.Neste lado ocidental do mundo alguns países, influenciados pelas veias da colonização ou pelo marketing avassalador do capitalismo, estão se preparando para comemorar o Halloween, o Dia das Bruxas, uma tradição que se iniciou com celtas e druidas no pré-cristão para celebrar uma transição do ano que eles chamavam de Samhain, cujo vinculo religioso se constituía como “a morte do Deus” (que trazia consigo o fim da colheita e o inverno); deus esse que ressuscitaria na estação seguinte, ainda mais forte. No meio disso tudo, se construiu um folclore com muitas lendas, estórias e mitos que converteram antigas tradições camponesas em celebrações vinculadas à bruxaria e aos espíritos malignos, que acabaram sendo usadas, pela disseminação do medo, em uma ferramenta poderosa para manter a hierarquia e controlar a sociedade, promovendo uma visão de mundo que favorecia a Igreja.
Sabe-se que, as populações
mais ignorantes, em grande parte devido à falta de acesso à educação e ao
conhecimento científico, tornaram-se presas fáceis dessas crenças. A Igreja,
que monopolizava a educação e a interpretação da Bíblia, moldou a cosmovisão
das pessoas, fazendo-as acreditar que qualquer desvio das doutrinas aceitas
poderia levar à condenação. Essa manipulação do conhecimento resultou em uma
sociedade onde a superstição prevalecia sobre a razão, perpetuando uma cultura
de medo e controle.
O Halloween é um exemplo
fascinante de como crenças errôneas podem ser perpetuadas por instituições em
busca de controle. A Igreja, ao manipular o medo e a ignorância, conseguiu
moldar a forma como as pessoas viam o sobrenatural, influenciando suas práticas
culturais – ao longo desse percurso, muitas pessoas, na maioria mulheres, foram
assassinadas acusadas de bruxaria pelo simples fato de terem um maior domínio
sobre o conhecimento de uso de plantas, unguentos e venenos. Contudo, a
evolução do Halloween também demonstra a capacidade humana de resistir e
reinventar tradições, transformando medos em celebrações. Essa dinâmica
continua a refletir a complexidade da interação entre cultura, religião e
conhecimento ao longo da história.
Para não ficar muito repetitivo, e ter que tratar novamente sobre o Halloween, algo que já apresentei em algumas postagens que você pode conferir AQUI, AQUI, AQUI, AQUI, AQUI, AQUI, AQUI, AQUI e AQUI. E, hoje queria seguir o clima da estação e a linha do “pouco aterrorizante”, mas fugindo do óbvio. Para isso, resolvi procurar argumentos fora do mundo ocidental. Assim, hoje vou falar do simbolismo de uma pequena flor que poder ser tão fatal quanto a ignorância.
Num mundo onde se redescobre
a imensidade de formas, usos e gostos com as plantas comestíveis não
convencionais – PANCs, também se encontra plantas altamente tóxicas e
letais. Logo, é altamente importante e
necessário o domínio do conhecimento sobre plantas para que não haja um
pandemônio, sobretudo na cozinha.
O conhecimento antigo do
mundo das plantas dominado inicialmente por mulheres ainda no período
horticultural, antes mesmo do surgimento da agricultura já demonstrava a
importância de se entender de plantas, seus ciclos e suas produções,
particularmente para a sustentar a alimentação. Mais tarde, esses conhecimentos
ganhariam ainda mais poder e seriam ampliados por xamãs, curandeiros e bruxas,
que aumentaram exponencialmente o uso da flora para alimentação, fármacos,
produtos de beleza, construção dentro outros fins.
Nesse sentido, hoje você vai
conhecer um pouco mais sobre o Lirio-aranha vermelho – que, no final, serviu
para inspirar uma bebida interessante que você pode servir na sua festa de
Halloween e, com ela, ter mais conteúdo de conversas que fujam do óbvio.
