sexta-feira, 23 de julho de 2021

Loukoumádes - um antigo doce grego para os campeões Olímpicos!

 

A cerimônia dos Jogos Olímpicos de Tóquio 2020 acabou de ser finalizada oficializando a abertura dessa edição de superação para a competição esportiva mundial. Eu confesso que gosto de assistir as Cerimônias de Abertura e de Encerramento, gosto de ver a criatividade em ação e, principalmente, relembrar as músicas temas das edições anteriores e a letra do Hino Olímpico – esta última, para mim, é uma bela oração. Vou deixar a letra do Hino Olímpico aqui embaixo para vocês entenderem do que eu falo...

Grego lírico

Transliteração ao alfabeto latino

Versão em Português

Αρχαίο Πνεύμ' αθάνατο, αγνέ πατέρα
του ωραίου, του μεγάλου και τ'αληθινού,
κατέβα, φανερώσου κι άστραψ'εδώ πέρα
στην δόξα της δικής σου γης και τ'ουρανού.

Στο δρόμο και στο πάλεμα και στο λιθάρι,
στων ευγενών Αγώνων λάμψε την ορμή,
και με τ' αμάραντο στεφάνωσε κλωνάρι
και σιδερένιο πλάσε κι άξιο το κορμί.

Κάμποι, βουνά και θάλασσες φέγγουν μαζί σου
σαν ένας λευκοπόρφυρος μέγας ναός,
και τρέχει στο ναό εδώ, προσκυνητής σου,
Αρχαίο Πνεύμ' αθάνατο, κάθε λαός.

Arkhéo Pnévma athánato, aghné patéra
tou oraéou, tou meghálou kai t'alithinoú,
katéva, phanerósou ki ástraps'edhó péra
stin dhóksa tis dhikís sou ghis kai t'ouranoú.

Sto dhrómo kai sto pálema kai sto lithári,
ston evghenón Aghónon lámpse tin ormí,
kai me t'amáranto stefánose klonári
kai sidherénio pláse ki áksio to kormí.

Kámpi vouná kai thálasses féngoun mazí sou
san énas levkopórfyros méghas naós,
kai trékhei sto naó edhó, proskynitís sou,
Arkhaéo Pneúm' athánato, káthe laós.

Oh! Arcaico espírito imortal, imaculado
Pai da beleza, da grandeza e da veracidade
Desça, se faça presente e faça brilhar aqui e
Mais além, na Glória de sua Terra e Céu

Na corrida, na luta e no arremesso, faça
brilhar o ímpeto das nobres competições
Modelando com aço e dignidade o corpo
Coroando-o com a imperecível rama do louro

Campos, montanhas e mares se vão contigo
Tal como um alvirrubro magno templo

Para o qual se conduz aqui como seu peregrino
Oh, arcaico espírito imortal, cada nação.

 O próprio Hino Olímpico (Grego: Ολυμπιακός Ύμνος) já é uma curiosidade por si só: composto pelo grego Spyridon Samaras, com letra do poeta romano Kostís Palamás em 1800, foi adotado pelo Comitê Olímpico Internacional (COI) em 1958, e se vem sendo executado durante a Cerimônia de Abertura de cada edição, quando a Bandeira Olímpica é hasteada, e na Cerimônia de Encerramento, quando ela é arriada. De tal modo, o Hino Olímpico começou a ser cantado em grego, mas em várias edições foi traduzido para o idioma do país anfitrião. Em Sydney 2000, o hino voltou a ser cantado em grego na Cerimônia de Abertura, o que foi repetido em Pequim 2008.

Daí, fiquei pensando na ligação das olímpiadas com a culinária. Sim, essa ligação existe e pouco gente reconhece. Por isso, hoje, além de esclarecer essa relação lhes trago uma receita antiga e deliciosa para Loukoumádes, pequenas bolinhas de massa fermentada (tipo donuts ou rosquinhas) e, mais raramente, em forma de anel (rosquinhas), que depois de bem douradas (pois são fritas em imersão de óleo) são mergulhadas em mel ou cobertas com mel e xarope de açúcar, polvilhados com canela, gergelim e/ou nozes – embora, na atualidade, as coberturas possam variar absurdamente.



