própria flor. Lycoris ria, mas então suspirava, avisando-os de que eles nunca poderiam se encontrar nesta vida, pois, pelas leis da natureza, eles nunca deveriam deixar seus postos como guardiões da ordem natural. Sua beleza, apesar de toda a sua vaidade, era um valor definido dentro da lei da natureza. A flor aconselhou os elfos com uma sabedoria antiga. A sabedoria de uma entidade ligada à natureza para viver um ciclo de vidas sem fim.

“Mantenha seu vínculo forte. Sua vida é apenas um piscar de olhos da minha eternidade. Em momentos de tempo, vocês dois morrerão e deixarão de ser elfos. Meu presente para vocês por seu serviço leal serão milhares de vidas envoltas nos braços um do outro. E quando essas vidas terminarem, lá estarei em seus túmulos, levando-os um ao outro.”

Claro, os elfos ficaram com o coração partido, mas se confortaram com o conselho da flor. Eles eram apenas elfos nesta vida e deviam obedecer às leis da natureza, pois são guardiões dela. Na próxima vida, eles poderiam, talvez, ficar juntos.

Então, durante o outono nos anos ímpares quando as flores e as folhas passavam umas pelas outras, e Mañju e Saka só trocavam sorrisos e desejos rápidos de boa estação. Séculos se passaram e momentos de tempo para uma flor antiga eram excoriantes para um elfo apaixonado.

Havia uma fome brotando dentro deles. Uma fome que passou despercebida até se transformar em uma devastação, uma luxúria. Os elfos queriam se tocar, ser abraçados, se entregar a horas de conversa. Essa fome aumentaria ano após ano até que uma estação, quando os dois passaram, eles decidiram fazer um pacto. Ambos abandonariam seus postos para ficarem juntos por apenas uma noite.

Lycoris em toda a sua sabedoria ancestral implorou aos dois. A Deusa do Sol não ficaria satisfeita. Quando seus olhos tocassem toda a superfície da terra ela veria a ordem sendo interrompida. Ela sentiria isso em seu próprio ser. Os elfos discordaram. Eles achavam que tinham descoberto uma forma de se encontrarem: se eles se encontrassem à noite, a Deusa do Sol não ficaria sabendo. Ela é a mãe de todos e certamente poderia ter compaixão nas leis do amor.

Lycoris foi gentil em discordar dos elfos. Ela era muito mais velha e não apenas entendia as leis da natureza, mas também do descuido no amor. A Deusa do Sol é um ser complexo, seus deveres na natureza são espalhar calor e vida para aqueles que encontra. O Sol está sempre profundamente preocupado com o estado do mundo ao seu redor, o que a torna uma criatura de rotina, ela exige equilíbrio. Lycoris explicou que não há dúvida de que o Sol é uma força da natureza. Ela não é uma entidade que entende benevolência. O Sol é rápido para temperar e toma decisões na velocidade da luz, estas nunca devem ser revertidas.

Os elfos desconsideraram o aviso, a ideia de estarem juntos valia o risco. Isso fez Lycoris balançar de ansiedade e conforme a estação mudava e chegava a hora dos caminhos dos elfos se cruzarem novamente. Enquanto suas últimas folhas murchavam lentamente e seu botão floral começava a se formar, os dois elfos se encontraram no meio das estações para ficarem frente a frente.

O tempo pareceu parar. Houve uma mudança no ar enquanto os dois olhavam nos olhos um do outro, próximos o suficiente para se tocarem. O puxão da natureza os puxava e chicoteava seus corpos como um vento violento tentando inaugurar as estações. Esses elfos só conseguiam suportar o fardo e olhar com admiração para a imensa beleza um do outro. Os guardiões míticos do Lírio-Aranha vermelho que, por séculos protegeram a mesma flor, encontrando-se apenas de passagem, captando olhares oníricos um do outro, comunicando-se em um código sazonal de presentes, agora estavam juntos. Mañju sorriu e estendeu a mão para Saka calorosamente. Os dois se encontraram e se abraçaram profundamente.

Esse era o tipo de abraço que faz alguém tremer de ansiedade, um encontro de duas almas que estavam destinadas a se separar. Como uma corrente, era poderoso, estimulante e, para os elfos, era mágico. Naquela noite, eles passariam dançando, conversando e rindo um com o outro, longe do olhar matinal da Deusa do Sol.

No entanto, assim que o orvalho do amanhecer se formou, a Deusa do Sol acordou com fúria ardente. Ela ficou inquieta a noite toda. Essa pequena corrente que os elfos fizeram quando se encontraram havia se transformado em ondas violentas na mente da Deusa. Elas haviam interrompido o equilíbrio junto com o sono divino da deusa e ela não estava satisfeita.

Ela brilhou pela terra em uma luz dourada ofuscante, vasculhando a terra furiosamente, procurando por qualquer sinal de desequilíbrio e exigindo saber o que a perturbara ao logo da noite. Ela procurou nas ondas do oceano, nas dunas do deserto, nos picos das montanhas, sem encontrar nada. As criaturas da terra se esconderam, sentindo a fúria quente do Sol em seu estado errático. Ela estava imparável, com raiva e muito cansada. Foi somente quando ela passou por Lycoris e seu campo de flores que sentiu o desequilíbrio e parou. A flor estava alta e orgulhosa como sempre, mas ela estava desprotegida, sua magia desobstruída e desprotegida, derramando-se sobre a terra em ondas de um poder estagnado.

