Eu recebo muitos comentários
e questionamentos, tanto no blog quando na página do Facebook, muitos deles são
desejando saber curiosidades; outros tantos são pedindo que trate de
determinado prato ou prática alimentar. Mas, também aqueles leitores e leitoras
que dividem comigo suas experiencias gastronômicas, especialmente quando fazem
viagens ou são brasileiros vivendo em outros países. Esses dias, enquanto eu
publicava as postagens sobre o Natal um questionamento surgiu de algumas
leitoras, brasileiras que estão morando na França ou que já passaram alguns
natais naquele país: os comentários giraram sobre a questão do impacto cultural
observado a partir das mesas de natal na França, particularmente pelo fato de
serem preparações frias servidas como o ápice da mesa natalina, cujas ostras
ganham destaque central.
Eu até relutei em não postar sobre isso este ano, mas, o algoritmo do TikTok deve ter “ficado de olho nas minhas conversas” e me mandou um vídeo de uma brasileira que mora na França a mais de seis anos, a Lívia Melina. No vídeo, ela comentava justamente sobre o impacto do Natal na França, a partir da mesa, e num parte do vídeo ela se depara com a prática dos franceses de comer ostras no Natal. Ela conta a sua experiência, desde quando via as gondolas de mercados montando lugares de destaque para as ostras – algo que para nós, no Brasil, teriam em exposição perus, pernis, tenders, chesters e outras carnes natalinas. Com isso, estava claro que eu não deveria fugir dessa postagem. Então, é sobre isso que irei apresentar hoje.
Pra começo de conversar, é
preciso que se entenda que a ostra está presente nas refeições humanas desde o
inicio dos tempos. Ou, pelo menos, “desde que o homem conhece o mar”, como
justifica a jornalista científica Marie Lescroart no livro “60 clés pour comprendre
les huîtres” (60 chaves para entender as ostras), publicado em 2017, que revela
ainda que nossos ancestrais pré-históricos tiveram a sorte de viver no litoral,
já aproveitavam as ostras pelo simples fato de eles só precisavam se abaixar
para pegá-las – eram tempos diferentes.
Antigamente, a ostra era tão
apreciada pelos gregos e romanos que eles já utilizavam parques de reprodução.
A partir do século XVII, a demanda foi tanta que os bancos naturais diminuíram:
a moderna criação de ostras nasceu no século XIX. As técnicas atuais variam
dependendo da localização e da tradição, mas leva de dois a três anos para que
a ostra esteja comercializável. Mais tarde, com o tempo, saberíamos que as
ostras triploides (que três conjuntos de
cromossomos e são valiosas para a indústria de aquicultura comercial devido ao
seu potencial de crescimento rápido, qualidade superior da carne (especialmente
no verão), capacidade de colheita durante todo o ano e baixa pressão ambiental
sobre as populações selvagens triploide), desenvolvida por pesquisadores seria
uma opção para consumido o ano todo porque, por ser estéril e não se
reproduz sem as manipulações humanas .
A ostra é um molusco
bivalve, que pertence à família Ostreidae e que se fixa em rochas ou permanece
em fundos lamacentos. É consumida desde os tempos pré-históricos pelas
populações costeiras. Durante o período antigo na bacia do Mediterrâneo, os
gregos se deliciavam com elas. Depois deles, os romanos ficaram entusiasmados
com esse molusco. Eles traziam do Mediterrâneo e do Atlântico e criaram parques
de reprodução.
O consumo de diferentes
moluscos pelo homem sendo muito antigo, remonta às sociedades de
caçadores-coletores do Paleolítico, mas era algo especialmente específico
daqueles que viviam no litoral. Esse consumo é explicado pelo fato de que a
coleta de mariscos era fácil e permitia que a maior parte de uma comunidade
fosse alimentada com pouco esforço. O sítio neolítico de Saint-Michel-en-l’Herm
apresentou uma quantidade muito grande de conchas de ostras da espécie Ostrea
edulis nas quais foi demonstrada a intervenção humana para alimentação. Na
Gália (região que antigamente correspondia a atual França), antes da conquista
romana, havia o consumo de muitos frutos do mar, especialmente mexilhões.