O Loukoumádes (λουκουμάδες), loukoumas no singular e lokmádes (λοκμάδες) no grego cipriota, ainda podem ser conhecidos como bamieh, zalabia, lokma ou luqmat al-qadi em árabe (لقمة القاضي), A palavra grega, loukoumádes, deriva da palavra turca, lokma, que significa “mordida”. Enquanto o termo Lokma vem da palavra árabe para “pequena mordida”, e sua variante chamada luqmat al-qadi, que significa “bocado do juiz” (لقمة القاضي) remonta, pelo menos ao início do período medieval, ao califado abássida do século XIII, quando é mencionado em vários dos livros de receitas existentes da época - os abássidas foram uma dinastia califa muçulmana que governou o mundo islâmico de 750 a 1258, cobrindo uma área de cerca de 7 milhões de milhas quadradas (11,1 milhões de km²), e foi um dos maiores impérios de todos os tempos.

O Luqmat-al-qadi era tão popular que, inclusive, é mencionado em “O Carregador e as Três Damas de Bagdá”, uma das histórias do Livro das Mil e Uma Noites, uma famosa coleção de histórias e contos populares  originárias do Oriente Médio e do Sul da Ásia compiladas em língua árabe a partir do século IX. As histórias que compõem as Mil e uma noites têm várias origens, incluindo o folclore indiano, persa e árabe, lugares onde esse bolinho frito e mergulhado em mel pode ser encontrado com nomes distintos. (se você ficou curioso em saber mais sobre a história desse conto em especial, você poderá ler a versão completa dessa história específica AQUI, em inglês ).

Esses bolinhos encharcados de mel foram conhecidos até pelo o famoso Shams ad-Din Abu Abd Allah Muhammad ibn Muhammad ibn Ibrahim al-Luwati at-Tanji ou, simplesmente, Ibne Battuta (1304 - 1368 ou 1369), um viajante, historiador e jurista marroquino considerado um dos maiores viajantes de todos os tempos, mas  que ficou conhecido no mundo islâmico como o príncipe dos viajantes, devido a sua famosa jornada realizada entre 1325 e 1353 que percorreu cerca de 120 mil quilômetros - com viagens que atravessaram o Norte da África, a península arábica, o extremo oriente, a Anatólia, a costa oriental africana e o Sahel -  ele traz em  seus relatos menção a um doce chamado luqaymat al-qadi, que ele descobriu no século XIV durante um jantar em Multan, uma cidade do Paquistão, localizada ao sul da província do Punjab, em suas viagens pela Índia medieval, onde seus anfitriões chamavam esses bolinhos de “al-hashimi”.

                                                            Ibne battuta

Durante muitos séculos, esses pequenos bolinhos fritos mergulhados em mel também foram preparados pelos cozinheiros dos palácios do Império Otomano (1299 - 1922) e, portanto, influenciaram a culinária de outros países: como nos antigos países do Império Otomano, Bálcãs, Oriente Médio e Cáucaso.

Mas a busca por referências históricas mais antigas desse bolinho nos leva ainda mais longe no tempo: nos permite chegar ao ano de 776 aC, e registrar sua presença nos Jogos Olímpicos que, reza a lenda, foram instituídos por Herácles (Hércules em latim, o filho de Zeus - o rei dos deuses gregos – com a mortal Alcmena), e que no final do século VI a.C. haviam se tornado o mais famoso de todos os festivais esportivos gregos.

Esse fato torna-se fundamental, pois é o elo histórico que faz a ligação direta entre às antigas Olimpíadas com a culinária grega, ou com a gastronomia de modo generalístico, de três maneiras especificas, as quais apresento a seguir.

