Caros
amigos, hoje à tarde eu iniciei uma busca que me deixou numa curiosidade
terrível. Eu buscava por temas interessantes para dividir com vocês, foi quando
me deparei com uma história que, no mínimo, me deixou de cabelo em pé.
E
iniciava como mais um caso de doença metal entre um membro da família imperial
brasileira, e que serviu como pano de fundo para o surgimento de uma invenção
da cozinha brasileira das mais conhecida: a coxinha de frango, um salgadinho
que conquistou o paladar de nobres e plebeus. Antes, porém, devo explicar o que
me ocorreu...
Depois
que encontrei uma informação sobre a possível ligação de um príncipe imperial
do Brasil com o surgimento do quitute, eu fui atrás de saber qual príncipe era
este. Baseado no relato que apontava que um filho da princesa Isabel do Brasil
teria uma doença mental, e por não ter encontrado menções em documentos (na
internet e em bibliotecas) sobre a enfermidade que acometia a um dos filhos de
d. Isabel em alguns documentos resolvi me
contactar com o serviço de atendimento da Casa Imperial do Brasil
(http://www.monarquia.org.br/portal/), para que eles me esclarecessem a dúvida.
Porém, até a data de publicação desta postagem eu não obtive um retorno deles.
Enquanto
aguardava um retorno da Casa Imperial Brasileira e continuei pesquisando sobre
o curioso tema. Mas para lhes adiantar sobre o fato, vou lhes contar a história
que me deixou com umas pulgas atrás da orelha. O que está escrito aqui para
relatar o surgimento da coxinha de frango, foi retirado do livro: ‘HISTÓRIAS E
RECEITAS, de Nadir Cavazin, 2000, realizado pela Sociedade Pró-Memória de
Limeira-SP’.
Determinados
trechos da obra citada anteriormente falam de visitas de membros da
família imperial feitas à cidade paulista de Limeira. Explica-se no texto que,
oficialmente, a história da cidade registra duas idas do Imperador Dom Pedro II
e da Imperatriz Tereza Cristina a Limeira. E que essas visitas oficiais
(formais) teriam ocorrido uma em agosto de 1876, e outra, a mais demorada, em
outubro de 1886, quando, após participarem da Missa da Matriz e recepção
domiciliar por parte de cidadãos ilustres, foram hóspedes na Fazenda Morro
Azul. No entanto, contam os antigos
moradores da cidade, que na informalidade era intenso o intercâmbio de
habitantes daquela região com a nobreza imperial.
O
mais curioso para mim foi a existência de um relato de difícil confirmação
histórica (que se tornou o real motivo de minha pesquisa e se tornou minha
dúvida vespertina) que relatava a história de um príncipe imperial, filhos da
Princesa Isabel e do Conde D’Eu, vivendo Fazenda Morro Azul. Ele se encontrava
longe da corte porque seria considerado deficiente mental.
Diziam
que essa criança exigia intensos cuidados na alimentação, e "quando cismava
em não comer" – explicavam os antigos moradores – “dava um trabalho
danado! Por outro lado, se apreciava um alimento, não havia o que chegasse!
Queria mais e mais! As coxas de galinha constituíam a sua predileção. O peito,
as asas e os demais pedaços eram rejeitados e servidos as outras pessoas".
Princesa Isabel, Conde D’Eu e seus filhos, 1885
|
A
cozinheira da fazenda, certa vez, não tendo o número suficiente de frangos
"no ponto" e prevendo a gritaria do menino, pela falta de sua
apreciada comida, resolveu transformar uma galinha inteira em ‘coxas’. Preparou
a seu modo a receita e o sucesso foi total. O principezinho gostou tanto que as
"coxinhas de galinha" passaram a fazer parte de suas refeições.
A
Imperatriz, quando veio a Limeira quis saber tudo sobre seu neto e ao observar
com que prazer o pequenino saboreava a iguaria, não resistiu e a provou. Gostou
tanto que solicitou que o modo de preparo fosse fornecido ao mestre da cozinha
imperial. Assim, a humilde coxinha de galinha teve seu tempo de nobreza pelo
acesso à corte, e aos altos salões graças a esta receita "provada e
aprovada por especial indicação de Sua Majestade Imperial, a Imperatriz Tereza
Cristina".