A Deusa olhou curiosamente para a flor, que murchava lentamente debaixo do seu calor. Ela estava curiosa para saber por que Lycoris não floresceu em seu devido tempo. Ela não conseguia entender por que a flor mais vaidosa da terra deixaria de lado seu orgulho e beleza para perder sua floração, o auge de sua magia. Lycoris não respondeu, ela apenas se curvou respeitosamente, murchando na presença do Sol. A Deusa ficou furiosa. Exigindo saber para onde a guardiã outonal das flores tinha ido. Lycoris, junto com o resto do ecossistema, permaneceu em um silêncio aterrorizante. A Deusa do Sol ardia e gritava por respostas, queimando lentamente Lycoris.

Em proteção à flor, os elfos rapidamente emergiram de seu esconderijo juntos. Suas mãos se entrelaçaram e suas cabeças se curvaram vergonhosamente diante desta entidade flamejante. A Deusa do Sol estava tão brilhante e irada que os elfos não conseguiam olhar para ela, mas apenas tremer em sua presença. Eles imploraram para que ela cortasse a flor e seus campos. Admitindo que foram avisados desse resultado. A deusa se virou para Lycoris, repreendendo a flor por encorajar essa união e por seu silêncio sobre o assunto.

A Deusa do Sol, em uma névoa de uma noite sem dormir e um acesso de raiva, decidiu que os elfos haviam traído as leis da natureza e não eram mais confiáveis para cumprir seus deveres enquanto estivessem juntos. Os elfos soluçaram e imploraram aos pés da Deusa. Eles estavam apaixonados! Certamente, ela poderia entender e permitir que eles continuassem a passar um pelo outro silenciosamente como costumavam fazer. A Deusa estava lívida. Ela não tinha capacidade de misericórdia em sua ira e nenhuma compreensão do amor, apenas ordem. Ela levantou as mãos, lançando uma forte maldição sobre os elfos e Lycoris.

As folhas de Saka podem nunca mais encontrar as flores de Mañju. Era isso. Os dois estavam fadados a nunca mais se encontrarem. Não nesta vida, ou em qualquer outra. Eles nunca passariam um pelo outro, nunca sorririam um para o outro, nunca trocariam olhares. Eles seriam presos a um labirinto de almas, para nunca mais se encontrarem.

A maldição seguiu seu curso, separando os dois pelo resto daquela vida, e a flor, Lycoris, também sofreu. O que antes era sua preferência orgulhosa por flores, agora era uma maldição vergonhosa da natureza para a flor. Suas folhas agora murchariam bem antes de sua floração, deixando-a com um caule simples e nu até sua floração. A dor da tristeza que ela sentia pelo destino de seus elfos e sua amargura por essa característica amaldiçoada se manifestaram séculos depois em um veneno tangível que, até hoje, corre por suas veias, raiz e flor enquanto ela lamenta o destino dos amantes que tão lealmente a protegeram.

Foi dito que após a morte, o casal se encontrou na vida após a morte. Eles juraram se encontrar após a reencarnação. No entanto, nenhum deles seria capaz de manter sua palavra, pois a maldição da Deusa do Sol seguiu os elfos por vidas inteiras.

Depois desse episódio, diz-se que, se você conhecer uma pessoa que nunca mais verá, as flores de Manjusaka crescerão ao longo do caminho que eles percorreram quando partiram. Até hoje, pode-se considerar que Lycoris é alguém que cumpre sua promessa. Crescendo em campos onde os mortos são sepultados, guiando os espíritos para a próxima vida, secretamente esperando tropeçar nas almas de seus guardiões para um dia guiá-los a um lugar onde eles possam finalmente ficar juntos.

Embora seja uma lenda, a história mostra a realidade da floração outonal do lírio-aranha vermelho, que floresce bem antes das folhas saírem. Um aglomerado de flores vermelhas brilhantes, semelhantes a aranhas, com longos estames brilham no topo de um caule verde e fino, criando uma camada vermelha sobre a paisagem. O brilho vermelho desaparece rapidamente à medida que as pétalas murcham, deixando a planta nua. As folhas então emergem, trazendo a vida de volta à planta mais uma vez antes que elas também fiquem marrons e a planta retorne ao solo, morrendo pela segunda vez.

Uma flor de muitos nomes

Mas esses estão longe de ser os únicos nomes para o lírio-aranha vermelho. No Japão, essa flor tem mais nomes. Muitos desses nomes estão relacionados ao folclore único da flor, que é multifacetado. Curiosamente, muitos (se não a maioria) dos nomes estão associados à morte e os motivos são interessantes.

Durante o Ohigan, quando os lírios-aranha vermelhos estão em flor, eles são uma visão muito comum em cemitérios, mas não são encontrados ao redor de lápides porque são deixados como memoriais. O motivo real está na botânica interessante desta planta e é muito mais macabro. A planta inteira, do bulbo à flor, é venenosa.

Em tempos históricos no Japão, corpos humanos eram enterrados diretamente no solo e a perturbação por toupeiras, raposas ou outros animais, escavando ou catando as ossadas mortas, era um problema comum. Para garantir que os túmulos fossem deixados em paz, as pessoas plantavam os lírios-aranha vermelhos venenosos sobre corpos enterrados para deter os animais. Túmulos e morte logo foram associados ao lírio-aranha vermelho, o que lhe rendeu o nome de "flor da morte" e o ainda mais sombrio, "flor-cadáver".

Além dos cemitérios, o método de plantar bulbos de lírio venenoso como uma forma de controle animal se estendeu às margens de rios e campos agrícolas, como arrozais – para proteger também as colheitas.

