terça-feira, 5 de novembro de 2013

As crepes do príncipe de Gales Eduardo VII – origem das crêpes Suzette


Tem aqueles dias que você procura algo simples de fazer, mas com cara de sofisticado. Nessas horas a única coisa que me vem à cabeça são as crepes da Suzette.



Eu me lembro que a primeira vez que eu fiz essa receita, não gostei muito porque só a tinha feito com laranjas. Tempos depois vi que a adição de um suquinho de tangerinas faz toda a diferença – sugiro que experimente com e sem tangerina, e me falam, depois.

A história do surgimento dessas crepes metidas à besta é controversa, bastante conhecida desde o século XIX, e tem um quê da realeza...

No longo período em que foi príncipe de Gales, Eduardo VII (1841-1910, ele tinha quase 60 anos quando subiu ao trono) sempre si “divertiu” à vontade. Mesmo depois de ser coroado rei da Grã-Bretanha, Irlanda e imperador da Índia.

Eduardo VII

Da juventude à maturidade, passava temporadas na França, país que admirava, sobretudo em Paris, frequentando restaurantes, teatros, hipódromos e consolidando a sua fama de “playboy” que era desaprovada pela mãe, a severa rainha Vitória I. Bastante popular no seu país e no exterior, ainda se notabilizou pelo mecenato e paixão pelas viagens.

Mecenato é um termo que indica o incentivo e patrocínio de artistas e literatos, e mais amplamente, de atividades artísticas e culturais. O termo deriva do nome de Caio Cílnio Mecenas (68–8 a.C.), um influente conselheiro do imperador Augusto que formou um círculo de intelectuais e poetas, sustentando sua produção artística

Eduardo VII logo tornou-se um dos personagens populares da Belle Époque, o período de glamour e deslumbramento vivido pela Europa entre o final do século XIX e o início da 1ª Guerra Mundial, com epicentro na capital francesa.

Na vida amorosa, conquistou mulheres de todos os tipos: da norte-americana Jennie Jerome, mãe do futuro primeiro-ministro Winston Churchill, à atriz dramática parisiense Sarah Bernhardt, estrela de A Dama das Camélias, de Alexandre Dumas Filho; da britânica Alice Keppel, bisavó de Camilla Parker Bowles, a duquesa da Cornualha, segunda esposa do príncipe Charles, atual príncipe de Gales e herdeiro do trono britânico, à cortesã espanhola La Belle Otéro, que ele encontrava no Maxim’s, um dos restaurantes grã-finos de Paris, concorrido ponto de paquera. Também gostava de ir aos cafés Hardy, Paillard e Voisin.


La Belle Otéro
Alice Keppel

Eduardo VII dedicou-se tanto à boa mesa que sua barriga dilatou e, ao procurar torná-la menos desconfortável depois das comilanças, ditou moda: eis o motivo para todo homem que conhece os preceitos do bem vestir usar sempre desabotoado o último dos três botões do paletó. Eduardo VII começou a fazer isso após os banquetes, desapertando a pança. Gordos e magros até hoje o imitam – muitos, inclusive sem saber o motivo primordial do costume.

Alguns pratos da cozinha da Belle Époque aludem ao príncipe, o futuro rei e comilão. A enciclopédia Larousse Gastronomique (Larousse-Bordas, Paris, 1996) dedica-lhe um verbete. Fala no turbot (rodovalho) à príncipe de Gales, na barbue (peixe da família do linguado), no frango e nos ovos à Eduardo VII.

O simpático soberano ainda tem participação nomeando uma das receitas mais icônicas que lhe ofereceram: as crêpes suzette. A panqueca amanteigada, doce, perfumada com suco de laranja ou tangerina, licores Cointreau e Grand Marnier, às vezes Curaçao, e flambada com conhaque diante do cliente do restaurante, que teria surgido por acaso.



O chef francês Henri Charpentier (1880-1961), que mudou para os Estados Unidos, no posto de cozinheiro do magnata do petróleo John Rockefeller, assegurou na autobiografia Life à la Henri (Simon & Schuster, Inc., Nova York, 1934) ser o inventor da crepe suzette.

Em janeiro de 1896, Henri Charpentier, então com 15 anos, estarva preparando a sobremesa em um réchaud, no Le Café de Paris, em Monte Carlo, atendendo ao pedido do então príncipe de Gales. Foi quando o molho incendiou acidentalmente por ter caído bebida alcoólica acidentalmente. O jovem pensou ter destruído a preparação, e o Príncipe e seus amigos estavam esperando. Deve ter pensado em começar tudo de novo, mas antes resolveu provar.

                               Le Café de Paris, Monte Carlo, 1899.

Foi surpreendido pela mais deliciosa mistura de sabores doces e açidos em harmonia. Resolveu dobrar as panquecas duas vezes, dando-lhe o formato de leque, e foi servir para o ilustre comensal. O príncipe comeu as panquecas com um garfo, mas ele usou uma colher para pegar o xarope restante. E perguntou o nome do que ele havia comido com tanto gosto.

Charpentier respondeu que a preparação deveria se chamar Crêpes Princesse. O príncipe percebeu que se tratava de um elogio, mas protestou com ferocidade fingida que havia uma senhora presente. Então, o futuro rei, apontando galantemente para sua acompanhante da noite que estava alerta e pôs-se de pé segurando sua saia larga com as mãos e fez-lhe uma reverência. - Você mudaria Crêpes Princesse para Crêpes Suzette? Foi a indagação do príncipe.