Primeiro, e literalmente, pela existência do atleta amador que conquistou a única coroa da vitória dos primeiros Jogos Olímpicos registrados, em 776 aC: ele era conhecido como Coroebus de Elis, um padeiro e mageiro (μάγειρος em grego, esse termo se refere a um cozinheiro que também era açougueiro). Cabe ressaltar que o Mageiro foi a primeira manifestação, no Ocidente, do ofício de cozinheiro, um profissional cuja principal função era preparar alimentos melhores, modificando a relação da sociedade com os alimentos.

Assim, o padeiro e mageiro Coroebus de Elis foi proclamado vencedor do stadion ou stade (grego antigo: στάδιον, termo que deu origem ao "estádio" moderno) – uma corrida a pé de 192 metros  realizada dentro do Altis Sagrado de Olympia, onde ficava o grandioso templo de Zeus que detinha a magnifica estátua de Zeus de Fídias considerada uma das sete maravilhas do mundo antigo. Ora, confesso que essa ideia de um cozinheiro correndo não é surpresa para os trabalhadores da cozinha, já que o ambiente de trabalho é uma correria continua; e que, mesmo em casa, corremos ao menor sinal de que algo esteja queimando na cozinha [risos].


Maquete do Altis Sagrado

Plano do Altis sagrado de Olimpía - Edifícios : 1: Propylon – 2: Pritaneu. – 3: Philippeion – 4: Templo de Hera – 5: Pelopion – 6: Ninfeu de Hérodes Ático – 7: Metroon – 8: Zanes – 9: Cripta – 10: Stadium – 11: Stoa Eco – 12: Edifício de Ptolomeu II e Arsínoe – 13: Stoa de Héstia – 14: Edifício helenístico – 15: Templo de Zeus – 16: Altar de Zeus – 17: Ex-voto dos Aqueus – 18: Ex-voto de Micitos – 19: Nice de Peônio – 20: Gymnasion – 21: Palaestra – 22: Theokoleon – 23: Heroon – 24: Atelier de Fídias e Basílica paleocristã – 25: Banhos de Kladeos – 26: Banhos gregas – 27 e 28: Hospedarias – 29: Leonidaion – 30: Banhos sul – 31: Bouleuterion – 32: Stoa sul – 33: Villa de Nero Tesouros I: Sicyon – II: Siracusa – III: Epidamno ? – IV: Bizâncio ? – V: Síbaris ? – VI: Cirene ? – VII: ? – VIII: Altar ? – IX: Selinunte – X: Metaponto – XI: Megara – XII: Gela,

Maquete do Templo de Zeus Olímpico, em Olímpia.

Ruinas do Templo de Zeus Olímpico, em Olímpia.

Representação da estátua de Zeus de Fídias - umas das sete maravilhas do mundo antigo.

O segundo ponto de confluência entre a história da culinária grega e os Jogos Olímpicos era o tradicional prêmio de vitória dos atletas nos Jogos Olímpicos   antigos. Os vencedores receberiam uma coroa de oliveira ou kotinos (κότινος) formada de um ramo de oliveira selvagem que crescia próximo ao templo de Zeus, no Altis sagrado de em Olímpia, interligado para formar um círculo. Os ramos da oliveira selvagem sagrada eram cortados por um "pais amfithalis" (um menino cujos pais eram ambos vivos) com um par de tesouras de ouro. Em seguida, ele levava-os para o templo de Hera (Heraion) e colocava-os sobre uma mesa de ouro e marfim. A partir daí o Hellanodikai (o júri dos Jogos Olímpicos) levava-os, fazia as coroas e coroava os vencedores dos Jogos.

Kotinos é um símbolo inconfundível da importância da oliveira e, principalmente da azeitona e do seu cultivo para os gregos, tanto no passado como no presente. Dela é extraído o azeite, um ingrediente fundamental na cozinha grega, e assim tem sido desde os tempos mais remotos da Antiguidade quando a oliveira se tornou importante elemento do mito de fundação da cidade de Atenas, estabelecendo a primazia da deusa da sabedoria e guerra, Atena, dentro da cidade que levaria seu nome.