Uma superstição comum em torno da flor era que, se você colhesse uma delas e levasse para casa ela faria sua casa queimar. Como acontece com muitas superstições e mitos, essa pode ter sido uma forma de assustar as crianças para impedi-las de tocar na planta venenosa.

Como esse tipo de lírio era plantado ao redor de túmulos, quando as flores vermelhas floresciam da mesma cor de sangue, acreditava-se que elas atraíam (ou sugava) o sangue dos mortos, ligando-as ainda mais à morte. E enquanto balançavam na brisa, alguns pensavam que pareciam fantasmas, dando a elas outro nome de "flor fantasma".

A conexão da flor com o budismo é mais do que apenas a coincidência de florescer durante a celebração de Ohigan.

Um dos poucos nomes não associados à morte, a flor também é chamada de Manjushage (曼殊沙華) (pronuncia-se Mandyuu shaguê), que vem das escrituras budistas. O Manjushage é uma flor celestial que não existe entre nós, mas o lírio-aranha vermelho foi plantado por monges para representá-lo e, portanto, associado aos templos budistas – essa flor simboliza que a noite se torna maior que o dia. Simboliza o fim de nossa existência, o esfriar, a despedida, o esquecimento.   Existem também lírios-aranha brancos, que tendem a ser mais comumente conhecidos como Manjushage.

"Higan" tem um significado além do feriado para homenagear os ancestrais. No Sutra do Coração Budista, higan significa "a outra margem", referindo-se ao mítico Rio Sanzu. Os espíritos cruzam este rio para alcançar a iluminação, por isso é frequentemente visto como um símbolo de passagem para a morte. Lírios-aranha vermelhos crescem ao longo das margens do Rio Sanzu e saúdam os espíritos recém-falecidos.

Em outro texto budista, o Sutra de Lótus, Diyu é o reino dos mortos, ou inferno, e diz-se que os lírios-aranha vermelhos crescem lá, marcando um caminho para guiar os espíritos à reencarnação. Outro nome para os lírios é "flores do inferno".

Simbolismo em Anime

O simbolismo difundido do lírio-aranha vermelho no Japão é usado regularmente nas artes, da literatura à música, cinema e animação. Até mesmo espectadores casuais de anime provavelmente já encontraram o lírio-aranha vermelho em vários deles. A flor aparece regularmente, às vezes como uma imagem passageira, outras vezes, como um símbolo mais arraigado em um anime ou de um personagem. Mas, nunca está lá por acaso.

No Japão, algumas flores são tão simbólicas e significativas que há uma palavra usada para denotar essa linguagem não falada: hanakotoba. Glicínia, sakura, ameixa e crisântemo são apenas algumas flores que simbolizam coisas diferentes e importantes na cultura japonesa.

Um buquê raramente é simples e muitas vezes cheio de significado não dito, tanto quanto a aparência aparentemente casual de uma flor no anime. O lírio-aranha faz parte dessa rica linguagem das flores e muitas vezes é usado para prenunciar uma morte iminente.

Lírios-aranha vermelhos em Kimetsu no Yaiba

Lírios-aranha vermelhos podem ser vistos de passagem em um dos animes mais populares, Kimetsu no Yaiba (鬼滅の刃), popularmente conhecido no ocidente como Demon Slayer, geralmente aparecem nos créditos finais. Em um programa cheio de morte, isso não seria apenas um prenúncio, mas uma promessa. Curiosamente, há também um lírio-aranha azul fictício que entra na história do demônio muzan.

Os lírios-aranha desempenham um papel maior no mangá e anime, Tokyo Ghoul (東京喰種), de Sui Ishida. Outra história onde a morte é inevitável e frequente, as flores fazem aparições regulares ao longo da história. Mas nesta história, os lírios não simbolizam apenas a morte. Em uma cena em particular, o personagem principal, Ken Kaneki, é dramaticamente torturado e, à medida que sua mente e corpo começam a quebrar, um campo de cravos brancos se transforma em lírios-aranha vermelhos, simbolizando sua metamorfose em uma pessoa totalmente diferente enquanto ele é destruído.

Talvez o uso mais comovente do lírio-aranha vermelho que já vi em qualquer anime seja no episódio 9 do programa, Dororo (どろろ), de Osamu Tezuka (o mesmo artista que criou Astro Boy). A história segue o misterioso Hyakkimaru e a criança órfã Dororo. O episódio 9 é carregado de simbolismo do lírio-aranha vermelho, pois encontra Dororo doente e encontrando as flores, levando a um flashback. Tenzuka deve ter percebido que outro nome para a flor era "flor de criança abandonada" e definiu habilmente esse nome nesta história trágica onde Dororo conta como ela se tornou órfã. A cena final, onde sua mãe finalmente morre de fome, incapaz de continuar, é em um vasto campo de lírios-aranha vermelhos. Cercada pelas flores, ela morre e Dororo é abandonada.

Depois desse contexto todo, imagino uma festa de Halloween, mais chique, sem muitas das coisas obvias, com ambiente decorados com flores de lírio-aranha vermelho e, para seguir a superstição japonesa, que associa essa flor com o fogo, não seria nada mal apresentar para os convidados, um drink com a cor intensa da flor e pegando fogo... essa é a ideia da bebida a baixo.