É a partir da época do
Império romano que os vestígios de marisco encontrados vão mudar na escolha das
espécies, mas também nos locais de consumo. Os romanos implementarão uma
melhoria nos meios de transporte que permitirá o consumo de mariscos bem no interior,
já que restos de conchas de ostras foram encontrados no território Arverni, em
Autun, mas também na Suíça, bem como em Trier. E ao mesmo tempo os romanos iam
transmitindo os seus gostos pelos mariscos, uma vez que observamos uma
generalização do consumo de ostras e ao mesmo tempo uma rarefação do consumo de
mexilhões, enquanto o consumo de vieiras parece manter-se estável.
Os gregos já comiam ostras
há muito tempo e não parecem ter adquirido esse hábito alimentar dos egípcios
ou das populações semitas, que consideravam os mariscos alimentos impuros (sem
dúvida porque o clima aumenta os riscos de envenenamento). Parece que foi
através do contato com os gregos que os romanos começaram a ter esse gosto por
ostras (e outros animais com conchas), pois descobertas arqueológicas na Itália
mostram uma ausência de conchas, exceto raras exceções, antes do século I a.C.
O que se observa ao longo da história é que foram os membros da Elite romana
que trouxe esse interesse de volta de suas viagens pela Grécia durante suas
conquistas e seus estudos.
No entanto, esse uso não era
necessariamente bem visto, seja porque esse consumo era visto como estrangeiro,
seja porque era visto como um luxo que os costumes romanos tendiam a
desaprovar, principalmente M. Aemilius Scaurus quando era cônsul em 115 aC.,
proibindo o consumo de ostras. Dito isto, é provável que a medida tenha sido
pouco seguida porque sabemos que Caio Sergius Orata, inventor dos tanques de
ostras, fez fortuna no comércio de ostras do Lago Lucrin nos anos seguintes a
este ato, o que lhe valeu um julgamento. por poluição do domínio público, na
qual foi defendido por L. Licínio Crasso (irmão mais velho do famoso
triúnviro). Além disso, tudo indica que Crasso, Orata e Asclepíades (médico
grego) teriam manobrado para criar uma hierarquia de bens como vinhos e
mariscos, com o objetivo de criar a ideia de bens de luxo ou, ao contrário, de
bens de primeiro preço.
Caio Sergius Orata e os parques de ostras
Embora a coleta de
diferentes tipos de moluscos existisse desde o início dos tempos, o mesmo não
acontece com a criação de moluscos. De modo geral, as populações próximas às
costas marítimas contentavam-se em coletar as conchas que encontravam. Dessa
forma sabemos que todo tipo de marisco era consumido, até que os “depósitos” se
esgotaram. Mesmo com o boom econômico do mundo romano, estas práticas pouco
mudarão o que levará, devido à procura, a que a apanha de ostras ainda não
tenha capacidade de reprodução e vemos nos vestígios encontrados que o tamanho
dos moluscos diminuiu gradualmente entre os séculos I e Séculos V, até que
nenhum consumo local pôde ser estabelecido, o que é um sinal de esgotamento de
recursos ou de falta de interesse por essas colheitas. (razão econômica ou
social).
Caio Sérgio Orata, um
notável romano do início do século I a.C., é considerado o inventor da criação
de ostras. Ele havia desenvolvido bacias nas margens do Lago Lucrin, na Baía de
Nápoles, através das quais desviava o aluvião para alimentar as ostras e nas
quais colocava restos de telhas ou mesmo varas entalhadas para facilitar a
suspensão das ostras. Ele também mandou cavar um canal para permitir a entrada
de água do mar e garantir um certo nível de salinidade. Não se sabe se as
técnicas de Orata foram aplicadas na Gália, mas elas têm uma posteridade, já
que Plínio, o Velho, as menciona quase dois séculos depois, o que supõe sua
utilização, mas desde sua invenção as técnicas de cultivo de ostras mudaram
muito pouco.
No entanto, isso não lhe
causava problemas, pois o lago era de domínio público, as estacas ali plantadas
podiam interferir nas linhas de pesca, o que prejudicava as atividades dos
pescadores. Segundo Valério Máximo e Cícero, um pescador chamado Consídio exigiu
um julgamento contra ele, no qual foi defendido por L. Licínio Crasso. O
resultado do julgamento é desconhecido, mas uma frase do apelo de Crasso
sobreviveu, provavelmente preservada para o humor do orador: "Meu amigo
Consídio está errado ao pensar que, ao remover Orata do Lago Lucrino, ele o
privará de ostras; porque se lhe for proibido levar alguns para lá, ele saberá
como encontrar algumas nos telhados de suas casas.” Essa piada é uma referência
aos restos de telhas usados na criação de ostras e às casas que Orata comprou
por um preço baixo antes de instalar banhos quentes com hipocaustos e depois
revendê-los com lucro (o que foi a fonte de (outros julgamentos).
