A última postagem trazia uma deliciosa receita com chocolate batizada com um nome diabólico. E para dar continuidade ao simbolismo sempre presente no mundo – e na gastronomia -, hoje iremos tratar sobre os tártaros.
A primeira vez que eu li esta palavra (ainda no século passado [risos]), eu me lembro, que me debrucei sobre os livros empoeirados, velhos e pesados da biblioteca pública para tentar descobrir mais sobre o que significava o tal Tártaro mitológico.
Depois daquele episódio descobrir que existiam mais tártaros na vida... E que alguns deles poderiam ser deliciosos - outros, nem tanto. Vejamos:
Depois daquele episódio descobrir que existiam mais tártaros na vida... E que alguns deles poderiam ser deliciosos - outros, nem tanto. Vejamos:
O Tártaro Mitológico
É personificado por um dos deuses primordiais, nascidos a partir do Caos (apesar de alguns autores o considerarem irmão de Caos). Também é conhecido por ser a pior das regiões infernais. Suas relações com Gaia geraram as mais terríveis bestas da mitologia grega, entre elas o poderoso Tifão.
Mapa do Tártaro em Hades |
Tifão ou Tifeu (em grego antigo Τυφωευς, Τυφων, Τυφαων, Τυφως, transl. Typhôeus, Typhôn, Typhaôn, Typhôs), é um deus da mitologia a quem imputavam os gregos a paternidade dos ventos ferozes e violentos e a seca. Era filho de Gaia e de Tártaro.
Tifão |
No sincretismo com o mito egípcio de Osíris, Tifão era identificado com o gigante Seb, responsável pela seca do Nilo e deus da morte, e que por inveja da fecundidade daquele o matara, sendo vingado por seu filho Anúbis (identificado com Apolo).Junto à esposa Equidna foi pai de vários dos monstros que povoam as aventuras de heróis e deuses, como o Leão de Neméia, combatido por Hércules, a Hidra de Lerna ou a Esfinge, na fusão com os mitos nilóticos, dos cães Ortros e Cérbero. Hesíodo descreve-o assim: "As vigorosas mãos desse gigante trabalhavam sem descanso, e os seus pés eram infatigáveis; sobre os ombros, erguiam-se as cem cabeças de um medonho dragão, e de cada uma se projetava uma língua negra; dos olhos das monstruosas cabeças jorrava uma chama brilhante; espantosas de ver, proferiam mil sons inexplicáveis e, por vezes, tão agudos que os próprios deuses não conseguiam ouvi-los; ora o poderoso mugido de um touro selvagem, ora o rugido de um leão feroz ; muitas vezes — ó prodígio! — o ladrar de um cão, ou os clamores penetrantes de que ressoavam as altas montanhas. Gaia, a Terra, para vingar a derrota de seus filhos pelos crônidas na Titanomaquia, uniu-se a Tártaro e gerando Tifão, identificado como a personificação do terremoto. Morava numa gruta, cuja atmosfera envenenava com vapores tóxicos. Era tão grande que sua cabeça tocava os astros celestes e suas mãos iam do Oriente ao Ocidente. Suas asas abertas podia tapar o Sol, dos seus ombros saiam Dragões, 50 de cada ombro no total 100. Ele era tão horrendo que todos o rejeitavam, até seus irmãos, os titãs. De sua boca cuspia fogo em torrentes, e lançava rochas incandescentes aos céus
Tifão, o “Filho” da Amargura de Hera
Na visão dos gregos antigos, a sociedade é patriarcal. O homem pode conceber grandes obras sem a mulher, inclusive a concepção. Mas a mulher só produziria seres deformados e obras espúrias sem a participação do homem.
Tifão é o deus da seca, mas não se pode nem um pouco compará-lo com um deus, ele é uma criatura extremamente cruel e poderosa, tão poderosa que todos os deuses fugiram ao vê-lo. Tifon é filho de Gaia e Tártaro, mas ele não nasceu de Gaia, Gaia ao perceber que estava grávida aproveitou e transformou seu ainda não nascido filho em uma semente e deu a Hera. Entenda como isso ocorreu.
