sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Bolo Mané Pelado: um ‘nude’ na cozinha

Você já recebeu alguma mensagem assim: “Manda nude”? Então, esses dias recebi essa mensagem de forma divertida, veja:


Obviamente não a respondi, mas fiquei com ela na cabeça, tentando tirar proveito da situação e fazer algo divertidamente gastronômico com ela. Por sorte, a gastronomia é tão cheia de boas histórias que acabei fazendo um link com a ideia da mensagem – que rendeu no post de hoje.
O nude é ima expressão bastante utilizada no mundo da moda para identificar uma determinada cor que deixa quem a usa com a aparência de que está pelado(a). Nuzinho, peladinho da Silva, como veio ao mundo, ou a famosa cor de pele podem ser sinônimos de nude.  A ideia é parecer que se está SEM NADA. Para se ter um nude perfeito é preciso que se encontre tecidos com o exato tom de pelo, ou seja, são muitas as possibilidades de cores, mas quando alguém de pede pra mandar nude, a pessoa está querendo ver “o nude real”...
Ultimamente esta moda nude tem afetado a gastronomia, principalmente com a febre dos bolos pelados, ou como são conhecidos pelo termo em inglês, naked cakes. Confesso que eu teho uma certa aversão aos naked cakes, porque vejo eles sendo muito usados em casamentos e aniversários, e nestas ocasiões eu sou mais clássico, gosto de um bolo realmente decorado (vestido?). 

Naked Cakes
Há quem diga que a moda do nake cake é puro estilo, mas eu não acho – embora minha loucura por bolo me permita dizer que se o naked cake estiver gostoso, eu o comerei do mesmo jeito. Mas não vejo graça alguma em bolos pelados, coberto de flores ou frutas. Mas isso é o meu pensamento, e respeito quem gosta.
No entanto, tem um bolo pelado que eu realmente gosto: o Mané Pelado. Conhecem? É um bolo de mandioca (aipim, macaxeira) com coco e queijo, que tem esse nome por conta de um personagem que se tem muitas historias peculiares sobre sua origem.



A primeira delas reflete no exibicionismo de um certo homem, identificado como Mané (uma corrupção diminutiva de Manoel? Não se sabe): o primeiro causo conta que, por ppuro exibicionismo, ou até mesmo loucura, o tal do Mané colhia mandioca pelado. Há quem justifique o fato explicando que isso ocorria por conta do calor, ou para que ele não sujasse a roupa de terra.
Outra versão conta que o tal do Mané andava de olho em uma vizinha que morava sozinha. Ele fazia muitas propostas indecorosas para a moça (será que ele já pedia nudes?). Então, no dia do aniversário do Mané, a moça pretendendo se vingar, convidou toda a família do Mané e, dizendo ser uma festa surpresa, escondeu o povo todo em seu quarto. Quando o capiau chegou, ela avisou que iria até o quarto se arrumar e assim que estivesse pronta o chamaria. Depois de um tempo lá foi o Mané, PELADO, para quarto em que sua família o aguardava com um bolo de aipim para cantar os parabéns. Imaginem o constrangimento... risos? Ou teria a festa continuado? Não se sabe. Mas o bolo ganhou o nome de Mané Pelado.


O Mané Pelado é feito com mandioca ralada, tem aparência desleixada (rústica, como preferem alguns) e por tamanha simplicidade, as texturas dos ingredientes se fundem misturando sabores, combinações perfeitas que explodem na boca. Geralmente é servido cortado, retirado do próprio tabuleiro (bastante popular nas quermesses, nas Barracas das Fatias, que vendem bolos e doces aos pedaços, direto dos tabuleiros)
Há quem utilize o leite de coco na receita, outros, preferem o leite de vaca mesmo. As possibilidades de se ter um Mané Pelado na época de festas juninas são muito grandes, mas é um bolo tão gostoso e fácil de fazer que em qualquer época do ano, graças aos nossos agricultores, se poder ter mandiocas frescas para fazer este “nude da cozinha”.
As alterações encontradas neste bolo pelo Brasil variam apenas nos tipos de queijos e no uso do leite de coco, em substituição do leite de vaca. Assim, nas Minas gerais, o bolo leva o delicioso queijo Canastra; em Goiás, onde o bolo também tem sua tradição dos tempos de colônia, o queijo meia cura é o rei da preparação, no Nordeste o queijo coalho irá predominar. Mas a globalização e a logística de ingrediente me permite dizer que este bolo fica mais saboroso com o queijo Canastra mineiro.
Um segredinho para um Mané pelado bonito, é espremer a mandioca depois de ralada no ralo grosso, para retirar um pouco do soco dela – isso eixa o bolo mais firme. Então, que tal preparar o “nude da cozinha” – e me mandam nudes (risos).