Se o gosto pelas ostras já
estava presente na aristocracia romana, como atesta a proibição do consumo de
ostras pelo cônsul M. Aemilius Scaurus em 115 a.C., parece que ele tomou outro
rumo com a intervenção de Orata, de L. Licínio Crasso e Asclepíades, o médico
deste último. André Tchernia, em seu trabalho sobre vinhos romanos, apresenta
Crasso e sua comitiva como tendo moldado os costumes e gostos da aristocracia
romana para fornecer-lhes itens de luxo. Para isso, eles teriam criado uma
hierarquia de bens, de modo que certos produtos seriam considerados dignos da
aristocracia, enquanto outros permaneceriam como propriedade do povo e, ainda
abaixo, dos escravos. Isso fica claro no caso do vinho, com a designação de
Falerno como o rei dos vinhos, o que leva a um aumento de preço, tornando-o
inacessível às camadas mais pobres da sociedade, tornando-se assim um produto
para os ricos. O mesmo vale para as ostras, sendo as do Lago Lucrin
consideradas as melhores (coincidentemente!).
Asclepíades, aproveitando
seu status de médico renomado, recomenda ostras para digestão e o uso de banhos
para higiene; o vinho é recomendado para preparar panaceias (quanto melhor o
vinho, melhor o remédio). Que Asclepíades elogie ostras e banhos, que são o
produto principal do melhor amigo de seu protetor, sem dúvida não é inocente!
Verdade ou não, a ostra se
tornará um produto de luxo e um símbolo da cultura romana, o que permitirá que
seu consumo se espalhe por todo o Império – incluindo na Gália.
Este gosto pelas ostras
espalhou-se pela sociedade, a ponto de Cícero no século I a.C. considerar de
mau gosto não servir ostras aos seus convidados, Plínio o Velho depois dele no
século I menciona onze variedades de ostras, tanto Varro como Columela mencionam
também o consumo de ostras e os parques onde elas eram cultivadas. Pelo menos
dois atos legislativos dizem respeito às ostras: o Édito de Scaurus, já acima
mencionado, e o Édito do Máximo do Imperador Diocleciano, na viragem dos
séculos III e IV, que especifica que o preço de cem ostras é de cem denares, ou
seja, um terço do salário anual de um legionário! Entretanto, não houve
declínio observado no consumo durante o século IV.
Em Vindolanda, um forte
localizado não muito longe da Muralha de Adriano, no norte da Inglaterra, um
grande número de tábuas foi encontrado. Na tábua 299, seu autor, cujo nome nos
é desconhecido, relata ao seu amigo Lúcio que um terceiro lhe enviou cerca de
cinquenta ostras de outro lugar: Cordonouis. A localização desta cidade também
é desconhecida para nós, já que esta é sua única menção no ablativo plural. O
nome da cidade poderia, portanto, ter sido Cordonou(i)a, Cordonouae, Cordonoui.
Acredita-se que esta cidade seja na verdade Colchester, uma grande cidade no
sul da Inglaterra e produtora de ostras planas.
Ausônio, poeta galo-romano
do final do século IV, não hesita em mencionar o seu gosto pelas ostras do
Atlântico (fala do oceano de Medula, portanto do Médoc) numa carta ao seu amigo
Paulo, fazendo mesmo uma referência inventário exaustivo dos locais de produção:
Gasconha, Saintonge, Poitou, Armórica, Caledônia (Escócia), Marselha, Narbonne,
Baiès (ou seja, Lago Lucrin de Orata), Propôntida (Mar de Mármara) e até
Tarraco e Barcino (em outras palavras Tarragona e Barcelona). Em outra carta a
Theon, ele zomba do fato de seu amigo ter lhe enviado apenas 30 ostras de
presente.
A ostra parece ter feito um forte retorno desde o século XVII, particularmente em Paris. Na Idade Média e no Renascimento, as ostras eram comidas “à l’escale” (com a casca). Produtos de consumo diário no litoral, eles representavam uma mercadoria de luxo para os ricos moradores das cidades.