A história do lírio-aranha
vermelho começa com uma bela cena outonal no final de setembro durante o
feriado budista de Ohigan (o O é um título honorífico e Higan significa “a
outra margem”). Por um lado, esse
feriado tem algo semelhante com o Halloween, pois, na verdade, Higan é uma
abreviação de Tôhigan, onde Tô significa “atravessar” e como Higan quer dizer
“A Outra Margem”, Tôhigan que dizer “atravessar para a outra margem”. Tô é a
parte mais significativa da palavra Tôhigan. Higan, a menos que sejamos muito
cautelosos, torna-se um conceito. Mas Tô (atravessar, ir) não é um conceito; é a
experiência, é a vivência. Desse modo, o importante é atravessar para a outra
margem, e eu gostaria de enfatizar mais o Tô do que o Higan. Ele recomenda
viver o dia-a-dia. O destino, a meta, o fim, o Higan, acaba por ser alcançado
se você dá cada passo no caminho perfeito. Se os meios são perfeitos, é natural
que alcancemos o objetivo perfeito. Assim, os meios são mais importantes que o
objetivo. Eu não deveria dizer “mais importantes”, pois isso divide os meios e
os fins em duas coisas, enquanto que os meios são fins e os fins são os meios. Sabendo-se
isso, a palavra Higan torna-se perfeitamente compreensível sem o acréscimo do
verbo Tô. Atravessar é dar vida à outra margem – logo, seria acreditar também
que essa outra margem é puramente real.
É esse período de tempo,
logo antes do equinócio de outono deu origem a um dos folclores mais
fascinantes para a existência de qualquer flor do mundo. No Japão, Ohigan é uma
época para voltar para casa para visitar túmulos e prestar homenagem aos
ancestrais. Também coincide com o breve período de floração do lírio-aranha
vermelho (Lycoris radiata), que floresce incomumente no outono. Por causa da
associação da flor com Ohigan (お彼岸) e o equinócio
de outono (彼岸), essa flor é conhecida em japonês como
Higanbana (彼岸花).
A primeira vez que eu me
deparei com esses seres florais requintados, aqui mesmo no Ceará, paralisei,
mas nem sabia que ela era tudo isso – admirei a cor, a beleza e segui. É uma
flor impressionante, elegante e intimidadora. Ela é alta e sem folhas, seu
longo caule se ergue do chão e no topo, fica uma linda coroa de flores com
longos tentáculos esticados ao redor dela. Ela exige respeito e espaço para
exibir sua opulência.
O lírio-aranha vermelho pode
ter muitos nomes diferentes, seu nome latino é Lycoris radiata, mas ela é
conhecida como flor do inferno, lírio mágico vermelho, flor do equinócio, flor
da morte, dentre outros.
Por enquanto, vamos chamá-la
apenas de Lycoris. E ela é muito mais do que apenas uma flor bonita: em cada
centímetro de seu corpo botânico, o veneno corre em suas veias. Sua raiz
bulbosa, folhas elegantes e coroa de flores que contêm um alcaloide tóxico chamado
licorina que tem comprovada ação emética, analgésica, anti-inflamatória,
estimulante respiratória, anticancerígena, antiviral e expectorante. Mas, em
contrapartida, se ingerida causará dor abdominal, salivação, tremores, náusea,
vômito, convulsões, paralisia e se for ingerido em grandes quantidades é letal.
As flores de Lycoris não
nascem com a primavera, nem florescem no verão. Ela floresce com a cortina do
outono, depois que todas as suas folhas murcham. Na mitologia chinesa, há uma
lenda sobre a singularidade dessa flor. Ela é cercada por um mito de morte,
perda e tristeza, porque por trás de sua beleza há uma história trágica.
Um outro nome para o
lírio-aranha vermelho é "Mañjusaka" (em chinês) e
"Manju-syage" (em japonês), e eles fazem relação direta com a
existência de seres mitológicos que você conhecerá a partir de agora. Essa
história tem raízes japonesas, mas foi levada para partes da China, o que
explica as versões variadas e, as vezes confusas, que se encontra por aí.