Bolo Mané pelado

1Kg mandioca crua ralada
200g queijo Canastra ralado
 4 ovos
2 xícaras (chá) de açúcar refinado
1 xícara (chá) de coco em flocos
2 colheres (sopa) de manteiga amolecida
2 ¾ xícara (chá) de leite
¾ colher (chá) / 3g sal
Erva doce, a gosto (opcional)
Manteiga e farinha de trigo para untar a fôrma, quanto baste


Preparo: Pré-aqueça o forno a 180 °C. Unte um tabuleiro de 20x30cm com manteiga (use um pincel para fazer uma camada bem fina de manteiga) e polvilhe farinha de trigo. Retire o excesso virando a forma de cabeça para baixo e dando batidinhas. Descasque a mandioca e rale, no ralo grosso. Esprema com as mãos para retirar o excesso de amido e reserve. Rale o queijo, também no ralo grosso, e junte à mandioca ralada. Em uma tigela junte com um fouet o açúcar com os ovos, a manteiga e misture até obter uma massa homogênea. Se preferir, bata no liquidificador. Junte o leite, mandioca, queijo, erva doce, coco ralado e misture com o auxílio de uma espátula. Coloque a massa no tabuleiro e leve ao forno por aproximadamente 1 hora. O bolo estará pronto quando ficar dourado no topo. Retire o bolo do forno e sirva morno ou frio, direto do tabuleiro.

sábado, 12 de setembro de 2015

Jasmim na cozinha – pequena introdução às PANCs (plantas alimentícias não convencionais)

De repente senti o cheiro de jasmim no ar, o que me fez lembrar de um livro que resenhei tempos atrás: Noites de verão com cheiros de Jasmim, de Joëlle Rouchou, que traz a história de judeus expulsos do Egito no século XX, a partir da memória do grupo que veio se instalar no Brasil entre 1956 e 1957, por meio de entrevistas gravadas com grande rigor metodológico e muita sensibilidade, de acordo com um quadro de parâmetros teóricos precisos, embasados em bibliografia especializada, a autora traz sua contribuição ao debate em torno da relação entre memória, história e identidade cultural [Apesar do mundo estar vivendo um problema parecido na atualidade, com a quantidade de sírios procurando refúgio em muitos países, inclusive aqui no Brasil (até onde seu, existem 11 pedido de refugiados Sírios para vir aqui para Fortaleza-CE)]. Então resolvi falar de jasmim para, inclusive, homenagear uma amiga minha, Thereza Cartaxo, que tem jasmins na varanda de casa, onde muito já nos divertimos e refletimos sobre a vida. E mais do que homenagear minha amiga, quero aproveitar para falar das PANCs – plantas alimentícias não convencionais, e o jasmim é uma delas. Antes porém, devo dedicar este poste para a Thereza Cartaxo: amiga, este post é para você, pela amizade, pela hospitalidade, por tudo.



Comecemos então.  As plantas alimentícias não convencionais (PANCs), pode-se dizer, que são plantinhas nutritivas, matinhos que nascem em qualquer lugar e que muita gente arranca (achando que são ervas daninhas) e que são apenas para enfeites (sobretudos os que apresentam flores – como o jasmim). São tão comuns e vistas com banalidade que as pessoas não se dão conta de sua função alimentar. Um bom exemplo para isso é a bananeira (Musa xparadisiaca), que acaba sendo restrita ao consumo de frutos renegando-se as demais partes da planta, como os mangarás (corações ou umbigo). Portanto, plantas com funções alimentícias não conhecidas pela maioria das pessoas, com partes consideradas pelo senso comum como não usuais, pode-se classificar como PANC.
Por ser um tema de investigações recentes encontra-se literatura ainda restrita. Mas a gastronomia, para nossa sorte, é uma arte cheia de inovação e tem despertados grandes chefs da alta cozinha para novas criações culinárias envolvendo PANCs (Alex Atála serve como um exemplo). Mas se você se interessou pelo assunto, encontrei um livro bacaninha sobre o assunto, Plantas Alimentícias Não Convencionais (PANC) no Brasil, de Valdely Kinupp e Harri Lorenzi, muitas informações valiosas para quem deseja se aventurar nesse mundo de descoberta de novos sabores.