COQUETEL LÍRIO-ARANHA VERMELHO FLAMEJANTE

Para o Xarope de tomilho e framboesa (xarope de sangue) (rende cerca de 1 xícara / 240 mL)

340 g de framboesas congeladas

3 raminhos de tomilho

100 g de açúcar branco (o que equivale a ½ xícara)

120 mL de água (equivale a ½ xícara)

1 gota de corante alimentício marrom 1 gota pequena de corante alimentício em gel marrom (opcional se você quiser escurecer ainda mais a cor do xarope)

Para o Coquetel - para um coquetel

67 mL de rum branco (usei Bacardi)

44 mL de xarope de tomilho e framboesa (receita acima)

22 mL de suco de limão espremido na hora

2 cubos de gelo

⅛ colher de chá de pó de brilho perolado ou vermelho pó de brilho (opcional)

1 ½ colher de chá de rum Bacardi 151 opcional (MANUSEIE COM CUIDADO)

Preparo: Primeiro prepare o xarope - Coloque todos os ingredientes em uma panela (exceto o corante marrom), 340 g de framboesas congeladas, 3 raminhos de tomilho, 100 g de açúcar branco, 120 mL de água. Cozinhe a mistura em fogo médio-alto. Mexa até que o açúcar dissolva e deixe a mistura ferver. Mexa com frequência até que as framboesas amoleçam e se quebrem na calda. Retire a calda do fogo e deixe esfriar completamente. Isso é importante, pois as framboesas e o tomilho vão infundir a calda. Coe a mistura em uma peneira fina para remover um pouco da polpa e das sementes. Não aperte muito a polpa, pois você não quer muita polpa no xarope. O xarope não deve ficar turvo. Adicione o corante alimentício marrom para deixar o xarope com uma cor vermelha um pouco mais escura. Esta é uma etapa opcional. Despeje o xarope em uma garrafa e guarde na geladeira. Montando o coquetel: Coloque todos os ingredientes em uma coqueteleira com gelo (e junte o pó de brilho também, se quiser um coquetel brilhante). Agite por alguns segundos para gelar o coquetel. Coe o coquetel em uma taça coupé. Na hora de servir, ele deve estar em chamas, para isso, coloque uma colher de coquetel sobre a superfície do coquetel e cuidadosamente coloque o rum 151 sobre o coquetel. Cuidadosamente, acenda a camada de rum 151 usando um fósforo ou isqueiro. Isto é apenas para o teatro e não tem impacto no sabor do coquetel. Antes de consumir o coquetel, o fogo DEVE SER APAGADO. Coloque um pires ou um prato pequeno sobre o copo para apagar a chama. O coquetel pode ser apreciado depois que as chamas forem apagadas.


domingo, 20 de outubro de 2024

Kaju Katli, uma doce criação da cozinha hindu

 

Quem me conhece mais intimamente sabe bem da minha gula por frutos secos. Amo todos os tipos de castanhas, e confesso não ter maturidade para parar de comê-las. São tantas, e com sabores tão variados: castanhas de caju, amêndoas, nozes, pistaches, avelãs, castanhas do Pará, castanhas portuguesas, macadâmias, pinoles, noz pecã, castanha de baru, castanha sapucaia, chichá (ou xixá), amendoim, coco babaçu ...  cada uma com a sua peculiaridade de formato e identidade de gosto.

Morando no Ceará, tenho algumas dessas castanhas com facilidade, especialmente as castanhas de caju, que podem ser encontradas mais ou menos torradas, caramelizadas com gergelim, ou sem ele... e, eu amo o gosto da castanha de caju torradinha que a gente assava nos cacos de barro, lá em casa, quando eu era criança e morava na Serra da Ibiapaba, no norte do Ceará. Depois, fui sofisticando com gosto com amêndoas, foi quando me apaixonei definitivamente por marzipan - aliás, foi sobre ele a primeira postagem de criação desse blog, veja AQUI.

Ao longo da adolescência fui apresentando a tantas outras castanhas e o mundo ficou mais feliz com elas. Em 2017, eu publiquei dois capítulos de livro na Argentina – um sobre Gastrodiplomacia, o capítulo 3; e o capítulo 8, sobre Geofoods – na obra “Destinos com sal y pimienta”, coordenado por Juana Alejandrina Norrild, foi uma realização do Centro de Investigaciones y Estudios Turisticos - CIET, uma importante instituição dedicada as pesquisas cientificas em turismo da argentina e da América Latina (se quiser conferir o conteúdo, o livro pode ser baixado gratuitamente AQUI).

Você deve estar se perguntando: por que ele está falando sobre isso? Porque, logo após eu ter publicado sobre Geofoods que, resumidamente, são comidas que representam visualmente os lugares onde elas foram criadas (sugiro a leitura do capítulo 8 do livro para que entenda melhor o significado de uma Geofood), eu fui fazer testes para o que eu poderia executar como Geofood que representasse Fortaleza, a capital do Ceará.

Do ano 2000 até 2004, morei na cidade de Aracati, famosa pela internacionalmente conhecida Praia de Canoa Quebrada, localizada no litoral leste do Ceará e lá me foi apresentado o Canjirão de castanha de caju, uma espécie de tijolo doce feito de castanhas de caju moídas, farinha de mandioca e mel de caju que, por lá, é apresentado nas versões branca e escura – diferença resultante pela maior ou menor quantidade do mel de caju usado na receita. Foi paixão certeira. 