A corte lutou por eles e os monarcas ficaram loucos por eles. Henrique IV, em
particular, amava-os a ponto de ficar doente. Quanto a Luís XIV, o Rei Sol,
diz-se que ele os mandava trazer todos os dias de Cancale, a cavalo, e que
conseguia devorar seis dúzias antes da refeição.
O Rei Luís XV, conhecido como “o Amado”, também gostava particularmente dela. Tanto que em 1735 ele encomendou ao pintor Jean-François de Troy uma pintura representando uma degustação de ostras, “O Almoço de Ostras”, destinada a decorar a sala de jantar dos pequenos apartamentos do Castelo de Versalhes. esse fato em particular merece destaque em particular, o que farei a seguir.
ALMOÇO A BASE DE OSTRAS, de
Jean-François de Troy, FOI A PRIMEIRA IMAGEM A RETRATAR O CHAMPANHE.
Jean-François de Troy um
conhecido pintor francês a serviço do grande soberano da França, Luís XV, era
filho da arte. Pois, seu pai era um famoso pintor de retratos e procurador da
Real Academia de Pintura e Escultura, em 1671. Basicamente, dedicou-se a temas
históricos, isto é, mitológicos, morais, religiosos, mas era ousado quando se
definia como um pintor realista - por adorar retratar cenas da vida cotidiana.
Por volta da década de 1730,
logo no reinado de Luís XV, um estilo ornamental chamado rococó começou a se
estabelecer na França. Esse estilo, distingue-se pela grande elegância e pela
suntuosidade das suas formas, caracterizadas por cachos e arabescos florais,
expressos sobretudo na decoração, mobiliário e moda.
Um dia, o duque de Antin e o
pintor rococó François Lemoyne organizaram o Grande Concurso de Arte, do qual
Jean-François de Troy participou e ganhou o 1º prêmio com a tela "O
repouso de Diana" (agora no Museu de Belas Artes de Nancy), era 1727.
Mais tarde, Jean-François de Troy se tornaria Diretor da Academia Francesa de Roma, onde passou o resto da vida. Mas há uma coisa muito importante que ele fez antes disso: foi contratado pelo próprio rei para criar uma pintura destinada a ocupar uma das salas do palácio de Versalhes.
O quadro em questão é
"Almoço à base de ostras", um óleo sobre tela terminado em 1735,
muito particular e inovador. Aqui estão algumas curiosidades dessa grande farra
retratada que esconde a singularidade de muitos detalhes...
Nessa pintura aparece pela primeira vez uma garrafa de champanhe sendo retratada: trata-se de garrafas de Dom Perignon, que leva o nome do abade que a criou por acaso a partir da fermentação do vinho da abadia de Hautvilliers.
No evento, em um edifício
magnificamente decorado em estilo rococó, um grupo de senhores comem
alegremente um banquete caracterizado por um prato muito requintado: ostras.
As conchas jogadas no chão
refletem o clima alegre e uma atmosfera de euforia etílica. Quatro comensais
estão de cabeça voltada para o teto, para acompanhar a trajetória da rolha do
champanhe que paira no ar.
Mas sobre esse grupo de cavalheiros devotados à bacanal, a estátua de Vênus reina suprema, observando a cena do nicho pintado acima da mesa. Um elemento casual? Certamente não.
As ostras despertaram os
sentidos desses personagens graças ao seu poder afrodisíaco. Durante este
período, as ostras e trufas estavam em voga, banindo quase completamente a caça
das mesas nobres.
Até um conhecido poeta
italiano, Giacomo Casanova, por volta da segunda metade de 1700, começa a
mencioná-las em seus escritos, incentivando os leitores a sugá-las diretamente
das conchas. Ele escreve em suas memórias:
".... por puro acaso,
uma ostra que eu ia colocar na boca de Emilia escorregou da concha e caiu em
seu peito. A menina fez o gesto de pegá-la com os dedos, mas eu o evitei,
reivindicando o direito de desabotoar o corpete para recolhê-la com os lábios
no fundo onde ela havia caído ... Leitor voluptuoso, então tente me dizer se
não é o néctar dos deuses!"
Pois bem, um século dedicado
ao hedonismo e ao prazer este 1700 que, como todos sabemos, terminará na França
com uma conhecida revolução.