D. Teresa em sua velhice, foto de Marc Ferrez, de 1887. |
Odeio
ficar com curiosidade, ela corrói como traças. Primeiro, eu queria descobrir se
procedia a história sobre o príncipe brasileiro e, embora houvesse esse
vestígio de que a coxinha poderia ter sido criada na fazenda de Morro Azul, no
século XIX, algo me dizia para investigar mais. Foi o que fiz...
Por
que construiriam uma fazenda tão requintada para a família imperial em um lugar
onde sequer existia estrada? Essa é uma pergunta sensata que alguém que observa
a localização da fazenda, e que pensa nela naqueles tempos do império, pode se
fazer.
Uma
boa resposta para essa interrogativa seria: os ciclos da agricultura brasileira
levaram muitos a ascensão e queda. Mas não seria esse o caso da fazendo Morro
Azul, construída em homenagem a D. Pedro I, que infelizmente não teve
oportunidade de conhecê-la. Mas que levou seu filho, e segundo imperador do
Brasil, a ir visitar o lugar – que acabou ganhando a alcunha de “fazenda do
Imperador”.
Entrada da Fazenda Morro Azul |
A sede da Fazenda. |
Em
13 de janeiro de 1817, a sesmaria do Morro Azul foi concedida ao Tenente
Joaquim Galvão de França e a Manoel de Barros Ferraz. Compreendia a sesmaria as
fazendas Ibicaba, Morro Azul, Paraguaçu, Paramirim e Laranja Azeda, onde está
Santa Gertrudes (nome em homenagem a Dona Gertrudes, esposa do Brigadeiro
Manuel Rodrigues Jordão, o primeiro proprietário da Morro Azul). A fazenda se
baseava na produção de açúcar, que saía para São Paulo nos lombos de burros e,
de lá, seguia para ser exportado pelo porto de Santos.
Silvério
Rodrigues Jordão, o último dos quatro filhos do primeiro dono, tornou-se o
segundo proprietário, foi quando o café dominou à produção da fazenda desde
1846. A partir de 1868, iniciou-se as obras de construção do solar da fazenda,
que duraria quase nove anos. Em 1877, a obra finalizada fora erguida com
materiais vindos da Europa (mármores, vidros, canos, janelas e batentes) e se
estendia num espaço de 1,5 mil m², tendo sua fachada decorada com azulejos
portugueses e ingleses, onde notadamente se observa a influência dos mouros no
design. É a única fazenda existente em nosso país nesse estilo.
Na
década de 1870 é fundada a Fazenda Quilombo pelo Dr. Ezequiel de Paula Ramos e
sua esposa Anna Jordão, um desmembramento da Morro Azul, fruto da herança
recebida por Anna, filha de Silvério Rodrigues Jordão – este último viria a
falecer pouco tempo depois, em 1882.
Quanto
ao registro de duas visitas do Imperador ao lugar, sabe-se que a primeira
ocorreu em agosto de 1876, quando o casal imperial chegava de uma viagem a Rio
Claro, onde realizaram a inauguração de uma estrada de ferro. A segunda visita,
ocorre em 1886, quando o casal imperial foi recebido nos palacetes do Coronel
Joaquim Antônio Machado de Campos e Sebastião de Barros Silva, em Limeira, e
depois ficaram hospedados no ‘solar dos Jordão’, na fazenda Morro Azul.
Contam
por lá, que uma dessas vezes, o imperador foi para lá para curar-se de uma
suposta malária. E teria sido este o motivo da família ter construído as termas
da fazenda, com piscina coberta e banheira de mármore de Carrara.
A banheira em mármore de Carrara. das Thermas do Imperador. |
A piscina das Thermas do Imperador. |
Além desses, outras visitas ilustres se hospedaram
na fazenda: a própria princesa Isabel e seus filhos (talvez disso tenha surgido
a história), o marechal Cândido Rondon também esteve por lá e, anos mais tarde,
em 1924, Oswald de Andrade se hospedaria no lugar juntamente com seu amigo, o
escritor suíço Blaise Cendrars.
No
ano de 1911, Luiz Bueno de Miranda adquiriu a fazenda que equivalia a 264
alqueires (aproximadamente 6.388.800 metros²), com seu falecimento em 1949,
ficou aos cuidados de sua esposa, Dona Laura Sá Leite Bueno de Miranda. O falecimento
de dona Laura, que sem filhos, fez com que o patrimônio fosse herdado por cinco
sobrinhos, em 1976, comandados pelo Dr. Carlos Celso Orcesi da Costa,
responsável pela restauração do patrimônio. Atualmente conhecida como “Fazenda
de D. Pedro”, a Morro Azul integra o roteiro turístico de fazendas históricas
daquela região, junto com Ibicaba, Santa Gertrudes, Quilombo e Citra.