Diz a lenda que Zeus ofereceu uma competição entre Atenas e Poseidon pela posse da cidade de Atenas. Poseidon ergueu seu tridente de três pontas, esmagou-o sobre a rocha dura da Acrópole e uma fonte salgada surgiu. A deusa Atena, por outro lado, produziu uma oliveira, seus ricos frutos abundantemente pendurados nos galhos. Esse confronto dramático entre os dois poderosos deuses olímpicos foi imortalizado na pedra, representado nas esculturas do frontão oeste do Partenon. Os cidadãos de Atenas acabaram findando a disputa com a escolha do presente dado pela deusa, pelas possibilidades que a oliveira poderiam lhe ofertar; as folhas de oliveira têm sido usadas para coroar as cabeças de atletas vitoriosos, generais e reis, a madeira usada para construir casas e barcos; o azeite usado para abastecer lâmpadas, esfregado nos corpos tonificados e musculosos de atletas ágeis, adicionado a todos os alimentos pratos e as próprias azeitonas - um alimento básico na dieta mediterrânea e um produto de exportação valioso ao longo da antiguidade e hoje. Até mesmo as icônicas moedas de tetradrachma atenienses tinham as folhas do ramo de oliveira à esquerda da coruja de Atenas.

A ligação divina deu à oliveira da Acrópole Ateniense maior importância dentre todas as outras: um templo para Atena Polias ('da cidade') foi construído c.525 aC, e nele foi criado um recinto para a oliveira sagrada de Atena, além de abrigar uma estátua de culto xoanon - ela própria feita de madeira de oliveira. Ocorre que, quando os exércitos persas do rei Xerxes varreram a Grécia e saquearam Atenas, em 480 AC, foram incendiados e destruídos os edifícios da Acrópole. Entretanto, registra Heródoto que, a oliveira 'brotou no mesmo dia a uma altura de dois côvados '(3 pés, ou 91 centímetros). As sementes dos remanescentes dessa árvore foram replantadas em toda a Ática e, dessa forma, todos os olivais ao redor de Atenas têm um toque da árvore original de Atenas.


O Erechtheion era o templo sagrado dedicado a Atena e Poseidon - nele abrigava a estátua de Atena, mesmo que uma nova fosse erguida no Parthenon , nele também há as marcas do tridente de Poseidon que trouxe a fonte de água salgada do mito fundante, e a oliveira sagrada de Aytena.

Nessa abertura no piso do Pórtico Norte do Erechtheion  diz-se que é o lugar das marcas do Tridente de Poseidon.

Mais tarde, em 421 AC, quando o Juramento do Platéia, que havia sido jurado em 479 AC para deixar as ruínas da destruição persa como memoriais à guerra, expirou, o Erechtheion foi construído nas áreas mais sagradas da Acrópole. Não eram apenas tumbas para os reis míticos Kekrops e Erechtheus aqui, mas também o local onde o tridente de Poseidon atingiu o chão e, claro, a oliveira sagrada de Atenas. Mais uma vez, a oliveira recuperou grandes monumentos nas suas proximidades e continuou a ser homenageada e permanecer uma parte central da paisagem religiosa e cultural ateniense durante os séculos vindouros.

E assim a oliveira, o presente da deusa da sabedoria e da guerra, permaneceu uma parte central da vida grega desde então, por todas as suas qualidades profundas e até hoje, no topo da Acrópole de Atenas está uma oliveira que é um símbolo de centenas de anos de dedicação e reverência. Embora a oliveira que se mantem hoje na Acrópole não seja a 'árvore primordial”, ela permanece no mesmo local que a original.

O terceiro e último ponto de convergência entre a história da comida grega e os antigos Jogos Olímpicos está na alimentação ritual dos vencedores na antiga Olímpia. O poeta Callimachus, ou Calímaco de Cirene (c. 310- c. 235 aC), nos conta que um dos primeiros prêmios atribuídos aos vencedores era o que é comumente traduzido como “lembranças (souvenir) de mel”, e naquela época era chamado de "charisoi" (χαρίσιοι, em gregro grego – essa expressão pode ainda ser entendida como “símbolo”, “signo”, “provas’), de onde vem a palavra "charisma". Os charisoi eram essencialmente bolas de massa fritas cobertas de mel oferecidas aos atletas vitoriosos em uma cerimônia altamente ritualizada junto com a coroa de kotinos.