Tudo começa com a deusa do
sol Amaterasu (cujo epiteto completo é Amaterasu-ōmikami, ou seja, "a
Grande Deusa Augusta que ilumina o céu”, deusa do círculo mitológico japonês
que domina o panteão do Xintoísmo), designando dois espíritos da natureza que
aqui vamos identificar como elfos (mas, há quem diga que eram fadas) para
proteger as flores e as folhas de forma independente.
Lycoris (vamos chamar assim,
o lírio-aranha vermelho) nem sempre foi assim, costumava haver estações em que
ela estava inteira. Um breve momento no tempo em que suas folhas e flores se
cruzavam e naquele pico de sua magia ela era bem protegida por dois elfos
leais. Um, chamado Mañju, que protegia a flor, enquanto o outro, chamado Saka,
protegia as folhas.
A maioria dos elfos
encarregados de proteger a flora sagrada trabalhavam juntos em harmonia; as
folhas captavam a luz do sol e forneciam nutrientes para a flor que criava
sementes e pólen para uma nova vida.
Lycoris era diferente, ela
esperava seu tempo, armazenando sua energia de suas folhas durante toda a
estação e esperando até o outono para florescer. Ela preferia apresentar sua
beleza então, depois que toda a outra flora começasse a perder vitalidade e murchar.
Até que fossem apenas ecos de beleza e ela sozinha brilhasse, como uma flor
brilhante de fogo no campo. Uma surpresa etérea e deslumbrante para todos os
seus espectadores. Uma estação em que ela seria a flor mais bonita.
Mañju e Saka gostavam
bastante dos caprichos de Lycoris. Apesar de todo seu orgulho intimidador, a
flor era imensamente charmosa e gentil com seus servos élficos. Embora eles
perdessem o luxo da companhia élfica, eles tinham muito orgulho e cuidado em proteger
a flor mais mágica do reino.
Haveria um ano ocasional,
quando a estação mudava para o outono, onde os elfos se cruzavam. Eles nunca
tinham muito tempo para conversar, mas os dois se cortejavam através da
linguagem da doação de presentes de colheita.
Alguns anos, Saka pedia às
abelhas para enviarem mel e delícias para Mañju durante a floração do outono, e
Mañju coletava cristais extravagantes e deixava pólen brilhante no caule para
decorar o retorno de Saka.
Naturalmente, com o passar
dos séculos, os elfos ficaram cada vez mais curiosos um sobre o outro. Lycoris
gostava bastante das brincadeiras entre os dois. Ela era uma entidade antiga e
lhe dava alegria ver os dois elfos flertando. Ela nunca admitiria, mas ela
adorava participar de ideias de presentes e surpresas sazonais. Em noites
calmas, Lycoris permitia que os elfos lhe contassem histórias. Depois, ela
ilustrava para Mañju as histórias de Saka; como durante dias tempestuosos,
quando parecia que seus caules iriam quebrar, seu protetor abraçava Lycoris
através dos ventos fortes e da chuva para manter seu caule firme e gracioso.
Ou, como ela observava com admiração enquanto a bela Saka trabalhava na luz do
sol com a força de um javali, revirava o solo novo sobre seu bulbo de raiz e
coletava composto para nutrição. Lycoris amava que Saka arrancasse suas folhas
menos atraentes e massageasse o novo crescimento para garantir que ela tivesse
a vegetação mais forte para coletar nutrientes para sua semente.
A estação da floração passou
e Mañju e a floração retornaram à hibernação, e Saka e as folhas despertaram da
delas. Lycoris, é claro, contava as histórias de ambos. Entretendo Saka com
histórias de Mañju. Afinal, era sua época favorita do ano. Ela adorava o olhar
aguçado de Mañju para a beleza.
Mañju garantiria que a luz
do sol atingisse sua flor perfeitamente durante sua floração. Usando uma
colocação metódica de pedras e cristais para refletir a luz em sua flor das
maneiras mais lisonjeiras. Ela se orgulhava quando humanos e animais paravam para
encará-la. Mañju cuidava de seus estames, certificando-se de que seu pólen
estivesse fofo, saudável e brilhante e que suas pétalas estivessem brilhantes e
perfeitamente enroladas. Seu tempo com Saka a fez se sentir protegida, vital e
forte, enquanto seu tempo com Mañju a fez se sentir confiante, fértil e
opulenta.
