Carregando uma cor dourada
(Caramelizado) no topo, com um recheio extremamente cremoso no centro, servida
sem geleias nem enfeites, apresentada no balcão com nada mais do que um garfo,
a torta de queijo do restaurante La Viña em San Sebastián, Espanha, conseguiu o
feito de conquistar muitos paladares pelo mundo e tornar essa preparação do
País Basco como a mais popular pelos amantes de gastronomia que amam sobremesas
com queijo por odo o planeta.
Além disso, ela encontrou
uma nova vida em lugares tão distantes quanto Cingapura, onde reencarnado como
um sorvete soft-serve, ao ponto de figurara e nas páginas do New York Times
como um "Sabor do Ano", em 2021 — tudo isso enquanto ainda continua a
ser servida em fatias no restaurante familiar onde foi criada.
Fazendo minhas leituras para
criar este post, entre livros e sites, foi notável a variação de receitas e
formas que uma torta de queijo basca poderia ter (e, talvez, ser considerada
uma aberração por um habitante basco): umas, ostentando casca de massa de
biscoito; outras queimadas em excesso; umas tantas assados em forma de coração
ou flor; uma que foi aromatizada como ube roxo (um inhame roxo, cujo nome
cientifico é Dioscorea alata, bastante popular no Japão, com seu gosto de nozes e textura levemente terrosa
e adocicada; que, inclusive foi o sabor do ano de 2024); outras ainda aparecem
servidos com creme de speculoos (um biscoito de especiarias tipicamente
holandês, já tratei sobre ele no blog,
ver AQUI) e, por aí vai...parei de procurar quando já achei que as
deformidades da torta estavam fugindo do controle criativo.
Ocorre que, hoje é
comemorado o dia de São Sebastião que, por sinal é o padroeiro da vila de San
Sebastián-Donostia, no País Basco, onde fica localizado o restaurante que
inventou essa maravilha gastronômica. E as curiosidades já começam pelo nome da
cidade, já que San Sebastián tem diversas denominações:
San Sebastián – É o nome
oficial em espanhol. Sua origem remonta a um mosteiro consagrado em San
Sebastián (mosteiro de San Sebastián, El Antiguo,), que se encontrava na atual
localização do palácio de Miramar, próximo ao bairro de El Antiguo. A villa medieval
foi fundada pelo rei Navarro Sancho el Sabio hacia 1180 nas cercanias do
mosteiro e está estabelecida na carta-puebla que a villa se chama pelo San
Sebastián. Como o documento foi redigido em latim, o nome que aparece
mencionado é o de Sanctus Sebastianus, que evoluiu no romance até dar o nome de
San Sebastián. San Sebastián foi o nome oficial da cidade até 1980. É o nome
mais conhecido internacionalmente e do qual derivam as denominações da cidade
em outros idiomas. Assim, a denominação habitual em francês é Saint-Sébastien e
em inglês Saint Sebastian, sem acento na a e pronunciada acentuando as sílabas.
O nome em espanhol é abreviado com Sn. Sn., S. S. (formas corretas), Sn.Sn.,
S.S., SnSn o SS (SS era a sigla que apareceu nas Matrículas automovilísticas de
España registradas na província de Guipúzcoa até que o sistema mudou em 2000).
Donostia – É o nome oficial
em Euskera, a língua baasca. Segundo a teoria mais aceita, é uma forma derivada
da denominação eusquérica antiga do santo padroeiro, Done (< lat. Domine)
Sebastiáne, do mesmo modo que surgia as formas vascas Donibane (San Juan),
Doneztebe (Santesteban) ou Donejakue (Santiago ), e a forma atual foi perdida
através dos próximos passos, tal como explica o linguista Koldo Mitxelena, em
seu livro Apellidos vascos de 1953: «... el nombre vasco de San Sebastián, cuja
evolução aproximada habrá sido Donasa(b)astiai, Donasastia, Donastia, Donostia»
( 2ª edição, 1955, p. 96). Não há que esquecer que em euskera se usa Donosti
para duas outras referências a esse santo: a ermita de San Sebastián (em
euskera Jaun Donosti) em Orendáin, e outra meio destruída de mesmo nome, em
Arano. Outra teoria deriva do termo em latim: Domine (San) Ostium («Ostia»,
«porto». O que é o mesmo, «señor del puerto», em alusão a Sebastián Mártir). De
qualquer forma, você tem referências escritas a esse nome em euskara em uma
canção do final do século XV («juntadu ditu laster / Donostiako irian»,
«Donostiako murruan / islaren goienean»), ou em poemas do século XVI (da mão do
alava Juan Pérez de Lazarraga: "Donostiako San Frantziskuan / hagoan gizon
soldadua (Eu sou um soldado)”. Donostia não era um nome oficial até 1980,
embora derive do gentílico dos habitantes da cidade, "donostiarras",
tanto em castelhano como em vasco.