A referência de Callimachus a essas "lembranças de mel" é a primeira menção feita a um produto de confeitaria na literatura europeia. Hoje, as "lembranças de mel" de Callimachus são conhecidas como Loukoumádes e podem ser encontrados em toda a Grécia, onde virou comida de rua e ter, até, confeitarias especializadas que servem apenas Loukoumádes.

Logo, se você tem o hábito de acompanhar os Jogos Olímpicos, não foi por acaso que os loukoumádes foram oferecidos nos Jogos Olímpicos de Pequim, em 2008, a todos os medalhistas de ouro, iniciando com a primeira medalhista de ouro dos Jogos Olímpicos de Pequim 2008, Katerina Emmons da República Tcheca. na prova da carabina de ar do tiro esportivo.

Além dessa representatividade histórica ligada ao Jogos Olímpicos, a conversão religiosa ocorrida na Grécia levou a preparação para outras festividades: hoje, esses bolinhos são característicos no dia de Santo André (30 de novembro), quando as mulheres gregas costumam preparar loukoumádes e oferecê-los à igreja. Diz a lenda que a esposa de Santo André os ofereceu a Jesus e seus discípulos no dia em que chegaram com fome à aldeia.

Mas, as mulheres gregas também preparam loukoumádes no dia de Santa Bárbara, uma santa e grande mártir que viveu no século III dC em Nicomédia, capital do reino da Bitínia na Ásia Menor. A santa é venerada desde o século VIII, especialmente no Oriente cristão, e é celebrada todo dia 4 de dezembro por ortodoxos e católicos.

Agora você poderá preparar em casa a "comida dos campeões Olímpicos", fazer uma pilha de Loukoumádes do tamanho do Monte Olimpo, pois eu garanto que a receita é fácil e vai agradar a todos. Veja a receita abaixo. 

Loukoumádes

Para a massa

1 ¼ xícara de farinha de trigo, peneirada

1 xícara de água morna (a 97 ° F / 36 ° C)

1 colher de sopa de açúcar refinado

1 colher de chá de fermento biológico seco

Pitada de sal

1 colher de sopa de vinagre branco

Óleo vegetal (para fritar)

Para a calda

1 xícara de água

2 xícaras de açúcar

1 limão, raspas e suco

1 pau de canela

6 colheres de sopa de mel

Para decorar

Canela em pó

Sementes de gergelim branco ou nozes picadas (opcional) 

Preparo: primeiro, prepare o xarope porque terá que estar frio para revestir os loukoumádes quentes. Calda - coloque a água, o açúcar, o pau de canela, as raspas de limão e o suco de limão em uma panela antiaderente e leve ao fogo alto. Abaixe o fogo e cozinhe a calda por 15 minutos. Dois minutos antes do final do cozimento, acrescente o mel. Deixe esfriar completamente. Massa - no processador de alimentos (ou na mão) misture a farinha, o açúcar e o fermento. Enquanto começa a amassar em velocidade baixa, adicione a água lentamente. Adicione o vinagre e continue a amassar. Por fim, adicione o sal e amasse por 5 minutos em velocidade média. Cubra a tigela com um pano e deixe a massa crescer em local aquecido e sem correntes de ar por 45 minutos. Fritar - aqueça um grande banho de óleo em uma panela funda, a uma temperatura de 335 ° F (170 ° C). Sove um pouco a massa para soltar o ar, depois com uma colher de chá umedecida no óleo, pegue um pouco da massa, forme uma bola e mergulhe na frigideira. Frite as bolinhas de massa por alguns minutos, mexendo sempre com uma escumadeira ou colher, até que fiquem douradas. Certifique-se de manter a temperatura do óleo em 335 ° F (170 ° C). Usando uma escumadeira, remova as bolinhas douradas e escorra em papel absorvente e mergulhe imediatamente os loukoumádes ainda quentes na calda fria. Deixe absorver a calda e escorra em uma peneira, se necessário. Antes de servir, polvilhe com canela e sementes de gergelim branco ou nozes picadas.