Hera |
Quando Atena nasceu, todo o Olimpo falava da sua beleza e da sua sabedoria. Todas as reverências foram dadas a Zeus por ter concebido tão formosa e guerreira filha. Ao ver Atena, Hera, a ciumenta mulher de Zeus, a rainha do Olimpo, encheu-se de cólera e amargura. Não suportava a idéia do marido ter concebido tão bela filha sem a sua participação. Enfurecida, Hera não quis receber Atena diante de si. Desde o nascimento da filha, que Zeus tornara-se um pai zeloso, cheio de empáfia por sua obra. Hera sentiu-se diminuída diante dos deuses. O único filho que dera a Zeus tinha sido o feio e coxo Hefestos, deus dos vulcões. Ao dar à luz a filho tão feio e com deficiência na perna, ficou tão furiosa que o atirara ao mar. Depois daquele fruto indesejado, Zeus aparecia diante dela sendo pai de uma deusa belíssima, concebida somente por ele.
Hera não suportava tanta humilhação. Desejou conceber um filho sem a participação do marido. Queria ela ser mãe de um belo deus. Tanto rogou a Gaia, a mãe Terra, e às forças da terra, que conseguiu o seu propósito. Após inúmeras súplicas, Hera viu o seu ventre crescer. Também ela iria sozinha, gerar um filho, sem a presença do marido. Para punir e humilhar ainda mais o senhor do Olimpo, Hera não permitiu que o marido a procurasse durante a gravidez. Preferiu retirar-se para os templos onde era adorada e onde os humanos rendiam-lhe homenagens e sacrifícios.
Finalmente chegou o dia tão esperado. Hera começou a sentir as dores do parto. Estava ansiosa para ver o fruto da sua concepção solitária. Quando nasceu o filho da sua solidão e amargura, Hera decepcionou-se, ele não trazia a forma de um deus e nem a de um mortal. Era um terrível monstro em forma de serpente que cuspia fogo. Deu-lhe o nome de Tifão. Impossibilitada de livrar-se do filho, Hera voltou ao Olimpo a trazer nos braços tão vergonhosa produção. Tifão criou problemas com todos os deuses do Olimpo, fazendo intrigas entre eles. Importunados por tão incômoda presença, as divindades enviaram Tifão para Delfos, para ao lado da serpente Pitão, tomar conta do oráculo. Mais tarde Apolo matou Pitão e atirou Tifão no fundo do mar, onde ficou prisioneiro para sempre. Todas às vezes que o filho de Hera esbraveja mal humorado nas profundezas do mar, entra em erupção os vulcões Etna e Vesúvio, assombrando toda a Itália.
Luta contra o Olimpo
A fim de dar cabo à vingança materna, Tifão começou a escalar o Monte Olimpo provocando a fuga dos seus moradores todos; os deuses se metamorfosearam em animais e fugiram para o Egito (razão pela qual, segundo os gregos, esse povo dava aos seus deuses configurações zoomórficas). Apolo tornou-se um falcão] (Hórus), Hermes um íbis (Thoth), Ares um peixe (Onúris), Ártemis uma gata (Neith ou Bastet), Dioniso um bode (Osíris ou Arsafes), Héracles um cervo, Hefesto um boi (Ptah) e Leto um musaranho (Wadjet). Apenas Atena teve coragem de permanecer na forma humana. Do Egito Zeus veio a se refugiar no Monte Cássio, na Síria, local em que enfrentou o gigantesco inimigo. Dali atingia Tifão com seus raios mas este consegue derrubá-lo e, com uma harpe, cortou-lhe os músculos dos membros e deles fazendo um pacote que guardou numa pele de urso. Os raios e os membros amputados foram confiados a Delfim - um dragão - no antro córciro, na Cilícia. No ataque Tifão invocara todos os dragões que, tantos eram, escureceram o dia. Tendo perdido seus raios Zeus propusera a Cadmo que, disfarçando-se em pastor, fizesse uma choupana e, com o som de sua flauta, atraísse o monstro. Nonos assim registra o episódio: "Canta, disse-lhe ele, Cadmo; tornarás a dar aos céus a primitiva serenidade. Tifão arrebatou-me o raio; só me resta a égide; mas de que pode valer-me contra as poderosas chamas dos raios? Sê pastor por um dia e sirva a tua flauta para devolver o império ao eterno pastor do mundo. Os teus serviços não ficarão sem prêmio; serás o reparador da harmonia do universo e a bela Harmonia, filha de Marte e de Vênus, será tua esposa."Atraído pela música, Tifão se aproxima; Cadmo (noutros mitos teria sido Hermes) finge estar assustado com os raios e o monstro, para acalmá-lo, deixa os relâmpagos numa caverna onde Zeus, fazendo baixar uma nuvem para não ser percebido, recupera suas armas e músculos. De posse novamente de seus poderes, Zeus força Tifão a fugir para o monte Nisa onde as Parcas dão-lhe de comer, pois estava esfomeado, frutos que lhe diminuem a força. Ainda em fuga chega à Trácia onde pelo tanto do sangue derramado deu nome ao monte Hemos. Ainda perseguido, vai Tifão para a Sicília e depois Itália onde Zeus, concentrando todas as forças, fulmina todas as cabeças do monstro que cai sobre a terra com estrondo, morto.