A
sede da fazenda é um verdadeiro palacete, lembra algumas construções europeias
que misturam elementos de diferentes estilos (como neoclássico e a arquitetura
moura), apresenta jardins simétricos e decoração com azulejos.
Outro
marco do lugar é a alameda de entrada composta por 11 palmeira imperiais, para
representar que a família imperial esteve presente na propriedade. Essas palmeiras foram trazidas da Ásia, eram
elementos caríssimos àqueles tempos, e o imperador costumava presentear seus
anfitriões com 11 mudas deste tipo planta, para que a população soubesse por
onde ele havia passado.
Assim
se compreende melhor o contexto do aparecimento da Morro Azul nessa história.
Mas continua-se com a busca pela origem a coxinha.
Sabe-se
que, na obra Cozinheiro moderno ou nova arte de cozinha, de 1780, do francês
Lucas Rigaud, cozinheiro da trisavó da princesa Isabel, D. Maria I, já havia
publicado uma receita de “coxas de frangas ou galinhas novas” empanadas e
fritas.
O
celebre Antonin Carême entraria nesse contexto quando se observa a existência
de uma receita de 1844, presento no livro L’Art de la cuisine française au
XIXème Siècle, onde ele apresenta seu croquette de poulet (croquete de frango)
que deveria ser moldado na forma de uma pera – versão mais semelhante a versão
da coxinha que conhecemos.
Há
quem diga, no entanto, que a origem da coxinha continua sendo no século XIX,
mas que ela teria surgido na região da Grande São Paulo. O estopim seria a
década de 20, quando São Paulo se industrializava e, tanto a capital como as
cidades circunvizinhas, abrigavam grandes fábricas com inúmeros trabalhadores
que precisavam se alimentar e gastar pouco com isso. E era bastante comum que a
necessidade dos trabalhadores acabasse gerando um comércio, e fez surgir
comércio de ambulantes e barracas de comida que se estabeleciam nas portas das
fábricas na hora de almoço, para vender coxas e sobrecoxas de frango fritas.
Com isso, alguém teve a ideia de juntar uma massa como frango desfiado e temperado,
dar o formato de coxa, fritas e vender nas portas das fábricas.
De
São Paulo, a receita se espalharia para o restante do Brasil, já sendo um
produto popular no Paraná e no Rio de janeiro de 1950. E na década de 1970, em
Belo Horizonte, o requeijão cremoso (catupiry) foi adicionado ao tradicional
recheio de frango, para incrementar o salgado.
Outro
fato que precisa ser mencionado (isso, de acordo com os livros de história), é
que os filhos da princesa Isabel viveram com ela, no Rio de Janeiro, até a
queda da Monarquia (em 1889 ) – o que
coloca a história que deu origem a esta postagem como uma espécie de
lenda urbana (ou rural, neste caso).
Mesmo
depois de saber disso tudo, confesso que ainda tenho umas pulgas atrás da
orelha como essa história. Talvez, anos mais tarde eu terei mais argumentos
para retomar este causo. Até lá, deixo a receita retirava do livro que originou
toda essa discussão. Aproveitem.
Aqui vai a receita original da coxinha tirada do livro.
Ótima história, quem diria que coxinha seria da realeza.
ResponderExcluiradorei saber a história da coxinha ser...imperial!! adoro saber a história por detrás de pratos famosos!! aqi é fantastico e mt mt bem documentado!! Sr Barão da gourmandise faz jus ao seu nome!! muito obrigada!!
ResponderExcluirPor mais pitoresca que seja a história do desconhecido príncipe imperial, tudo não passa de mais uma mitomania disseminada pelo movimento monarquista (fakenews). A Princesa Isabel teve três filhos homens, todos sãos, e moradores do Rio e Petrópolis até o exílio. Não existe um quarto filho com transtornos. Adoro o seu blog. Parabéns.
ResponderExcluirTem um ljvro da Mary del Priore sobre o "Príncipe Maldito" : https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/almanaque/historia-pedro-augusto-o-neto-de-dom-pedro-ii-que-viveu-41-anos-em-manicomio.phtml
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