Ao longo dos meus estudos sobre doçaria brasileira, era comum encontrar doces com essa mesma característica, em formatos diferentes: uns eram feitos com o milho de pipoca que não estourava na panela, mais açúcar e farinha de mandioca; outros preparavam outro tipo de doce com amendoim e gergelim moídos, mais farinha de mandioca e açúcar e/ou rapadura... e essas informações e as técnicas de preparo ficaram gravadas na minha mente. Naquele instante, eu estava com castanhas de caju nas mãos e resolvi preparar um doce com elas: fiquei pensando numa técnica fácil, que fosse também rápida no preparo e que, de alguma forma, me lembrasse do canjirão, mas fosse mais delicada. Depois, escolhi aromatizantes que fossem de produção local e tivessem fácil acesso. E, dentre as possibilidades, usei como especiarias: a pimenta do reino, folhas frescas de manjericão e amburana – essa última, também conhecida como cumaru do Ceará – e, finalmente fui testar.

De uma receita base, que foi dividida em porções, fui testando a quantidade e variando a mistura de especiarias em cada porção-teste, et voilá!  Nascia assim meu doce de castanha de caju, que eu ainda não batizei com um nome até hoje. Os testes com as especiarias escolhidas ficaram bons – para mim, pelo menos (risos). Quanto ao formato do meu doce, eu estava disposto a encontrar a forma de um ícone ou monumento local que, só de olhar, já fizesse lembrar Fortaleza ou o Ceará, com esse pensamento, passei a buscar e analisar as imagens desses possíveis ícones para que deles surgisse um tipo de cortador e/ou marcador especifico parar que o doce final ganhasse ainda mais identidade. Infelizmente deixei a ideia de lado, pelo trabalho e custo que me renderia. Assim, para ver como se comportaria a massa depois de pronta, acabei fazendo em dois formatos: bolinhas, porque eram amis fáceis, e uns no formato de Gianduiotti, esse último com um formato mais elegante.

Acontece muito tempo depois, enquanto eu me dedicava aos estudos sobre a cozinha indiana, me surpreendi quando me deparei com um doce que lá eles fazem exatamente como o que desenvolvi aqui, sendo as especiarias e o uso da manteiga ghee foram as únicas diferenças entre ambas.

Não tenho ancestrais hindus e àquela época tinha pouco conhecimento sobre a cozinha dos indianos, mas ocorre que, na minha cabeça, de alguma maneira, se manifestou a ideia e o método dessa preparação... Talvez, fosse uma inspiração do senhor Ganesha, deus hindu da abundância, da fortuna, do intelecto e da sabedoria, para quem eu vivia recitando um mantra que eu aprendi com o pouco de sânscrito que conheço, e na intenção sempre de ter boas intuições e sabedoria (o que sempre funciona comigo, se você quiser ouvir, clica AQUI). Mas, ainda poderia ser uma intuição emanada pela deusa da comida e da cozinha indiana, Annapurna, um avatar da deusa-mãe hindu, Parvati, que é mãe de Ganesha. Seja como for, a receita nasceu, e é sobre a versão indiana dela o post de hoje.

  
Ganesha
Annapurna

Para começo de história é preciso falar da existência do caju que, como menciona Vinicius de Moraes em seu “Soneto ao caju”, de 1947, é produto 100% nacional: originário do litoral brasileiro, especialmente no Nordeste, foi se espalhando por outras regiões sendo levado pelos indígenas. O caju é considerado um falso fruto, a sua polpa tão apreciada para o preparo de suco, mel, doce, passas, rapadura, aguardente e cajuína, é na verdade uma inflorescência. Isso porque, tecnicamente, o fruto verdadeiro é a castanha, pois foi ele que nasceu do ovário da flor. A "carne" é chamada de pedúnculo.

Desde muito antes da colonização do Brasil, o caju já era um alimento básico das populações autóctones. Por exemplo: os índios Tremembé, no Ceará, já fermentavam o suco do caju, o mocororó, que era e é bebido na cerimônia do Torém.

Principais estados produtores de caju e de castanhas no Brasil desde 2019, em amarelo escuro

Sendo um fruto nativo do Brasil, ganhou o paladar dos colonizadores e, com eles, o caju foi levado pelos portugueses do Brasil para a Ásia e África ainda no século XVI. A mais antiga descrição escrita do fruto é de André Thevet, em 1558, comparado este a um ovo de pata. Posteriormente, Maurício de Nassau protegeu os cajueiros por decreto, e fez o seu doce, em compotas, chegar às melhores mesas da Europa.

Os estados brasileiros do Ceará, Piauí e Rio Grande do Norte são os maiores produtores de caju e castanhas. Um relatório de 2023 da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), mostra que a área destinada à colheita de castanha de caju no país em 2023 foi equivalente a 428,0 mil hectares, tendo um aumento de 0,6% na comparação com o ano anterior, de 425,6 mil ha.

                        Em destaque, os poles cearenses da cajucultura.

O mesmo relatório aponta o Ceará como o principal estado produtor de castanhas de caju do Brasil, com uma produção estimada em 68,1 mil toneladas em 2023, ou 55,9% da produção nacional, uma redução de 29,3% na comparação com o ano anterior, devido à redução na produtividade em 29,8%, com leve aumento da área a ser colhida de 0,8%;  em segundo lugar, encontra-se o estado do Piauí , com 26,6 mil toneladas, representando 21,9% da produção nacional; é seguido pelo estado do Rio Grande do Norte, com 15,8 mil toneladas  em 2023, ou 13,0% da produção nacional.

O Caju (Anacardium Occidentale) foi introduzido na Índia pelos portugueses no século XVI. Ao longo dos anos, o Caju tornou-se uma cultura com alto valor econômico e alcançou o status de exportação – mercadoria orientada, ganhando considerável cambio para o país. A Índia exporta as castanhas de caju para mais de 60 países. Desde então o caju e suas castanhas se tornaram presentes na cozinha hindu, o que possibilitou a existência do Kaju Katli, o doce indiano que será apresentado a partir de agora.