Zeus atirando seus raios em Tifon |
Vários monstros tiveram atribuída a paternidade a Tifão e sua esposa Equidna, a única que podia suportar a sua terrível aparência, já que outras Titanides e deusas primordiais o rejeitavam. São seus filhos: Ortros, cão de guarda do rebanho de Gerião, morto por Hércules; Leão da Neméia, também morto por Hércules, foi transformado em constelação; Hidra de Lerna, em cujo sangue Hércules embebeu suas setas para que seus ferimentos fossem incuráveis, após derrotá-la com ajuda de Iolau; Cérbero, guardião da entrada ao Hades; Quimera e o Dragão da Cólquida.
Equidna |
Assim como Gaia era a personificação da Terra e Urano a personificação do Céu, Tártaro era a personificação do Mundo Inferior. Nele estavam as cavernas e grutas mais profundas e os cantos mais terríveis do reino de Hades, o mundo dos mortos, para onde todos os inimigos do Olimpo eram enviados e onde eram castigados por seus crimes. Lá os Titãs foram aprisionados por Zeus (Júpiter), Hades (Plutão) e Poseidon (Netuno) após a Titanomaquia.
Na Ilíada, de Homero, representa-se este mitológico Tártaro como prisão subterrânea 'tão abaixo do Hades quanto a terra é do céu'. Segundo a mitologia, nele eram aprisionados somente os deuses inferiores, Cronos e outros titãs, enquanto que os seres humanos, eram lançados no submundo, chamado de Hades. O poeta grego Hesíodo garantiu que uma bigorna de bronze cairia do céu durante nove dias até alcançar a terra, e que cairia outros nove dias até atingir o Tártaro. Sendo um lugar tão profundo no chão, estava coberto por três camadas de noites, que se seguiam a um muro feito de bronze a cercar este distante subterrâneo.
Era um poço úmido, frio e desgraçadamente imerso na mais tenebrosa escuridão.
O mundo primordial, segundo a mitologia grega |
Enquanto, segundo a mitologia grega, o Submundo (Érebo, reino de Hades) era o lugar para onde iam os mortos, o Tártaro tinha vários moradores. Quando Cronos era o deus que governava o mundo, prendeu os Ciclopes no Tártaro. Zeus os libertou, para que o ajudassem na sua luta contra os titãs - que acabaram sendo derrotados pelos deuses do Olimpo, e aprisionados neste desolador tugúrio. Ficaram vigiados por 3 enormes gigantes chamados Hecatônquiros.
Os hecatônquiros (em grego Έκατόνχειρες Hekatonkheires, "os de cem mãos"), também conhecidos por Centimanos (do latim Centimani), eram três gigantes da mitologia grega, irmãos dos 12 Titãs e dos 3 Ciclopes, filhos de Urano e Gaia: Briareu ("forte"), Coto ("filho de Cotito") e Giges ("o membrudo"). Possuíam cem mãos (em algumas histórias, possuíam também, 50 cabeças).
Segundo Hesíodo, as gerações de Urano e Gaia foram, em ordem, os titãs, os cíclopes e os hecatônquiros, que foram odiados por seu pai, e os escondeu na Terra assim que cada um deles nasceu. Segundo Pseudo-Apolodoro, os hecatônquiros foram os primeiros filhos de Urano e Gaia, e, logo após os hecatônquiros, nasceram os ciclopes, que foram aprisionados no Tártaro por Urano.
Gaia sofreu com o aprisionamento dos hecatônquiros, e pediu a seus filhos que punissem Urano;apenas Cronos teve coragem de responder à sua mãe.Gaia entregou uma foice a Cronos, e faz o plano;quando Urano estava se deitando com Gaia, Cronos atacou, e castrou Urano.
Poderosos, ajudaram Zeus a derrotar os Titãs no episódio que ficou conhecido como Titanomaquia. Coto, Briareu e Giges lançaram trezentas pedras, e suplantaram o ataque dos Titãs, enterrando-os em baixo da terra, e amarrando-os com correntes. Após a vitória de Zeus, os titãs foram encerrados no Tártaro.