Fui atrás de dados para apresentar o impacto das PANCs pelo mundo e descobri uma triste estimativa: calcula-se que se perde, por ano, de 1 a 7 toneladas de plantas alimentícias não convencionais, muitas são hortaliças com elevadas propriedades nutricionais para a espécie humana como dente-de-leão, serralha, beldroega, erva-gorda, almeirão-do-campo, caruru, bertalha, serralha, capuchinha dentre outras, que são jogadas fora. Estima-se que existam ainda cerca de 50 mil plantas alimentícias no mundo, sendo pelo menos 10 mil no Brasil, mas a falta de informação e conhecimento sobre elas implica na redução de seu uso como oferta alternativa de alimentos para a população.



Então eu resolvi (ou me atrevi?) falar do jasmim na cozinha (alguém deve estar se perguntando se vou fazer perfume r colocar perfume na comida. Bom é quase isso). Antes porém tenho de explicar que, conceitualmente, plantas alimentícias são aquelas que possuem uma ou mais partes ou produtos que podem ser utilizados na alimentação humana, tais como: raízes, tubérculos, bulbos, rizomas, cormos, talos, folhas, brotos, flores, frutos e sementes ou ainda látex, resina e goma, ou que são usadas para obtenção de óleos e gorduras comestíveis. Inclui-se neste conceito também as especiarias, espécies condimentares e aromáticas, assim como plantas que são utilizadas como substitutas do sal, edulcorantes (adoçantes), amaciantes de carnes, corantes alimentares e no fabrico de bebidas, tonificantes e infusões.



Jasmim é o nome comum pelo qual são conhecidas as espécies do gênero Jasminum L., da família Oleaceae, nativas do Velho Mundo. O nome vem do árabe Yasamin, que por sua vez foi emprestado do persa. São em sua maior parte arbustos ou lianas, de folhas simples ou compostas, com flores tubulares, com pétalas patentes, raramente maiores do que dois centímetros de diâmetro, quase sempre muito perfumadas. Quase todas as espécies possuem flores brancas, mas há algumas de flores amarelas ou rosadas.
A maior produtora de jasmins do mundo é a Índia mas a China sempre foi uma grande produtora de jasmim, que tem aroma é adocicado, e é juntamente com a rosa um dos aromas pilares da perfumaria. Mas na gastronomia, vem da China Antiga o uso de flores e folhas de jasmim para preparar chá – aliás o chá de jasmim e um dos mais apreciados.
São conhecidas atualmente 537 espécies, dentre as quais as espécies mais populares de jasmim, são: 


Jasminum azoricum, ou Jasmim-dos-açores; 




Jasminum mesnyi, ou Jasmim-amarelo (sem aroma); 




Jasminum nitidum, ou Jasmim-estrela; 




Jasminum officinale, ou Jasmim-verdadeiro, e 




Jasminum polyanthum, ou Jasmim-dos-poetas.




O “Rei das Flores”, ou a “Rainha da Noite” tem uma longa associação com o Amor e com o ato de fazer amor. Tem sido reverenciado no Oriente desde muito tempo, por suas propriedades medicinais e na produção de perfumes.
Na Índia, o Jasmim é considerado uma flor sagrada, conhecida como “luz da lua no jardim” - é tradicionalmente tecido nas guirlandas dos noivos e serve de ornamento aromático às mulheres, que têm especial preferência por seu óleo, usado nos cabelos.



Reza uma lenda hindu que o deus do amor, aquele que se assemelha aos deuses do amor para os gregos Eros e Cupido para os romanos, que também é representado com um arco e flecha nas mãos, colocava jasmim nas pontas de suas flechas para atingir o coração das pessoas pelos sentidos e despertar o desejo.
Dioscorides, médico grego do século I, dizia que os persas usavam o Jasmim para perfumar o ar durante os eventos de seus banquetes. Juntamente com a Rosa, sempre aparecia nos poemas Sufi, como um símbolo de amor e busca espiritual. Historicamente o Jasmim tem sido associado com a Lua, consequentemente com a deusa Ártemis, a deusa da lua para os gregos.
O Jasmim cresce ao longo do Rio Nilo, no Egito – cujas flores são dedicadas a deusa Isis, deusa mãe egípcia, aquela que detém os segredos da fertilidade, magia e da cura. E do Egito, vem um causo particular sobre o uso do jasmim por uma poderosa governante: diz-se por lá que Cleópatra teria banhado com jasmim as velas de seu navio para aproximar-se de Marco Antônio, pois já se acreditava que seu perfume exótico e envolvente era um poderoso afrodisíaco que ajudava a acentuar a sensualidade durante a noite (Acho que vou comprar essência de jasmim para banhar minhas roupas, risos).