"Beijo de Ostra" de Casanova
O sedutor veneziano Giacomo CasanovaNo século XVIII, quando os
nobres começaram a comer ostras acompanhadas de champanhe e as ostras eram
famosas por suas propriedades afrodisíacas, Casanova inventou um jogo erótico
que, segundo ele, enlouquecia suas conquistas, o "beijo da ostra".
Consistia em passar a ostra de língua em língua, como ele conta em “História da
Minha Vida” ao dar sua receita: “Para três pessoas. Pegue cem ostras. Faça duas
partes iguais. Use a primeira metade como aperitivo e guarde o resto para a
sobremesa. Depois de seis ostras cada, engolidas como aperitivos, faça o beijo
da ostra.
Napoleão III, o Imperador
das Ostras
A criação de ostras, tal
como é praticada hoje em França, com a instalação de coletores destinados à
recuperação de larvas de ostras, baseia-se numa técnica desenvolvida no século
XIX sob Napoleão III (1808-1873).
No Segundo Império, as
ostras foram tão bem-sucedidas que, em 1852, após um relatório alarmante do
Ministério da Agricultura e Comércio sobre a queda na produção de bancos
naturais de ostras, a administração marítima regulamentou o "arrastamento",
que só é permitido de 1º de setembro a 30 de abril, do nascer ao pôr do sol.
Além disso, Napoleão III instruiu Victor Coste, um naturalista e médico erudito
da Imperatriz Eugénie, e Ferdinand de Bon, Comissário da Marinha, a comparar os
métodos usados para capturar e criar ostras nas costas da França e da Itália.
Com o objetivo de reconstituir os bancos de ostras planas dizimados pela
sobreexploração, eles desenvolveram experimentos com bancos de ostras
artificiais, principalmente em Arcachon, em 1859.
Doenças epizoóticas, consumo
excessivo: a ostra esteve perto da extinção em diversas ocasiões. Foi
justamente para fazer frente à escassez de ostras que os habitantes de Arcachon
importaram a ostra portuguesa (Crassostrea Angulata) a partir de 1860. Dizimada
na década de 1970, ela foi substituída pela japonesa Crassostrea gigas, que
hoje representa 98% das ostras que consumimos.
Cara, era muito procurada
pelas elites e foi vítima do seu próprio sucesso. No século XIX, os bancos
naturais, superexplorados, esgotaram-se: por conta disso nasceu a moderna
ostreicultura.
Desde a década de 1970, a
reprodução tem sido representada principalmente pela ostra-do-pacífico,
Crassostrea gigas. Originária do Japão, ela foi introduzida no mundo todo para
repor estoques esgotados pela superexploração ou dizimados por doenças, como os
da ostra plana europeia, Ostrea edulis, cuja população declinou a partir da
década de 1920.
Existem diversas técnicas de
criação, que variam dependendo da localização, espécie e tradições. A elevagem
é realizada na faixa litorânea (parte do litoral exposta pela maré), em lagoas
ou em mar aberto. Isso pode ser feito levantando-as: as ostras são colocadas em
bolsas dispostas sobre as mesas. As ostras também podem ser suspensas; Elas são
fixadas em cordas suspensas em uma mesa ou em um sistema flutuante e ficam
permanentemente submersas. A criação de espinhel ocorre em mar aberto, com
gaiolas suspensas por cabos ou jangadas.
O refino envolve colocar as
ostras em bacias de água menos salgada, mas ricas em plâncton, chamadas
claires. É assim que a ostra ganha seu sabor e cor. Na finalização, as ostras
são colocadas em água de qualidade impecável, lavadas e selecionadas. Dependendo
da espécie e das condições de cultivo, leva em média de dois a três anos para
obter uma ostra comercializável.
Comida crua, cozida, assada, preparada em ensopados ou molhos, o molusco tem sido tema de elaboradas preparações culinárias, como ostras com espinafre gratinado ao estilo Rockefeller.
Então, ostras, no Natal ou o ano todo?
A tradição determina que as ostras sejam consumidas apenas durante os meses terminados em “r”, e “re” do calendário francês, ou seja de setembro a abril. Esta regra remonta, na verdade, ao século XVIII, a um decreto real de 1759 de Luís XV que proibia a pesca, a venda ambulante e a venda de ostras entre 1 de abril e 31 de outubro, como relatam Stéphane Hénaut e Jeni Mitchell no livro “Histoire de France à pleines dents” (Flammarion, 2019).
