quinta-feira, 24 de julho de 2025

SOBRE O MORANGO DO AMOR (e a elegância de não estar em todo banquete)

 

Perguntaram-me — com voz entre irônica e doce — se eu não ia falar, no blog, sobre o morango do amor. A pergunta vinha com o cheiro de feira e de festa, com aquela aura de expectativa que se tem diante de algo que todos estão comentando, fotografando, querendo. Como se meu silêncio soasse... fora de moda.



Mas, veja: há momentos em que não é desdém, mas delicadeza não participar do coro.

Vivemos sob o feitiço do que chamam hoje de FOMO — Fear of Missing Out — esse medo bem moderno de estar ausente do que todos parecem celebrar. De não provar o doce da hora, de não entrar na fila, de não postar, de não ter uma opinião a tempo. Mas a maturidade — ou o paladar bem treinado — ensina que nem toda ausência é perda. Às vezes, é escolha.

Porque eu já conheci o encantamento da fruta envolta em cristal. Já me emocionei diante da beleza inútil de um morango envolto em açúcar caramelizado...

Antonin Carême, o arquiteto da pâtisserie imperial, já fazia disso um espetáculo. No início do século XIX, ele montava verdadeiras catedrais com frutas glaceadas, moldadas com disciplina de engenheiro e fantasia de poeta. À mesa de Talleyrand ou nos salões de Viena, o morango era mais que fruta: era enfeite, metáfora, adorno comestível. Mas também era artifício. Ilusão. Gula camuflada de glória.

No outro lado do mundo, uma outra interpretação do desejo cristalizado: o Ichigo Ame, vendido em espetinhos nas ruelas de Tóquio durante os festivais de primavera. Surgido nos anos 1980, como uma adaptação moderna do Ringo Ame (a maçã do amor japonesa, feita desde o pós-guerra), o doce de morango ganhou espaço como símbolo de efemeridade — e elegância. Nele, a fruta é mantida intacta, ainda orvalhada, e só se cobre com uma fina película de caramelo duro, transparente como laca. Nada de recheios ou artifícios sentimentais. Só fruta e técnica. O prazer ali vem do contraste: o estalo vítreo que cede ao toque dos dentes, a doçura sutil que abre caminho ao frescor ácido do morango. É um amor que não se explica — apenas se quebra e se dissolve. Um amor silencioso, como tantos que vivem bem por não dizer demais.

O morango do amor que se vê inundando nas Telas das redes sociais vem com uma camada adicional, espessa e familiar: um brigadeiro branco feito de leite condensado — essa invenção absolutamente brasileira, doce de urgência e consolo, que jamais esteve nas vitrines da França napoleônica nem nos banquetes de Carême. Mas está, sim, em quase toda mesa nacional onde há desejo de agradar — porque o leite condensado, no Brasil, é um gesto de afeto. Esse recheio transforma a fruta em algo mais: uma bomba de doçura previsível, certeira, desenhada para paladares que aprenderam a associar carinho ao açúcar em excesso. E não há mal nisso — há estratégia, há código cultural. É o doce que não falha, que beija a boca antes que ela pense. Mas talvez por isso mesmo, já não me surpreende. Porque o que consola, muitas vezes, já vem domesticado.

Hoje, ao ver essas versões — banhadas em açúcar duro e anunciadas como revelações sentimentais — não me comove mais o brilho. Não por arrogância. Mas por já ter provado antes da moda...

Eu respeito o gesto. Sei que há ternura em oferecer um morango banhado em caramelo. Mas também sei o peso que existe em se esperar que todos se emocionem por ele. E às vezes, o mais amoroso dos gestos é não morder. É deixar que o outro brilhe, enquanto se busca sabores mais quietos.

Talvez por isso eu prefira agora um Sauvignon Blanc com jalapeño. Uma bebida que arde em silêncio. Que não grita por atenção, mas recompensa quem se arrisca. Uma mistura que não promete amor em palito, mas entrega algo mais raro: a surpresa depois do cansaço.

E se isso me faz parecer fora da moda, fico em paz. Há elegância também em não estar em todo banquete.

Morango do amor

Brigadeiro branco

1 leite condensado ou 395 gramas

1 creme de leite ou 200 gramas

4 colheres de sopa de leite em pó

1 colher de sopa de manteiga

10 morangos grande ou 500 gramas

Calda

2 xícaras de açúcar refinado ou 400 gramas

Meia xícara de água ou 120 mililitros

1 colher de sopa de vinagre ou 15 mililitros

150 gramas de xarope de glucose ou 15 mililitros

1 colher de sopa de corante em gel vermelho

Palitos de churrasco pra facilitar o banho dos morangos

Preparo: Em uma panela fora do fogo, misture bem o leite condensado, a caixinha de creme de leite, o leite em pó, a manteiga. Depois leve ao fogo médio, mexendo sem parar por mais ou menos 20 minutos ou até ficar em ponto de brigadeiro firme e soltando do fundo da panela. Apague o fogo, transfira o brigadeiro para um prato untado, cubra com um plástico e deixe esfriar na geladeira. Lave bem 10 morangos, seque muito bem, retire delicadamente os cabinhos e reserve (os morangos secos e os cabos separadamente). Pegue porções de 50 gramas do brigadeiro já frio, abra na palma das mãos untadas, coloque o morango no meio do brigadeiro e modele cobrindo todo o morango. Espete 1 palito de churrasco em cada morango e reserve. Coloque em uma panela fora do fogo o açúcar, a água, o vinagre, o xarope de glucose de milho branca, o corante em gel vermelho e misture bem. Leve ao fogo baixo por mais ou menos 15 minutos sem mexer até atingir a temperatura de 145 graus Célsius (ou faça o teste pingando 1 colher da calda quente em uma tigela com água fria e se a calda endurecer rapidamente, a calda está na temperatura certa). Apague o fogo e mergulhe cada espeto de morango na panela com a calda vermelha, deixe escorrer para tirar o excesso de calda e coloque em uma assadeira forrada com papel manteiga até endurecer por mais ou menos um minuto. Sirva em seguida.

 

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