Depois de derrotar os Titãs, os hecatônquiros se estabeleceram em palácios no rio Oceanus, ficaram como guardiões das portas do Tártaro, onde Zeus havia aprisionado os Titãs. Mais tarde, quando Zeus derrotou o monstro Tifão, filho de Tártaro com Gaia, também o lançou neste mesmo poço de água.
Depois de derrotar os Titãs, os hecatônquiros se estabeleceram em palácios no rio Oceanus, ficaram como guardiões das portas do Tártaro, onde Zeus havia aprisionado os Titãs. Mais tarde, quando Zeus derrotou o monstro Tifão, filho de Tártaro com Gaia, também o lançou neste mesmo poço de água.
Depois deste aprofundamento sobre o tártaro mitológico, no decorrer dos anos fui me deparado com os outros tártaros:
· O Tártaro Dental – Entre a gengiva e o dente existe um espaço, sulco gengival, (vamos compará-lo à cutícula de unha), que em condições normais atinge até 3mm de profundidade. Após as refeições, os restos alimentares (placa bacteriana), penetram nesses espaços e após 72 hrs, endurecem , formando o tártaro, este é duro e áspero, irritando e inflamando a gengiva, provocando sangramento ao leve toque da escova.
· O Cremor Tártaro - Bitartarato de potássio, também chamado hidrogeno tartarato de potássio tem fórmula KC4H5O6. É um subproduto da fabricação de vinho. Também é conhecido como creme de tártaro. É o sal ácido de potássio do ácido tartárico. Cremor Tártaro é o nome chique para Bitartarato de potássio branco, altamente purificado, vendido nas lojas de alimentos. E, finalmente,
· O Molho Tártaro – molho á base de maionese e picles usado para acompanhar saladas e peixes. (foto e receita no fim do post)
A palavra tártaro ou tartare se referia ao nome persa da horda dos mongóis de Genghis Khan que assolou a Ásia e a Europa Oriental durante a Idade Média. Os tártaros eram vistos pelos europeus como sendo censuráveis (ou para ser gentil, politicamente incorretos), uma vez que usavam peles inteiras de animais e muitas vezes comiam suas refeições cruas. Aliás, os tártaros levaram a culpa por quase tudo que for cru, acre ou grosseiro.
Provavelmente por este mesmo motivo que uma de nossas delícias semibárbaras recebeu o nome de steak tartare: carne crua moída ou picada, misturada com cebola crua picada, gema de ovo crua, sal e pimenta com toque de tabasco, molho inglês, mostarda de Dijon, anchovas e alcaparras.
Fonte
Alexander S. Murray. Quién es Quién en la Mitología. [S.l.]: ME Editores, Madri, 1997.
René Menard. Mitologia greco-romana, volume I, II e III. [S.l.]: Opus ed. São Paulo, 2ª ed, 1991.
STEAK TARTARE
Ingredientes:
1,5 k de filé mignon limpo
6 gemas de ovo
2 cebolas pequenas, muito bem picadas
2 colheres (sopa) de alcaparras bem picadas
Folhas de manjericão picadas finamente
3 colheres (sopa) de molho inglês
2 colheres (sopa) de ketchup
2 colheres (sopa) de mostarda de Dijon
Salsinha picada para decorar
Sal e pimenta-do-reino moída na hora, a gosto
Preparo: Retire os nervos e pique a carne finamente com a faca. Você pode também comprá-la já moída (somente uma passagem no moedor); Junte todos os ingredientes picados e misture bem; Acrescente as gemas e misture até formar uma pasta; Adicione o molho inglês e vá colocando ketchup, mostarda, pimenta e sal aos poucos, testando sempre até chegar ao ponto desejado do tempero; Decore com salsinha e um fio de azeite; Deixe resfriar na geladeira antes de servir.
MOLHO TÁRTARO
Ingredientes:
1 colher (chá) de cebola ralada
2 colheres(chá) de picles picados (cenoura e pepino)
1 colher (sopa) de azeitonas verdes picadas
1/2 colher (sopa) de alcaparras picadas
1 colher(sopa) salsa e cebolinha picadas
3/4 de xícara (chá) de maionese
1 colher (chá) de limão ou vinagre(opcional)
1 colher(chá) de mostarda
Preparo: Misture todos os ingredientes à maionese e mexa bem, ou passe pelo multiprocessador. Pronto
Obs.: Esta receita é própria para peixes assados e todos os tipos de frutos do mar, principalmente camarões e lagostas. Também com aquelas deliciosas cebolas empanadas ou pão preto. As medidas podem modificar conforme seu gosto ou paladar.
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