Ambos os elfos estavam
apaixonados, eles ouviam as histórias repassadas por Lycoris com admiração, mas
sempre havia uma pontada de melancolia puxando o coração. Um amor que nunca
poderia ser. Deveres que não podiam ser abandonados. Os elfos fantasiavam em
conhecer o outro, dançar juntos e contar histórias da própria flor. Lycoris
ria, mas então suspirava, avisando-os de que eles nunca poderiam se encontrar
nesta vida, pois, pelas leis da natureza, eles nunca deveriam deixar seus
postos como guardiões da ordem natural. Sua beleza, apesar de toda a sua
vaidade, era um valor definido dentro da lei da natureza. A flor aconselhou os
elfos com uma sabedoria antiga. A sabedoria de uma entidade ligada à natureza
para viver um ciclo de vidas sem fim.
“Mantenha seu vínculo forte.
Sua vida é apenas um piscar de olhos da minha eternidade. Em momentos de tempo,
vocês dois morrerão e deixarão de ser elfos. Meu presente para vocês por seu
serviço leal serão milhares de vidas envoltas nos braços um do outro. E quando
essas vidas terminarem, lá estarei em seus túmulos, levando-os um ao outro.”
Claro, os elfos ficaram com
o coração partido, mas se confortaram com o conselho da flor. Eles eram apenas
elfos nesta vida e deviam obedecer às leis da natureza, pois são guardiões
dela. Na próxima vida, eles poderiam, talvez, ficar juntos.
Então, durante o outono nos
anos ímpares quando as flores e as folhas passavam umas pelas outras, e Mañju e
Saka só trocavam sorrisos e desejos rápidos de boa estação. Séculos se passaram
e momentos de tempo para uma flor antiga eram excoriantes para um elfo
apaixonado.
Havia uma fome brotando
dentro deles. Uma fome que passou despercebida até se transformar em uma
devastação, uma luxúria. Os elfos queriam se tocar, ser abraçados, se entregar
a horas de conversa. Essa fome aumentaria ano após ano até que uma estação, quando
os dois passaram, eles decidiram fazer um pacto. Ambos abandonariam seus postos
para ficarem juntos por apenas uma noite.
Lycoris em toda a sua
sabedoria ancestral implorou aos dois. A Deusa do Sol não ficaria satisfeita.
Quando seus olhos tocassem toda a superfície da terra ela veria a ordem sendo
interrompida. Ela sentiria isso em seu próprio ser. Os elfos discordaram. Eles
achavam que tinham descoberto uma forma de se encontrarem: se eles se
encontrassem à noite, a Deusa do Sol não ficaria sabendo. Ela é a mãe de todos
e certamente poderia ter compaixão nas leis do amor.
Lycoris foi gentil em
discordar dos elfos. Ela era muito mais velha e não apenas entendia as leis da
natureza, mas também do descuido no amor. A Deusa do Sol é um ser complexo,
seus deveres na natureza são espalhar calor e vida para aqueles que encontra. O
Sol está sempre profundamente preocupado com o estado do mundo ao seu redor, o
que a torna uma criatura de rotina, ela exige equilíbrio. Lycoris explicou que
não há dúvida de que o Sol é uma força da natureza. Ela não é uma entidade que
entende benevolência. O Sol é rápido para temperar e toma decisões na
velocidade da luz, estas nunca devem ser revertidas.
Os elfos desconsideraram o
aviso, a ideia de estarem juntos valia o risco. Isso fez Lycoris balançar de
ansiedade e conforme a estação mudava e chegava a hora dos caminhos dos elfos
se cruzarem novamente. Enquanto suas últimas folhas murchavam lentamente e seu
botão floral começava a se formar, os dois elfos se encontraram no meio das
estações para ficarem frente a frente.