Na China, o jasmim era usado para comemorar o ano novo com suas pétalas, para pendurar suas flores nas beiradas de casas flutuantes, para fazer chás, para enfeitar os cabelos das moças e também para purificar o quarto dos doentes. Segundo a arte do Feng Shui, possuir jasmim no jardim é indispensável para a harmonia da casa. A farmacopeia chinesa tradicional utiliza-o também misturado com vinho ou chá, ou em óleos de massagem.



Muito ligado ao aspecto feminino, o jasmim inspirava as canções ardentes e lascivas dos poetas árabes. Era, também, uma das flores mais usadas pelas "favoritas" dos sultões, ao se enfeitarem para as longas noites de amor. Por séculos, o Jasmim tem sido associado com feminidade, amor e fertilidade, na tradição hindu e muçulmana.
Madame de Sévigné teria lançado a moda do jasmim em Versailles, onde o ofereciam, dizem, em troca de afagos (prefiro não comentar). O jasmim tornou-se, no século XVIII, a flor de Grasse por excelência. Napoleão comprava aí grandes quantidades para Josefina de Beauhrnais.


Madame de Sévigné
Dentre os significados mais conhecidos para o jasmim estão: que ele representa a “eloquência”, “doçura”, “amizade”, “charme” e “afeição”. Também se diz que pessoas que escolhem o jasmim estão em busca de conhecimento e crescimento espiritual – este particularmente é o meu caso, e achoq eu o da minha amiga (mas ela ainda não descobriu isso (até agora). O Jasmim amarelo, significa amor, beleza delicada, elegância e graciosidade. O Jasmim branco, significa amabilidade. E o Jasmin-real a sensualidade. Dizem que sonhar com jasmim é sinal de sorte (inclusive no amor). Mas o bom mesmo é saber que ele é um ótimo calmante e melhorador da função respiratória – para estes fins deve-se tomar uma xicara de chá de jasmim após o jantar, no máximo.
Mas já que o que eu queria expor foi explicado, agora é o momento de se aventurar com o jasmim na cozinha, e deixar a magia acontecer e te seduzir com aroma e sabores especiais. Assim, abaixo estão algumas receitas que consegui garimpar por aí. Aproveitem.

Wrap de Salmão Marinado em Jasmim com Queijo Feta e Mel

50 grama(s) de filé de salmão
1/2 colher(es) de sopa de sal grosso
2 colher(es) de chá de açúcar cristal
1/5 maço(s) de endro
20 grama(s) de cebola roxa
6 colher(es) de chá de folhas de chá de jasmim
1 pão folha
alface roxa e crespa a gosto
20 grama(s) de queijo feta
1/2 xícara(s) de chá de azeite extra virgem
1 colher(es) de chá de mel
1 colher(es) de sopa de cream cheese
cebolinha francesa a gosto

Preparo: Marine o salmão com o sal grosso, o açúcar, o azeite, o endro, a cebola fatiada na mandolina (tipo de fatiador regulável) e o chá de jasmim. Deixe de molho por pelo menos 8 horas. Monte o sanduíche da seguinte forma: no pão folha, coloque o salmão cortado como um sashimi fino, apenas em uma das metades do pão. Disponha a salada (folhas de alface rasgadas) por cima e corte em cubos a cebola, o jasmim e o endro da marinada.  Grelhe o queijo feta, corte bem e misture com o mel e o cream cheese. Use essa pasta na outra metade do pão ao enrolar o sanduíche. Salpique a cebolinha a gosto.

Sorvete de banana com flor de jasmim manga

Bata no liquidificador 

3 bananas congeladas em fatias,
um tanto de leite de coco caseiro (o suficiente para girar a hélice),
4 flores de jasmim manga,
2 folhas de malva (uma erva medicinal deliciosa que tenho na horta) e
flores de assa peixe (opcional)
Bata bem e está pronto. Servir em seguida.


Creme de jasmim

375ml de creme de leite fresco
200ml de leite integral
50g de flores de jasmim frescas
6 gemas
70g de açúcar

Preparo: Esquente o creme de leite. Deixe que ferva e suba antes de tirar do fogo. Acrescente o jasmim e deixe esfriar. Peneire a mistura, passando para uma panela de fundo grosso, pressionando as flores para soltar a fragrância. Reaqueça o creme até ferver. Bata as gemas e jogue por cima uma parte do creme fervente. Bata até que a mistura fique homogênea.Continue acrescentando o creme quente, aos poucos, batendo com cuidado para não talhar. Devolva a mistura à panela e acrescente o açúcar. Cozinhe em fogo baixo, mexendo sempre, até que o creme grude nas costas da colher. Despeje em seis ramequins e asse em forno pré-aquecido, a 150 graus, por cerca de 45 minutos, até que os lados descolem das laterais dos ramequins. Polvilhe açúcar por cima e caramelize com maçarico.