Donostia-San Sebastián -
nome oficial entre 1980 e 2012. Devido à sua falta de raízes sociais e à
confusão que este nome composto criou, o conselho municipal pleno, por proposta
do governo municipal, decidiu por unanimidade adotar o nome oficial bilíngue.
nome, Donostia / San Sebastián, a fim de formalizar o uso exclusivo de Donostia
nas comunicações em basco e San Sebastián para as comunicações em espanhol.
La Bella Easo ou,
simplimente, Easo – esse nome que surgiu da crença de séculos passados de que a
antiga cidade romana de Oiasso ou Easo estava localizada no local da moderna
San Sebastián. O genitivo "easonense", usado como uma variante culta de
Donostiarra, e atualmente em desuso, derivou dessa crença. Descobertas
arqueológicas recentes confirmam que a antiga Oiasso estava localizado em Irún
e não em San Sebastián. Como legado do nome Easo, o código IATA para o
Aeroporto de San Sebastián é EAS.
Irutxulo ou Hirutxulo – que
significa "três buracos" em vasco, é o nome que os pescadores deram a
San Sebastián, já que do mar a cidade parecia três entradas ou brechas: a que
se formava entre o monte Igueldo e a ilha de Santa Clara, a que é localizada
entre Santa Clara e o Monte Urgull e a localizada entre Urgull e o Monte Ulía.
Sã – essa é a forma
coloquial e afetuosa que deriva de San Sebastián, também muito utilizada pelos
moradores de San Sebastián de los Reyes, na Comunidade de Madri.
Dito isso, agora vamos ao
que interessa: celebrar esse Dia de São Sebastião com uma sobremesa digna e
deliciosa. E ela se originou no restaurante La Viña, que abriu suas portas
naquela cidade em 1959, fundado por Eladio Rivera, seu irmão Antonio e suas esposas,
Carmen Jiménez e Conchi Hernáez. O filho de Eladio, Santi, começou a trabalhar
no bar desde pequeno. Um cozinheiro apaixonado e autodidata, ele foi estimulado
pelos conselhos de seus amigos chefs e por cursos ocasionais de culinária.
A torta de queijo não era um
prato tradicional basco (aliás, já tratei sobre a origem da cheesecake AQUI),
mas isso foi no final dos anos 1980 e Santi estava cheio de ideias de cursos
que ele frequentou mais longe, em lugares como Paris. O cream cheese e outros
itens alimentícios "modernos" estavam chegando à Espanha pela
primeira vez, quando o país se abriu para a economia global, e Santi adorava
experimentar.
A torta de queijo foi
servida por anos, mas foi somente quando a chefado do Turismo Gastronômico pela
região que ela alavancou. Graças a tendência das tours de pintxos - para
aqueles que não são formados em turismo nem adeptos do turismo gastronômico, a
Academia Real Espanhola define pintxo como uma “porção de comida consumida como
aperitivo, que às vezes é perfurada com um palito de dente”. Mas, na pratica,
além de os pintxos significarem petiscos montados, nos quais um “palito”
(chamado pincho) é usado para prender um ou mais ingredientes a uma pequena
fatia de pão, daí o termo pinchar. Existe também as banderillas, um tipo de
pintxo onde os ingredientes são fixados em um palito de dente sem a fatia de
pão, normalmente feito com picles, peixe e azeitonas.
Atualmente, o pintxo é
encontrado em toda a Espanha, mas é ao norte que ele representa um pilar
essencial da cultura gastronômica local. Além do País Basco, que inclui San
Sebastián e Bilbao, as regiões de Navarra, Cantábria e La Rioja também são
famosas pela cultura e qualidade dos pintxos.
Cuidado para não confundir
os pinchos espanhóis (pintxos) com pinchos da América Latina, muito populares
em países como Porto Rico e Venezuela. A versão latina é mais parecida com os
pinchitos, que são espetos de carne grelhada também tradicional na Andaluzia.
Assim, com a decolada das
tours de pintxo ganhando visibilidade e decolando nos anos 2000, os turistas
estrangeiros em massa começaram a descobrir o a torta de queijo do La Viña, que
dispõe até hoje nas prateleiras do bar, inúmeras formas de fundo falso, com
papel manteiga chamuscado saindo do topo. A fama foi tanta que conquistou
inúmeras postagens no Instagram e Tripadvisor, o que promoveu ainda mais a fama
da delicia fazendo com que Santi compartilhasse a sua receita online — não há
segredos comerciais aqui.