 

quarta-feira, 21 de julho de 2021

Torta Barozzi - um bolo único, artesanal, sem glúten que mantêm a receita secreta desde 1886.

A cozinha é um incrível lugar de transformação, e muitas vezes não nos damos conta disso. Ou, esquecemos ao longo do tempo em que tratamos a cozinha como um espaço puramente funcional das nossas casas. Essa não-lembrança, ou esquecimento, acaba gerando invisibilidade para tudo que ali acontece. Mas, pense bem: como invisibilizamos ou podemos esquecer do que acontece no lugar que precisamos com tanta frequência?  Por que invisibiliza-se ou esquece-se do lugar que criou as tradições culinárias que perduram até hoje nas nossas mesas nos momentos de comemoração, de encontro, de carinho e, até, nos momentos de tristeza, de luto, de morte? Esse esquecimento ou a invisibilidade é capaz de suprimir os sacrifícios, as lutas, as mãos experientes, os saberes e fazeres e suas invenções criativas que, algumas vezes, por um golpe de sorte resistem ao tempo e lhe servem de prazeres e memórias... e que são resgatadas, por exemplo, quando você vai em uma confeitaria, num restaurante para saborear algo pra satisfazer o seu desejo. Aí, você lembra do lugar ou das pessoas que faz “o melhor”; ou, simplesmente reclama quando o pedido não está servido ao seu gosto...

Eu fico pensando essas coisas toda vez que eu quero comer bolo de chocolate... são tantas as possibilidades de pensar sobre a cozinha e tudo que a cerca... Imagine: por trás de cada receita, de cada história, de cada cozinheira ou cozinheiro, há uma história esperando para ser revelada. Umas viram lendas e passam a inspirar outras pessoas;  outras tornam-se parte da mitologia da cozinha e se encontram em patamares que só os deuses alcança; mas, existem aquelas que, simplesmente, evaporaram no ar, como se nunca tivessem existido... No caso dos bolos de chocolate, que são muitas as variações, imaginem quantas histórias se pode contar... foi pensando nisso que hoje vim resolvi apresentar um pouco sobre a história de um ícone gastronômico do Norte da Itália, a deliciosa Torta Barozzi.


A história desse tipo de bolo que já se tornou uma verdadeira instituição, começa num passado distante e precisamente no coração de Vignola, uma comuna italiana da região da Emília-Romagna, província de Modena: no final século XIX, em 1886, na pequena localidade da Vignola, existia - e ainda existe - uma confeitaria chamada Pasticceria Gollini, que carrega o sobrenome de seus fundador, Eugenio Gollini, lá foi o lugar de nascimento desse bolo peculiar, cujo nome é tão icônico que, hoje, pode ser chamado simplesmente de "La Barozzi"!

                    Eugenio Gollini empenhado na confeitaria, inicio de 1900.

O tempo acabou transformando o bolo em sobremesa histórica da Vignola, muito difundida em toda a zona de Modena, feita a base de ovos, chocolate amargo, cacau, café (existe inclusive a lenda de que ela é feita com borra de café – o que lhe confere um resíduo muito peculiar o qual alguns comensais registram sentir quando comem do bolo) açúcar, manteiga, amêndoa, amendoim, rum (ou grappa). Isso mesmo, é um bolo de dois séculos, sem farinha! Estamos, portanto, diante de uma torta naturalmente sem glúten.