Como já falei anteriormente, fiquei surpreso quando descobri um doce indiano preparado de acordo com a ideia que veio no meu pensamento. Mais surpreso ainda fiquei quando descobri que a receita do doce indiano também é uma daquelas cuja origem é disputada.


Kaju Katli é uma iguaria indiana clássica preparada com castanhas de caju, açúcar, pó de cardamomo e manteiga ghee, servida em pedaço na forma de diamante. Esta guloseima deliciosa é pode ser tipicamente revestida total ou parcialmente com Vark (também varak, Waraq ou warq; ou seja, uma fina folha de filigrana de metal puro, tipicamente prata, mas às vezes ouro, usada para decorar doces e alimentos do sul da Ásia), folhas de prata ou ouro comestíveis, representando luxo e instigando apreciação do consumidor.

                                            Folhas de prata e ouro comestíveis 

Não por acaso, o Kaju katli é um doce tradicionalmente consumido durante o festival Diwali, o festival das luzes – que simboliza a vitória do bem contra o mal –, ele configura-se como o maior e mais importante festival da Índia, mas o doce também é um presente adorável para amigos e familiares em muitas outras ocasiões.

                                       Diwali, o Festival das Luzes

Por exemplo, durante Ganesh Chaturthi, uma celebração em comemoração ao nascimento de Ganesha, kaju katli, é frequentemente feito. Além disso, açafrão ou frutas secas podem às vezes ser adicionados à sobremesa para realçar os sabores. Acredita-se na cultura indiana que comer kaju katli traz boa sorte e prosperidade para a casa de alguém.

                                             Ganesh Chaturthi 

Existem muitos doces indianos deliciosos, mas o Kaju Katli se destaca porque é muito difícil de evitar. Esta delícia, também chamada de Kaju Barfi, ( o que em português seria algo como “Neve de caju”, pois o termo barfi deriva da palavra persa e urdu (barf) para neve), encanta o paladar há gerações. Mas como ele passou das cozinhas antigas para as mesas de sobremesas modernas é um mistério cheio de segredos doces e contos tentadores.

O Kaju Katli conquistou a cena ‘mithai’ (termo hindu que significa doces e sobremesas) da Índia, mas de quem foi a ideia? A história nos oferece duas versões de como esse doce foi criado.

Quem diria que castanhas de caju, açúcar e ghee poderiam se unir para resultar em um doce que seria aclamado como um dos mithai mais versáteis!

Digo "versátil" porque não importa a ocasião — festiva ou comemorativa — você nunca pode errar com uma caixa de kaju katli se estiver na Índia. Os pedaços de paraíso em forma de diamante, às vezes decorado luxuosamente com folhas de prata ou ouro comestíveis, reinam supremos sobre a cena mithai indiana há décadas. E eles não vão sair da sua popularidade tão cedo.

Enquanto você deixa seu paladar se deleitar com a celebração de sabores que o doce traz à sua boca, você já parou para se perguntar se foi um momento "Eureka!" que levou a isso ou um incidente dramático semelhante?

Você ficará surpreso ao saber que existem duas versões, uma, no entanto, com mais popularidade do que a outra. Deixamos para você decidir o cérebro por trás do Kaju katli.

Um resultado da serendipidade

A versão menos conhecida do nascimento do Kaju katli dá crédito ao Império Maratha, o povo de um estado hindu localizado no que é hoje a Índia e Paquistão, que existiu entre 1674 e 1818, especificamente elaborado pelo chef Bhimrao enquanto este trabalhava nas cozinhas Maratha do século XVI, preparando uma tempestade de iguarias para a família real. O Chef Bhimrao estava sempre experimentando ingredientes e receitas.

O doce favorito do chef Bhimrao era o Parsi Halwa-e-Farsi, feito com amêndoas moídas e açúcar. Inspirando-se nisso, o chef criou sua receita com castanhas de caju em substituição das amêndoas.


O doce resultante foi aplaudido pelos Marathas, quem os batizou devido a sua apresentação em fatias finas (katli) feitas da massa doce resultante das castanhas de caju (kaju). Assim, o Kaju katli logo se tornou iguaria frequente na mesa real e dali encontraria seus caminhos para outros lugares e mesas em toda a Índia.

Para entender a outra versão da história do doce, viajamos para a era Mughal do século XVII.

Um símbolo de liberdade

A história conta que por volta de 1619, o Imperador Jehangir, um governante proeminente da dinastia Mughal (Mogol), capturou vários gurus e monarcas Sikh – um grupo etnorreligioso que segue o Siquismo, uma religião dármica originária do Punjab, no subcontinente indiano, no final do século XV. O termo sikh significa, em língua punjabi, "discípulo forte e tenaz". A doutrina básica do siquismo consiste na crença em um único Deus e nos ensinamentos dos Dez Gurus do siquismo, recolhidas no livro sagrado dos siques, o Guru Granth Sahib, considerado o décimo-primeiro e último Guru.

Dizem que a ortodoxia muçulmana fez o imperador perceber os Sikhs como uma ameaça potencial ao império, e os manteve cativos no forte Gwalior por longos anos. A agonia dos cativos era evidente, e suas condições de vida eram deploráveis.