O tempo pareceu parar. Houve
uma mudança no ar enquanto os dois olhavam nos olhos um do outro, próximos o
suficiente para se tocarem. O puxão da natureza os puxava e chicoteava seus
corpos como um vento violento tentando inaugurar as estações. Esses elfos só
conseguiam suportar o fardo e olhar com admiração para a imensa beleza um do
outro. Os guardiões míticos do Lírio-Aranha vermelho que, por séculos
protegeram a mesma flor, encontrando-se apenas de passagem, captando olhares
oníricos um do outro, comunicando-se em um código sazonal de presentes, agora
estavam juntos. Mañju sorriu e estendeu a mão para Saka calorosamente. Os dois
se encontraram e se abraçaram profundamente.
Esse era o tipo de abraço
que faz alguém tremer de ansiedade, um encontro de duas almas que estavam
destinadas a se separar. Como uma corrente, era poderoso, estimulante e, para
os elfos, era mágico. Naquela noite, eles passariam dançando, conversando e rindo
um com o outro, longe do olhar matinal da Deusa do Sol.
No entanto, assim que o
orvalho do amanhecer se formou, a Deusa do Sol acordou com fúria ardente. Ela
ficou inquieta a noite toda. Essa pequena corrente que os elfos fizeram quando
se encontraram havia se transformado em ondas violentas na mente da Deusa. Elas
haviam interrompido o equilíbrio junto com o sono divino da deusa e ela não
estava satisfeita.
Ela brilhou pela terra em
uma luz dourada ofuscante, vasculhando a terra furiosamente, procurando por
qualquer sinal de desequilíbrio e exigindo saber o que a perturbara ao logo da
noite. Ela procurou nas ondas do oceano, nas dunas do deserto, nos picos das
montanhas, sem encontrar nada. As criaturas da terra se esconderam, sentindo a
fúria quente do Sol em seu estado errático. Ela estava imparável, com raiva e
muito cansada. Foi somente quando ela passou por Lycoris e seu campo de flores
que sentiu o desequilíbrio e parou. A flor estava alta e orgulhosa como sempre,
mas ela estava desprotegida, sua magia desobstruída e desprotegida,
derramando-se sobre a terra em ondas de um poder estagnado.
A Deusa olhou curiosamente
para a flor, que murchava lentamente debaixo do seu calor. Ela estava curiosa
para saber por que Lycoris não floresceu em seu devido tempo. Ela não conseguia
entender por que a flor mais vaidosa da terra deixaria de lado seu orgulho e
beleza para perder sua floração, o auge de sua magia. Lycoris não respondeu,
ela apenas se curvou respeitosamente, murchando na presença do Sol. A Deusa
ficou furiosa. Exigindo saber para onde a guardiã outonal das flores tinha ido.
Lycoris, junto com o resto do ecossistema, permaneceu em um silêncio
aterrorizante. A Deusa do Sol ardia e gritava por respostas, queimando
lentamente Lycoris.
Em proteção à flor, os elfos
rapidamente emergiram de seu esconderijo juntos. Suas mãos se entrelaçaram e
suas cabeças se curvaram vergonhosamente diante desta entidade flamejante. A
Deusa do Sol estava tão brilhante e irada que os elfos não conseguiam olhar
para ela, mas apenas tremer em sua presença. Eles imploraram para que ela
cortasse a flor e seus campos. Admitindo que foram avisados desse resultado. A
deusa se virou para Lycoris, repreendendo a flor por encorajar essa união e por
seu silêncio sobre o assunto.
A Deusa do Sol, em uma névoa
de uma noite sem dormir e um acesso de raiva, decidiu que os elfos haviam
traído as leis da natureza e não eram mais confiáveis para cumprir seus deveres
enquanto estivessem juntos. Os elfos soluçaram e imploraram aos pés da Deusa.
Eles estavam apaixonados! Certamente, ela poderia entender e permitir que eles
continuassem a passar um pelo outro silenciosamente como costumavam fazer. A
Deusa estava lívida. Ela não tinha capacidade de misericórdia em sua ira e
nenhuma compreensão do amor, apenas ordem. Ela levantou as mãos, lançando uma
forte maldição sobre os elfos e Lycoris.