A autêntica Torta Barozzi é marca registrada desde 1948 e sua receita original ainda hoje é “secreta”. Esteticamente a torta pode ter a aparência de um brownie, um bolo norte-americano também inventado como o conhecemos no século XIX, mas o resultado da Torta Barozzi foi um percurso pensado e envolveu também os clientes da pastelaria: diz-se que Eugenio fez muitos testes, usando ingredientes e procedimentos diversos, até chegar na receita definitiva. Depois, deixou que os amigos e clientes da pastelaria provassem os resultados dessas experiências culinárias para encontrar o equilíbrio perfeito que pudesse agradar a todos.


Essa sacada de Eugenio Gollini foi, portanto, fundamental para o sucesso de um produto que pudesse satisfazer o paladar dos clientes – muito provavelmente, ele não tinha em mente a ambição de que sua receita tivesse uma vida tão longeva e acabasse se tornando uma referência mundial de destaque. Além disso, mostra a dedicação do cozinheiro em um processo contínuo de aprimoramento de receita, algo tão comum até os dias de hoje, mas que muita gente não se dá conta... Até que, após inúmeras provas, e reprovações, encontrou-se as proporções que mais o convenceram, e essa formula virou a receita definitiva.

Quando Eugenio encontrou a receita perfeita para sua criação, em 1886, a torta era um “tijolo escuro” que exalava o cheiro intenso do chocolate amargo, recebeu o nome "torta nera" (torta negra, bolo negro).  Por fim, essa “torta nera” tornou-se em pouco tempo um dos símbolos de Vignola, como o Rocca ou o Palazzo Boncompagni.

                     Rocca de Vignola ou Fondazione di Vignola

                     Palazzo Boncompagni di Vignola

A pastelaria Gollini passou a ser frequentada não só pela gente de Vignola, mas também por gentes que vinham de fora para provar o famoso bolo do lugar. Em 1907, durante o quarto centenário do nascimento de Jacopo Barozzi, um famoso arquiteto de Vignola, conhecido como "il Vignola", Eugenio Gollini passou a chamar a sobremesa de "Pasta Barozzi", que significa Torta Barozzi, e por esse nome ficou conhecida até hoje. O sucesso do chef pasteleiro foi grande com a receita, e se mantem ao longo de anos – demonstrando que se trata de uma excelente torta.

Uma listagem de 1927 da Gollini demonstrando as preparações principais da confeitaria.

E, só para que você sinta a importância dessa homenagem feita pelo senhor Gollini, Jacopo Barozzi (1507/1573), ainda conhecido como "il Vignola" pelo nome de sua cidade natal, foi um dos maiores arquitetos da Itália central da segunda metade do século XVI. Ele atuou principalmente em Roma, onde se tornou o arquiteto oficial do Papa Júlio III. Foi responsável por algumas das mais belas residências da família Farnese, incluindo a de Caprarola e numerosos edifícios religiosos, que culminaram na sua obra-prima, a Igreja do Gesù em Roma.

Cartão postal de lembrança da Vignola mostrando duas fotos diferentes da famosa escada em espiral projetada por Jacopo Barozzi.

Em Vignola encontra-se o Palácio Boncompagni, provavelmente construído a partir de um projeto de Barozzi e construído por volta de 1566-67, a mando de Ercole Contrari, pelo arquiteto ferrara Bartolomeo Tristano, na época trabalhando para o duque de Modena Alfonso II. O edifício é constituído por um corpo central e dois laterais, com portal de silhar; no interior pode-se admirar a escada em espiral oval, também construída por Bartolomeo Tristano com base no projeto de Barozzi.


Mas, voltando para a nossa história, outra virada de grande sucesso da sobremesa veio em 1948, quando deixou de ser apenas um "bom bolo" de uma pequena confeitaria de Vignola, e tornou-se uma marca registrada: o nome de "Torta Barozzi" era protegido por Eugenio Gollini, sobrinho do inventor com o mesmo nome, que registrava o nome e a marca, regularmente renovada a cada vinte anos.

Essa atitude já nos revela a importância dessa torta que, desde aquela época, se entendia que se tratava de um produto a ser preservado, protegido. Naquela época, não era tão comum registrar uma marca. Na verdade, não existem tantas marcas históricas na Itália. Outro ponto a favor da Torta Barozzi surge ainda nos últimos tempos, quando os Gollini conseguiram o reconhecimento e ela passou a ser incluída no Registo de Sociedades Históricas, sinal de uma tradição consolidada e estimada.