Guru Hargovind, o 6º Guru Sikh, estava entre os detidos. Com suas instruções, ele ajudou a tornar os prisioneiros autossuficientes dentro do forte e melhorou a qualidade de vida de todos os presos e guardas. O Imperador Jahangir proclamou que o Guru seria libertado e que qualquer um que pudesse segurar seu manto enquanto ele saísse seria libertado. Guru Hargovind secretamente ordenou que os 52 monarcas fizessem um manto longo o suficiente para ser usado por todos na prisão.

No Diwali, todos os presos foram libertados enquanto ainda usavam seus longos mantos. Este dia de independência é conhecido como Bandhi Chor Diwas pelos Sikhs em todo o mundo. Como um sinal de respeito ao guru sikh, o chef real de Jahangir cozinhou o kaju barfi pela primeira vez no dia da emancipação. O kaju barfi era feito com leite engrossado, também chamado de rabri, castanhas de caju trituradas e amêndoas.

Para quem não sabe, o rabri (IAST: Rabaḍī) (Hindi: रबड़ी) pode ser compreendido como um ‘leite condensado indiano’. É uma preparação doce à base de leite condensado, originário do subcontinente indiano, feito fervendo o leite em fogo baixo por um longo tempo até que ele se torne denso e mude sua cor para esbranquiçado ou amarelo claro. Açúcar mascavo, especiarias e nozes são adicionados a ele para dar sabor. É resfriado e servido como sobremesa. Rabri é o ingrediente principal em várias sobremesas indiana, como rasabali, chhena kheeri e khira sagara.

As pessoas acham que a maneira como o Kaju Katli ou Kaju barfi é feito, especialmente o uso de castanhas de caju, pode ter sido inspirado nos estilos de culinária persa e Mughal, especialmente pelo fato de historiadores e pesquisadores darem as suas opiniões que comparar esse doce com a “Halva”, uma sobremesa muito presente no Oriente Médio. E, é preciso ser dito, que os Mughals trouxeram este prato para a Índia quando assumiram o poder naqueles domínios.

Como as guloseimas indianas estão se tornando mais populares fora da Índia, muitas empresas de confeitaria agora fazem Kaju Katli para venda. É fácil encontrá-lo em lojas de doces por toda a Índia, algumas até enviam o doce para outros países com grandes populações indianas.

Ao traçar sobre essas duas histórias principais sobre a origem desse doce imperdível, encontrei na cultura daquele povo três belas outras histórias sobre o Kaju katli que, embora menos conhecidas, merecem destaque. São elas:

O Conto do Marajá Generoso

Dentre as muitas histórias da cultura indiana existe uma tocante sobre um marajá gentil que amava muito seu povo. Ela nos conta que, durante uma seca muito ruim, quando o reino estava no meio da comida e da desesperança, o marajá gentil tentou animar seu povo. Ele sabia que os doces tradicionais do país eram frequentemente caros demais para os pobres, então ele reuniu seus chefs reais e disse a eles para fazerem um doce que todos pudessem aproveitar.

Os cozinheiros inteligentes foram inspirados pelas simples castanhas de caju, que cresciam em grandes quantidades nos pomares do reino, e fizeram o Kaju Katli, um doce único.

Muitas pessoas ouviram sobre o quão gentil o marajá era, e logo, moradores de países próximos vieram provar o que ele havia dado ao seu povo como um presente. Cada mordida do perfeitamente doce Kaju Katli fez as pessoas se sentirem melhor e lhes deu esperança novamente. Embora o marajá fosse gentil, sua memória vive na beleza atemporal do Kaju Katli, um doce lembrete de quão poderosa a gentileza e a doação podem ser.

O poeta apaixonado e sua doce musa

Nas páginas da história, há uma estória tocante sobre o amor que não é correspondido e o poder da criação que dura para sempre.

Dizem que havia um artista talentoso que vivia na corte de um nobre rei e ansiava pela linda filha do rei. Apesar de seus poemas apaixonados e votos sinceros, a princesa não se importava com seu amor; seu coração já estava voltado para outra pessoa.

Mesmo tendo sido rejeitado, o poeta voltou-se para sua arte em busca de conforto, despejando seu amor e desejo em sua escrita. Ele teve uma explosão repentina de inspiração em um dia fatídico enquanto estava sentado sob um cajueiro. Ele escreveu uma canção tão linda que fez até os deuses chorar.

Como os deuses estavam se sentindo bem com aquilo, suas lágrimas caíram sobre as palavras do poeta e as transformaram em Kaju Katli, um doce deleite. O amor do poeta e a magia do que ele escreveu fizeram o coração da princesa se iluminar, e ela finalmente entendeu o quanto ele a amava. Ela disse sim para se casar com o poeta porque gostava mais de sua alma lírica agora. Juntos, eles desfrutaram do doce néctar de seu amor em cada mordida de Kaju Katli.

A descoberta fortuita do comerciante

Nos movimentados bazares da Índia antiga, onde as pessoas compravam e vendiam especiarias, sedas e tesouros de lugares distantes, havia um simples comerciante de caju que teve a sorte mudada num certo dia.

Enquanto ele atravessava o campo vendendo seus produtos para compradores ansiosos, ele se deparou com uma pequena cidade onde o cheiro das castanhas de caju torradas enchia o ar. O cheiro deixou o comerciante curioso, então ele seguiu seu nariz até uma cozinha simples e viu algo que mudaria sua vida para sempre.

Lá, diante do vapor perfumado, um grupo de camponeses empreendedores estava fazendo o Kaju Katli, um doce diferente de tudo que o comerciante já tinha visto. O comerciante inteligente viu uma oportunidade de ganhar dinheiro e fez um acordo com os moradores locais.