As folhas de Saka podem
nunca mais encontrar as flores de Mañju. Era isso. Os dois estavam fadados a
nunca mais se encontrarem. Não nesta vida, ou em qualquer outra. Eles nunca
passariam um pelo outro, nunca sorririam um para o outro, nunca trocariam olhares.
Eles seriam presos a um labirinto de almas, para nunca mais se encontrarem.
A maldição seguiu seu curso,
separando os dois pelo resto daquela vida, e a flor, Lycoris, também sofreu. O
que antes era sua preferência orgulhosa por flores, agora era uma maldição
vergonhosa da natureza para a flor. Suas folhas agora murchariam bem antes de
sua floração, deixando-a com um caule simples e nu até sua floração. A dor da
tristeza que ela sentia pelo destino de seus elfos e sua amargura por essa
característica amaldiçoada se manifestaram séculos depois em um veneno tangível
que, até hoje, corre por suas veias, raiz e flor enquanto ela lamenta o destino
dos amantes que tão lealmente a protegeram.
Foi dito que após a morte, o
casal se encontrou na vida após a morte. Eles juraram se encontrar após a
reencarnação. No entanto, nenhum deles seria capaz de manter sua palavra, pois
a maldição da Deusa do Sol seguiu os elfos por vidas inteiras.
Depois desse episódio,
diz-se que, se você conhecer uma pessoa que nunca mais verá, as flores de
Manjusaka crescerão ao longo do caminho que eles percorreram quando partiram.
Até hoje, pode-se considerar que Lycoris é alguém que cumpre sua promessa. Crescendo
em campos onde os mortos são sepultados, guiando os espíritos para a próxima
vida, secretamente esperando tropeçar nas almas de seus guardiões para um dia
guiá-los a um lugar onde eles possam finalmente ficar juntos.
Embora seja uma lenda, a
história mostra a realidade da floração outonal do lírio-aranha vermelho, que
floresce bem antes das folhas saírem. Um aglomerado de flores vermelhas
brilhantes, semelhantes a aranhas, com longos estames brilham no topo de um caule
verde e fino, criando uma camada vermelha sobre a paisagem. O brilho vermelho
desaparece rapidamente à medida que as pétalas murcham, deixando a planta nua.
As folhas então emergem, trazendo a vida de volta à planta mais uma vez antes
que elas também fiquem marrons e a planta retorne ao solo, morrendo pela
segunda vez.
Uma flor de muitos nomes
Mas esses estão longe de ser
os únicos nomes para o lírio-aranha vermelho. No Japão, essa flor tem mais
nomes. Muitos desses nomes estão relacionados ao folclore único da flor, que é
multifacetado. Curiosamente, muitos (se não a maioria) dos nomes estão associados
à morte e os motivos são interessantes.
Durante o Ohigan, quando os
lírios-aranha vermelhos estão em flor, eles são uma visão muito comum em
cemitérios, mas não são encontrados ao redor de lápides porque são deixados
como memoriais. O motivo real está na botânica interessante desta planta e é muito
mais macabro. A planta inteira, do bulbo à flor, é venenosa.
Em tempos históricos no
Japão, corpos humanos eram enterrados diretamente no solo e a perturbação por
toupeiras, raposas ou outros animais, escavando ou catando as ossadas mortas,
era um problema comum. Para garantir que os túmulos fossem deixados em paz, as
pessoas plantavam os lírios-aranha vermelhos venenosos sobre corpos enterrados
para deter os animais. Túmulos e morte logo foram associados ao lírio-aranha
vermelho, o que lhe rendeu o nome de "flor da morte" e o ainda mais
sombrio, "flor-cadáver".
Além dos cemitérios, o
método de plantar bulbos de lírio venenoso como uma forma de controle animal se
estendeu às margens de rios e campos agrícolas, como arrozais – para proteger
também as colheitas.
Uma superstição comum em
torno da flor era que, se você colhesse uma delas e levasse para casa ela faria
sua casa queimar. Como acontece com muitas superstições e mitos, essa pode ter
sido uma forma de assustar as crianças para impedi-las de tocar na planta
venenosa.