Não por acaso, é uma preparação que começa a ter um passado desafiador. No entanto, em 1886, já havia se mostrado "à frente" dos tempos. Por que razão?

Bom, para a época a composição da torta era bastante inovadora porque tinha um ingrediente quase exótico (por incrível que pareça!): o amendoim, que no final do século XIX, não era muito difundido na Europa. Eugenio Gollini que era uma pessoa um tanto original, também foi original com na escolha dos ingredientes para o bolo - confirmando essa característica. Mas não se engane, essa não é a única peculiaridade.

Na verdade, já na versão original do Bolo Barozzi não havia farinha: portanto, não é que se trata de “uma receita de antigamente feito ao modo de hoje”; não falta farinha porque agora há mais atenção ao problema da doença celíaca. Não, a torta nasceu assim, sem glúten, para alegria de todos os celíacos. E também não há adição de conservantes, tão abusados hoje em dia. Por isso a conservação do bolo é muito mais limitada, pois não tem ingredientes químicos. Não passa de 40 dias fora da geladeira, mas eles seguem mantendo-o fiel a receita original, e fazem muito bem assim.

Para muitos, o fato de a receita ter se mantido secreta desde o início por isso ficou e por isso deve permanecer, porque faz parte da sua aura de mistério que certamente contribui para o seu sucesso. Mas pela representatividade histórica e simbólica, tornou-se mais que uma sobremesa tradicional sendo uma das receitas mais imitadas nos lares de toda a zona de Modena. Todas as versões, mais ou menos semelhantes, propostas por confeitarias, delicatessens, bares, restaurantes e quintas da zona de Modena podem, portanto, ser definidas como “Torta Tipo Barozzi”.

Entretanto, cuidado, paixão e respeito pelo passado mantem os segredos da “Barozzi” original que continua sendo fabricada pela Gollini. Eu acredito que, para além da receita 100% ultrassecreta, existem outros ingredientes nem tão secretos que se acrescentam à preparação: a paixão e o respeitos dos locais pelo passado, pela preservação da memória, por manter a tradição de um bolo que vem resistindo desde então como representante da identidade daquele lugar.

Esse bolo é tão especial e peculiar que já virou alvo de grandes chefs de cozinha, como o badalado chef Massimo Bottura, orgulhoso porta-voz da riqueza da terra de Modena, que há alguns anos demonstrou em um vídeo como esta pequena joia ficava ainda mais deliciosa quando molhada com algumas gotas de vinagre balsâmico de Modena (você pode conferir no vídeo abaixo:

Mas, enquanto não se pode viajar até a Itália para comer uma barozzi original, você pode fazer a sua torta Tipo Barozzi, em casa, e se deliciar já pensando no destino da próxima viagem e de como as coisas que acontecem na cozinham podem modificar a histórias das pessoas e dos lugares...

TORTA TIPO BAROZZI

250 gramas de chocolate amargo

80 gramas de manteiga

100 gramas de amendoim descascado (sem sal)

100 gramas de amêndoas descascadas

4 ovos

150 gramas de açúcar

1 xicara de pequena de café expresso (50ml -, (Mas, se preferir, você pode usar 5 colheres de café de Nescafé - café solúvel)

1 dose de rum (50ml)

Preparo: Levar o chocolate ao banho maria e derreter junto à manteiga. Em uma tigela, fazer uma gemada com as gemas e o açúcar, bater bem até ficar clarinhas. Acrescentar as amêndoas e amendoim moídos. Acrescentar o rum e o café e mexer bem. Juntar o chocolate derretido. bater as claras em neve até picos firmes, e misturar delicadamente e levar a uma forma untada e enfarinhada. Assar em forno pré-aquecido a 180 graus por 20 minutos. Deixar esfriar por alguns minutos antes de servir.