As ostras eram tão populares
nas mesas da aristocracia que, para fazer face a uma futura escassez, o rei
teve a sabedoria de proibir a sua colheita de Maio a Agosto, durante os quatro
meses restantes do ano do período de ostras, quando reproduzir.
Do ponto de vista
nutricional, a ostra é muito interessante. Rica em proteínas, quase não tem
gordura e oferece um bom suprimento de iodo por ser um produto do mar. Também é
interessante por seu zinco (muito bom para o sistema imunológico), ferro,
vitamina B12, cobre…
Quanto a comê-la o ano todo,
mesmo que seja possível hoje em dia, ainda há uma sazonalidade neste molusco
marinho. E a melhor estação para ostras é o inverno, e por isso os famosos
meses francês com “r” no final deles. “Por que os chefs que dizem respeitar as
estações dos produtos colocam ostras em seus cardápios o ano todo? » perguntou
Catherine Flohic em 2015, em “The Oyster in Questions”. Para o autor deste
livro abundante sobre os fabulosos mariscos, como para todos os ostreicultores
tradicionais, é necessário “reaprender a esperar pelas ostras, para saboreá-las
com ainda mais prazer”.
Comê -la fria ou quente?
Dependendo do seu gosto, você pode comer ostras de mil maneiras: frescas e cruas, com limão, em vinagre de chalota, azeite; ou quentes, cozidas no forno, gratinadas com chalotas e vinho branco, com parmesão, champanhe ou creme. com beurre blanc, com foie gras...
Ao longo de todo esse
contexto as ostras se tornaram um item essencial no Natal? Francês – que além
delas, pode ter à mesa, vieiras, lagostins, lagostas... produtos do mar que
ocupam um lugar especial nas mesas de Natal.
Embora essa tradição
culinária seja parcialmente explicada pela sazonalidade, já vimos que razões
históricas e culturais entraram em jogo. Percebemos que, mesmo com a
disponibilidade de ostras ao longo de todo o ano, existem um período no qual
elas podem ficar melhores, mas, é no inverno que seu sabor e textura são mais
agradáveis, o que lhes dá um lugar de destaque nas mesas de Natal francesas –
embora essa não seja a única razão de seu sucesso.
É preciso olhar para
tradições antigas, como a refeição magra antes da missa de Natal ou mesmo
hábitos do Oriente. Na Alsácia, a refeição de Natal tinha que incluir
elementos: água, terra e céu. Por exemplo, o elemento água muitas vezes assumia
a forma de carpas empalhadas. Então, com o tempo, o hábito de comer ostras,
mesmo que fosse caro, se espalhou. Essa padronização dos estilos de vida e,
portanto, da ceia de Natal, aconteceu por volta de 1950, depois da Segunda
Guerra Mundial.
Outra explicação também está
no custo da comida. Elas se tornaram principalmente pratos de Natal pelo preço:
já que, muitas vezes, se compreende que para um produto ser um prato festivo,
ele deve ser caro o suficiente para permanecer excepcional e, ao mesmo tempo,
acessível. Ostras, mas também vieiras e lagostins são exemplos perfeitos dessa
lógica. No entanto, nem todos os alimentos de luxo conseguiram se transformar
em alimentos de Natal, mesmo aqueles na faixa de 'caros, mas acessíveis'. Para
que um produto se torne uma iguaria de Natal, ele deve se enquadrar nessa
categoria e estar disponível em quantidade suficiente para atender ao aumento
da demanda em uma época específica do ano. Tradicionalmente acompanhadas de
champanhe, as ostras fazem parte desse costume.
Depois disso, seguem algumas
receitinhas com ostra, para o caso de você querer inclui-las no seu menu
natalino. E, para os curiosos de plantão que adoram fontes, saibam mais
buscando em:
• Apicius, 413.
• Columelle, de Agricultura L.VIII, 16, 5.
• Varron, de re Rustica L.III, 3, 10.
• Cicéron, de Finibus, L.II, 70.
• Cicéron, Hortensius, 67.
• Cicéron, de Officiis, III, 16.
• Valère Maxime, IX, 1, 1.