Como esse tipo de lírio era
plantado ao redor de túmulos, quando as flores vermelhas floresciam da mesma
cor de sangue, acreditava-se que elas atraíam (ou sugava) o sangue dos mortos,
ligando-as ainda mais à morte. E enquanto balançavam na brisa, alguns pensavam
que pareciam fantasmas, dando a elas outro nome de "flor fantasma".
A conexão da flor com o
budismo é mais do que apenas a coincidência de florescer durante a celebração
de Ohigan.
Um dos poucos nomes não
associados à morte, a flor também é chamada de Manjushage (曼殊沙華) (pronuncia-se Mandyuu shaguê), que vem
das escrituras budistas. O Manjushage é uma flor celestial que não existe entre
nós, mas o lírio-aranha vermelho foi plantado por monges para representá-lo e,
portanto, associado aos templos budistas – essa flor simboliza que a noite se
torna maior que o dia. Simboliza o fim de nossa existência, o esfriar, a
despedida, o esquecimento. Existem
também lírios-aranha brancos, que tendem a ser mais comumente conhecidos como
Manjushage.
"Higan" tem um
significado além do feriado para homenagear os ancestrais. No Sutra do Coração
Budista, higan significa "a outra margem", referindo-se ao mítico Rio
Sanzu. Os espíritos cruzam este rio para alcançar a iluminação, por isso é
frequentemente visto como um símbolo de passagem para a morte. Lírios-aranha
vermelhos crescem ao longo das margens do Rio Sanzu e saúdam os espíritos
recém-falecidos.
Em outro texto budista, o
Sutra de Lótus, Diyu é o reino dos mortos, ou inferno, e diz-se que os
lírios-aranha vermelhos crescem lá, marcando um caminho para guiar os espíritos
à reencarnação. Outro nome para os lírios é "flores do inferno".
Simbolismo em Anime
O simbolismo difundido do
lírio-aranha vermelho no Japão é usado regularmente nas artes, da literatura à
música, cinema e animação. Até mesmo espectadores casuais de anime
provavelmente já encontraram o lírio-aranha vermelho em vários deles. A flor
aparece regularmente, às vezes como uma imagem passageira, outras vezes, como
um símbolo mais arraigado em um anime ou de um personagem. Mas, nunca está lá
por acaso.
No Japão, algumas flores são
tão simbólicas e significativas que há uma palavra usada para denotar essa
linguagem não falada: hanakotoba. Glicínia, sakura, ameixa e crisântemo são
apenas algumas flores que simbolizam coisas diferentes e importantes na cultura
japonesa.
Um buquê raramente é simples
e muitas vezes cheio de significado não dito, tanto quanto a aparência
aparentemente casual de uma flor no anime. O lírio-aranha faz parte dessa rica
linguagem das flores e muitas vezes é usado para prenunciar uma morte iminente.
Lírios-aranha vermelhos em
Kimetsu no Yaiba
Lírios-aranha vermelhos
podem ser vistos de passagem em um dos animes mais populares, Kimetsu no Yaiba
(鬼滅の刃), popularmente conhecido no ocidente
como Demon Slayer, geralmente aparecem nos créditos finais. Em um programa
cheio de morte, isso não seria apenas um prenúncio, mas uma promessa.
Curiosamente, há também um lírio-aranha azul fictício que entra na história do
demônio muzan.
Os lírios-aranha desempenham
um papel maior no mangá e anime, Tokyo Ghoul (東京喰種),
de Sui Ishida. Outra história onde a morte é inevitável e frequente, as flores
fazem aparições regulares ao longo da história. Mas nesta história, os lírios
não simbolizam apenas a morte. Em uma cena em particular, o personagem
principal, Ken Kaneki, é dramaticamente torturado e, à medida que sua mente e
corpo começam a quebrar, um campo de cravos brancos se transforma em
lírios-aranha vermelhos, simbolizando sua metamorfose em uma pessoa totalmente
diferente enquanto ele é destruído.