Ele comprou a valiosa receita e partiu para levar o Kaju Katli aos mercados em todo o mundo. Com seu sabor irresistível e raízes exóticas, o Kaju Katli rapidamente se tornou um doce popular entre os clientes do comerciante. Isso o tornou um empresário de sucesso e espalhou a palavra sobre a guloseima de caju por todo o país.

Essas são versões bonitas e que, perfeitamente, poderiam ter acontecido depois do episódio inicial até a popularização do doce. Enquanto Kaju Katli reina supremo no reino dos doces indianos, o mundo está transbordando com uma variedade de confeitos deliciosos que têm uma semelhança impressionante com essa adorada guloseima. Abaixo cito alguns exemplos tentadores:

Marzipan (Alemanha): Marzipan é uma pasta de amêndoa doce famosa na culinária alemã. Tem textura e ingredientes semelhantes ao Kaju Katli. As pessoas costumam cortá-lo em formas complicadas e comê-lo sozinho ou usá-lo para decorar bolos e outros produtos assados.

Calisson (França): Calisson é um doce francês tradicional da área ensolarada da Provença. É feito de amêndoas moídas, frutas cristalizadas e açúcar de confeiteiro. Tem gosto de amêndoas e textura mastigável, como Kaju Katli, mas com um pouco de elegância francesa.

Halva (Oriente Médio): Halva é um doce popular no Oriente Médio, possivelmente ele foi a inspiração para o doce indicano. A Halva pode ser vista em muitas formas, mas os ingredientes principais geralmente são tahine (pasta de gergelim), açúcar e nozes. Pessoas que gostam de doces vão adorar essa guloseima porque ela tem uma textura densa e um sabor de nozes que lembra Kaju Katli.

Canjirão de Castanhas: um doce de castanhas de caju originalmente Cearense, muito popular nas cidades de Aracati e Itaiçaba, feito a partir de castanhas de caju moídas, farinha de mandioca e mel de caju.Nesse ponto, quando paro e analiso a minha criação e todas essas histórias do doce indiano, percebo como uma rica tapeçaria de conhecimento e culturas podem ser observadas pela tradição e habilidades culinárias com o uso de ingredientes simples.

                                                            Canjirão de castanhas de caju

Por meio de sua história misteriosa em cozinhas antigas e sua fama duradoura nas mesas de sobremesas hoje, o Kaju Katli continua a encantar corações e papilas gustativas. E, embora não se tenha certeza sobre qual versão de origem ele de fato pertença, é inegável que o Kaju katli é delicioso e atrai pessoas de todo o mundo.

Para os curiosos, deixo abaixo algumas referências que tratam do doce e falam mais sobre a cozinha indiana. E, como de costume, segue abaixo a receita do doce para você fazer em casa. Se fizer, me conta...

 

Kaju Katli

1 xícara ( ou 160 gramas) de castanhas de caju crua e sem sal, em temperatura ambiente

½ xícara (ou 100 gramas) de açúcar

5 colheres de sopa de água

1 colher de sopa de manteiga ghee ou óleo de coco (ou qualquer óleo de sabor neutro), opcional

1 colher de chá de pétalas de rosas picadas ou 1 colher de chá de água de rosas ou 8 a 9 fios de açafrão, opcional

Preparo: Moer as castanhas (pode ser em um moedor de especiarias, liquidificador ou mixer). Use castanhas que estejam em temperatura ambiente e não refrigeradas. Moa até virar uma farinha. Mas, certifique-se de não exagerar no processo de moagem, pois a gordura não deve se soltar das castanhas, lembre-se de moer em intervalos curtos. As castanhas devem estar em pó e não devem ficar pastosa – obviamente, esse pó de castanha vai ter certa umidade, mas não deve virar pasta na moagem. Isso pe fundamental. Se houver pequenos pedaços no ‘pó’ de castanha, deixe-os em paz. Ou opte por peneirar e reserve. NÃO USE PÓ DE CASTANHA DE CAJU COMPRADO, POIS ELES GERALMENTE TÊM ALGUMA ADULTERAÇÃO QUE IMPACTARÁ NO RESULTADO. Com as castanhas moídas, agora façamos o doce. Em fogo baixo, aqueça o açúcar, a água e a manteiga ghee em uma panela de fundo grosso ou antiaderente. Enquanto isso, unte um prato ou uma bandeja e reserve ou deixe papéis manteiga prontos. Quando todo o açúcar estiver dissolvido na água, adicione o pó de caju. Misture e continue mexendo a mistura sem parar em fogo baixo. A mistura começará a engrossar virando uma pasta. Cozinhe por aproximadamente 7 a 9 minutos até que toda a massa comece a se unir. Com esse resultado, tire do fogo, adicione as pétalas de rosa à mistura de caju misture bem. Quando já estiver morna o suficiente para manusear, então amasse levemente a mistura. Achate a massa e coloque-a em um prato ou bandeja untada. Depois de fria, coloque a massa entre duas folhas de papel manteiga, ou numa superfície de trabalho para abrir massas, e usando um rolo abra suavemente a massa de todos os lados até atingir uma espessura de 3 a 5 mm na massa. Remova o papel manteiga e deixe a massa aberta descansar um pouco. Quando completamente resfriada, usando uma faca afiada, corte a massa de caju dando formas de diamante (losangos). Remova delicadamente o kaju katli e está pronto pra servir. Guarde em um recipiente hermético. Você pode decorar á gosto.

Referência:

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