• Pline l’Ancien, HN, IX, 52-61
• Ausone, Lettres VII, IX, XXIII
• Roland Jussieau, L’élevage en France 10000 ans d’histoire,
p.144
• André Tchernia, Le cercle de L. Licinius Crassus et la
naissance de la hiérarchie des vins à Rome
• Cynthia Bannon, Gardens and Neighbors: Private Water Rights
in Roman Italy, p.219
• Jean Doignon, L’enseignement de Hortensius de Cicéron sur les
richesses devant la conscience d’Augustin jusqu’aux Confessions
• Capitaine Gaurichon, Contribution à l’étude de l’emploi des
Huîtres dans l’Antiquité
• Françoise Brien-Poitevin, Consommation des coquillages marins
en Provence à l’époque romaine
• Dr Marcel Baudoin, Démonstration de l’existence d’un Monument
cultuel, du type des Tertres animaux en forme de Serpent et d’origine Nordique,
aux Buttes coquillières des Chauds, commune de Saint-Michel-en-1’Herm (Vendée)
• Yves Gruet, Les coquillages marins: objets archéologiques à ne pas négliger. Quelques exemples d’exploitation et d’utilisation dans l’Ouest de la France
Ostras de natal
Ostras com Vinagre de Vinho Tinto Tramier e Chalotas – para servir frias
24 Ostras frescas
1 chalota picada finamente
4 colheres de sopa de
Vinagre de Vinho Tinto Tramier (ele é sem Resíduos de Pesticidas, um luxo
natalino. Mas você pode usar vinho tinto ao invés de vinagre )
1 colher de chá de açúcar
1 colher de sopa de Azeite
(a Tramier também tem bom azeite sem pesticidas), opcional
1 pitada de pimenta do reino
1 folha de louro
Alguns raminhos de tomilho
Preparo:
comece pelas ostras. Abra as ostras cuidadosamente usando uma faca para
ostras, tomando cuidado para não quebrar a casca. Coloque-as em um prato grande
e fundo ou sobre uma camada de gelo para mantê-las bem gelados. Prepare a
marinada: Em uma tigela pequena, misture o vinagre de vinho tinto (ou o vinho
tinto, se preferir), a chalota picada, o açúcar, o louro, o tomilho e uma
pitada de pimenta do reino moída na hora. Misture bem para dissolver o açúcar.
Você também pode adicionar uma colher de sopa de azeite de oliva para suavizar
a acidez do molho. Deixe a marinada em temperatura ambiente por cerca de 10 a
15 minutos, permitindo que os sabores se misturem e as chalotas absorvam o
vinagre. Se você tiver um pouco mais de tempo, também pode prepará-la com
algumas horas de antecedência e deixá-la descansar na geladeira. Na hora de
servir vc tem duas opções retirar a folha de louro e os raminhos de tomilho;
ou, retirar a folha de louro e picar finamente os tomilhos e deixa-lo no molho.
Opção de guarnição para ostras: Pouco antes de servir, coloque uma colher de chá da marinada em cada ostra, certificando-se de que a chalota (e o tomilho) esteja uniformemente distribuída. O restante da marinada pode ir numa molheira para a mesa. Ou, simplesmente, colocar todo molho numa molheira no centro da bandeja que será servida e todas as ostras abertas em volta do recipiente com o molho, para que cada um coloque na sua ostra a quantidade do molho que desejar. Para decorar, você pode usar cebolinha ou salsa picadinha e para dar um toque extra de frescor, você também pode adicionar um pouco de raspas de limão. Coloque as ostras numa bandeja funda com cubos de gelo, ou gelo picado, por baixo, decore a gosto e servir.
Ostras quentes au
champanhe
De 24 a 36 ostras frescas
113g de manteiga
220g de creme de leite
fresco (220ml)
220gm de champanhe (220ml)
6 gemas de ovo
Pimenta do reino a gosto
Ciboulette picadinha para
decorar
Preparo:
Abra as ostras, tire-as das conchas e filtre a água, reserve. Numa
panela, derreta a manteiga. Adicione o creme de leite fresco, metade do
champanhe da receita e a água filtrada das ostras e junte as ostras. Cozinhe as
ostras nessa mistura por cerca de 10 minutos. Escorra e deixe o molho reduzir
pela metade em fogo baixo. Reserve. numa tigela em banho-maria, bata as gemas
com apenas duas colheres de sopa do champanhe que sobrou restante do champanhe
e bata bem até espumar, engrossando. Adicione essa mistura de gemas ao molho de
manteiga. Acerte a pimenta, cebolinha picada e só então junte o restante final
do champanhe. Coloque as ostras de volta nas conchas vazias, cubra com o molho
e deixe dourar no forno quente por 3 minutos. Sirva bem quente.