Talvez o uso mais comovente
do lírio-aranha vermelho que já vi em qualquer anime seja no episódio 9 do
programa, Dororo (どろろ), de Osamu
Tezuka (o mesmo artista que criou Astro Boy). A história segue o misterioso
Hyakkimaru e a criança órfã Dororo. O episódio 9 é carregado de simbolismo do
lírio-aranha vermelho, pois encontra Dororo doente e encontrando as flores,
levando a um flashback. Tenzuka deve ter percebido que outro nome para a flor
era "flor de criança abandonada" e definiu habilmente esse nome nesta
história trágica onde Dororo conta como ela se tornou órfã. A cena final, onde
sua mãe finalmente morre de fome, incapaz de continuar, é em um vasto campo de
lírios-aranha vermelhos. Cercada pelas flores, ela morre e Dororo é abandonada.
Depois desse contexto todo,
imagino uma festa de Halloween, mais chique, sem muitas das coisas obvias, com
ambiente decorados com flores de lírio-aranha vermelho e, para seguir a
superstição japonesa, que associa essa flor com o fogo, não seria nada mal apresentar
para os convidados, um drink com a cor intensa da flor e pegando fogo... essa é
a ideia da bebida a baixo.
COQUETEL LÍRIO-ARANHA VERMELHO
FLAMEJANTE
Para o Xarope de tomilho e framboesa (xarope de sangue) (rende cerca de 1 xícara / 240 mL)
340 g de framboesas congeladas
3 raminhos de tomilho
100 g de açúcar branco (o que equivale a
½ xícara)
120 mL de água (equivale a ½ xícara)
1 gota de corante alimentício marrom 1
gota pequena de corante alimentício em gel marrom (opcional se você quiser
escurecer ainda mais a cor do xarope)
Para o Coquetel - para um coquetel
67 mL de rum branco (usei Bacardi)
44 mL de xarope de tomilho e framboesa
(receita acima)
22 mL de suco de limão espremido na hora
2 cubos de gelo
⅛ colher de chá de pó de brilho perolado
ou vermelho pó de brilho (opcional)
1 ½ colher de chá de rum Bacardi 151
opcional (MANUSEIE COM CUIDADO)
Preparo: Primeiro prepare o xarope - Coloque
todos os ingredientes em uma panela (exceto o corante marrom), 340 g de
framboesas congeladas, 3 raminhos de tomilho, 100 g de açúcar branco, 120 mL de
água. Cozinhe a mistura em fogo médio-alto. Mexa até que o açúcar dissolva e
deixe a mistura ferver. Mexa com frequência até que as framboesas amoleçam e se
quebrem na calda. Retire a calda do fogo e deixe esfriar completamente. Isso é
importante, pois as framboesas e o tomilho vão infundir a calda. Coe a mistura
em uma peneira fina para remover um pouco da polpa e das sementes. Não aperte
muito a polpa, pois você não quer muita polpa no xarope. O xarope não deve
ficar turvo. Adicione o corante alimentício marrom para deixar o xarope com uma
cor vermelha um pouco mais escura. Esta é uma etapa opcional. Despeje o xarope
em uma garrafa e guarde na geladeira. Montando o coquetel:
Coloque todos os ingredientes em uma coqueteleira com gelo (e junte o pó de
brilho também, se quiser um coquetel brilhante). Agite por alguns segundos para
gelar o coquetel. Coe o coquetel em uma taça coupé. Na hora de servir, ele deve
estar em chamas, para isso, coloque uma colher de coquetel sobre a superfície
do coquetel e cuidadosamente coloque o rum 151 sobre o coquetel.
Cuidadosamente, acenda a camada de rum 151 usando um fósforo ou isqueiro. Isto
é apenas para o teatro e não tem impacto no sabor do coquetel. Antes de
consumir o coquetel, o fogo DEVE SER APAGADO. Coloque um pires ou um prato
pequeno sobre o copo para apagar a chama. O coquetel pode ser apreciado depois
que as chamas forem apagadas.