E a premissa para essa
atitude dele foi louvável: “Os chefs bascos elaboraram os estatutos da Cozinha
Basca, e um deles era que a culinária deveria ser transmitida ao público em
geral para que todos pudessem desfrutar”, diz ele. “Eu vivo por esse estatuto.
Sempre há 15% que não podem ser ensinados — não porque você não queira, mas
porque está nas mãos da pessoa que faz a sobremesa.”
A receita, pode-se dizer, é
uma adaptação do cheesecake tradicional. Mas, com uma cremosidade espetacular,
uma cor dourada intensa e, na composição não vai nada mais do que cream cheese,
ovos, creme, açúcar e um pouco de farinha. O que torna esta sobremesa única
são, na verdade, seus ingredientes "ausentes" e a técnica
"incorreta".
Enquanto um cheesecake
assado normalmente envolve cozinhar o delicado creme de queijo com ovos em um
fogo relativamente baixo, esta torta recebe um tratamento um pouco mais áspero
— ela é cozida em uma temperatura tecnicamente muito alta, o que significa que
as partes do bolo em contato com a forma douram em uma crosta natural, enquanto
o topo queima em alguns lugares e o interior permanece mole e solto.
Outra diferença é que
acompanhamentos como sorvete, caldas e coulis de frutas vermelhas estavam fora
de questão devido às restrições de espaço na cozinha do La Viña. A base de
biscoito? Não, sem isso, por favor. Essas questões são explicadas com o
conhecimento ao longo do tempo.
Santi, revelou, que quando
ele assumiu o La Viña em 1997, um chef veio do Ritz-Carlton em Paris, e lhes
disse: "Este bolo precisa ser mantido fora da geladeira porque a geladeira
o torna mais denso". Ele acusa que não prestou muita atenção naquela
fala[risos]. Mas então, com o passar do tempo, percebeu que a dica do chef
francês estava certa. Então, foi quando Santi parou de guardar a tarta de queso
na geladeira e passou a coloca-la ao lado da máquina de café. As pessoas locais
e os turistas começaram a vê-la ali, perto dos pintxos e do vinho. E foi aí que
ele realmente começou a vender. Começamos a fazer duass de cada vez, depois
quatro de cada vez, e assim por diante.
O fato daquela cidade ser um
destino turístico popular e uma potência culinária, ajudou nesse processo de
tornar a tarta de queso do La Viña popular. Além disso, por lá, eles passaram a
apresentar as sobremesas como continuação do pintxo. Isso influenciou o
conceito.
Outro detalhe que Santi
enfatiza é que, por lá eles não deixam a torta queimar, imagem que é muito
comum de ser vista por aí. Ele acredita que o queimado traz um amargor para a
receita que não o agrada. Mas, claro, todos podem fazer o que quiserem quando
preparam a sua.
Agora, o gran finale, a
receita da tarta de queso perfeita pra você comer até esborrachar (desculpem,
os termos, mas é isso que acontece comigo!). vocês verão que é fácil, e a
qualidade dos ingredientes é o que garantirá um doce excelente.
Tata de queso basca do la
Viña
1 kg de cream cheese (eu gosto do resultado com o San Millán ou o Philadelphia. Mas com um pouco do Cabrales misturado com cream cheese fica ótimo) )
7 ovos
400g de açúcar
1 colherada de farinha de
trigo
200 ml de nata (ou creme de
leite fresco)
Preparo: Pré-aqueça o forno a 200ºC e forre uma
assadeira de 25 centímetros de diâmetro, primeiro com uma folha de papel
alumínio, e por cima dela coloque uma folha de papel manteiga, ajeite tudo
muito bem na forma. Na batedeira, bata o cream cheese até ficar cremoso (tudo
isso pode ser feito na mão, mas vai demorar um pouquinho mais). Coloque a
batedeira em velocidade mínima e adicione aos poucos o creme de leite até que a
mistura fique homogênea. Repita o mesmo procedimento com o açúcar. Adicione os
ovos um a um, integrando bem cada unidade à massa. Por fim, coloque a colher de
sopa de farinha de trigo e misture. Asse por cerca de 55 minutos. Se após 40
minutos a torta estiver dourada o suficiente, cubra a assadeira com papel
alumínio para que termine de assar sem queimar. Retire do forno e deixe esfriar
fora da geladeira pelo menos duas horas antes de servir.
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