Assim nasceu e foi batizou esta delicada preparação na qual Charpentier acreditava que transformaria um canibal em um cavalheiro civilizado. No dia seguinte Charpentier recebeu um presente do Príncipe, um anel com brilhantes, um chapéu-panamá e uma bengala - os quais o príncipe sempre usava.

Uma lenda conta  ainda outra versão para a origem na qual a responsável seria a atriz francesa Suzanne Reichenberg (1853 a 1924), que trabalhou profissionalmente com o nome de Suzette. Em 1897, na Comédie Française, ela interpretou uma empregada doméstica preparando crepes. Decidiu-se flambar o prato para mantê-lo aquecido para os atores que estavam prestes a comê-lo.


                                                  Suzanne Reichenberg

Charpentier
Chapéu e bengala eram moda entre os homens naquela época

A Larousse Gastronômica já duvidou da versão porque, na época, Charpentier contava apenas 15 ou 16 anos e não tinha idade, nem experiência, para servir um cliente tão ilustre. Entretanto, as últimas edições da enciclopédia deixaram de registrar a dúvida.

Auguste Escoffier, o chef que sistematizou a cozinha francesa, na obra-prima Le Guide Culinaire, de 1903, menciona a receita, porém não faz menção à autoria.

O escritor e jornalista parisiense León Daudet, no livro Paris Vécu, de 1929, onde evoca a vida na capital francesa através dos restaurantes e cozinheiros, afirma que as crêpes suzette eram especialidade do Restaurant Marie, de Paris, no final do século XIX. As principais diferenças seriam levar presunto e curtir ligeiramente no brandy.


Eduardo VII e Alexandra da Dinamarca

O fato é que Eduardo VII adorava crêpes, até porque apreciava as sobremesas. Galanteou algumas mulheres oferecendo, além de sedução, doces. Dividiu a predileção com algumas delas, inclusive com Alice Keppel, a bisavó de Camilla Parker Bowels, sua mais duradoura relação amorosa e uma das poucas pessoas da intimidade capaz de controlar suas alterações de humor.

A rainha consorte Alexandra da Dinamarca sabia dos casos extraconjugais do marido e, para manter a estrutura ou paz familiar, resignou-se a tolerá-los. No leito de morte, ele solicitou a presença da amante, por meio de um bilhete. Alexandra da Dinamarca deixou que o encontro acontecesse. Mas o fato é que, além de ser um namorador incontrolável, Eduardo VII foi um grande bom de garfo.

Crepes Suzette

 2/3 xícara de farinha de trigo

1/4 colher de chá de sal

2 colheres de sopa de açúcar

2 ovos, ligeiramente batidos

1 xícara de leite

4 colheres de sopa de água

2 colheres de sopa de água de flor de laranjeira ou licor de laranja (opcional)

2 colheres de sopa de manteiga sem sal, derretida e uma porção extra para fritar

Para a calda

6 colheres de sopa de manteiga sem sal

4 colheres de sopa de açúcar

suco e casca ralada de 1 laranja ou tangerina grande

suco e casca ralada de 1 limão grande

2/3 xícara de suco de laranja

4 colheres de sopa de licor de laranja, e uma porção extra para flambar (opcional)

brandy para flambar (opcional)

pedaços de laranja para decorar

Preparo: Peneire a farinha, o sal e o açúcar em uma tigela. Faça um vão no centro e ponha os ovos batidos. Bata os ovos com um fuet incorporando a farinha aos poucos. Acrescente o leite e a água para fazer uma mistura mais homogênea. Adicione a água de flor de laranjeira, ou licor de laranja, depois peneire a mistura em um jarro de caldas e condimentos e deixe à parte por 20-30 minutos. Se a mistura engrossar, adicione um pouco de leite ou água para ficar fina (pode ser feito no liquidificador, misture tudo e bata. Depois reserve a mistura pelo mesmo tempo). Esquente uma panela de crepe (ou aquela sua frigideira amiga) em fogo médio. Adicione a manteiga derretida na mistura de crepe. Passe um pouco de manteiga derretida na panela quente e despeje cerca de 2-3 cols. de sopa da mistura. Incline e gire a panela para cobrir o fundo com uma camada fina da mistura. Cozinhe por cerca de 1 minuto até a parte de cima dourar. Com uma espátula, levante a borda para ver a cor, depois vire o crepe e cozinhe por mais 20-30 segundos, para assentar. Coloque em um prato. Continue cozinhando os crepes, mexendo a mistura algumas vezes e passando manteiga na panela quando for necessário. Para a calda: Derreta a manteiga para fazer a calda e em seguida adicione o açúcar, a casca e o suco de laranja e de limão, o suco de laranja adicional e o licor de laranja. Coloque uma crepe na panela com o lado tostado para baixo, e mexa levemente para cobrir com a calda. Dobre ao meio duas vezes para formar um triângulo e coloque para o lado da panela. Continue esquentando e dobrando os crepes até que todos estejam quentes e cobertos com a calda. Para flambar os crepes, esquente 2-3 colheres de sopa de licor de laranja e brandy em uma caçarola pequena em fogo médio. Retire do fogo e inflame o líquido com cuidado com um fósforo e em seguida despeje sobre os crepes. Espalhe as fatias de laranja por cima e sirva na hora.


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