Um conclave está sempre
envolto em mistérios e tramas. Muita informação é produzida dentro dos muros
vaticanos antes, durante e depois da eleição do novo Papa. E, obviamente, o
campo gastronômico não fica de fora dessa questão.
O conclave que elegerá o
267º Papa começou oficialmente: após a Missa pro eligendo Romano Pontifice na
Basílica de São Pedro pela manhã (com a presença de mais de 5.000 pessoas), no
dia 7 de maio, às 16h30, os 133 cardeais eleitores se reuniram na Capela
Sistina.
E tudo começa com uma
liturgia centenária: como sempre, o conclave acontece no dia seguinte à
anulação do anel do Pescador e do selo papal, e abre com o "Extra
Omnes" (desta vez pronunciado por Monsenhor Diego Giovanni Ravelli, Mestre
das Celebrações Litúrgicas Pontifícias). Então os cardeais começam a votar e
uma primeira fumaça — provavelmente preta — é esperada já no primeiro dia. Só
os sinais de fumaça nos darão uma ideia do que acontecerá na Capela Sistina: o
conclave é secreto. A própria palavra já diz: vem do latim,"com
chaves", serve para indicar que os cardeais ficarão num "quarto
trancado", neste caso, a belíssima Capela Sistina. O termo conclave foi
usado pela primeira vez pelo Papa Honório III.
Especialmente pelo sigilo
que envolve o evento, sabe-se muito pouco sobre o que acontece no conclave, mas
há algumas curiosidades gastronômicas e enológicas que podem ao menos nos dar
uma ideia do que ocorre nos bastidores do encontro mais secreto do mundo.
O que os cardeais comem
no conclave?
A dieta dos cardeais no
conclave segue um padrão muito preciso: um café da manhã leve, geralmente com
pão e geleia, um almoço completo - com primeiros pratos como risoto e macarrão,
carne branca, peixe, vegetais e frutas - e um jantar frugal. Sobremesa só é
permitida aos domingos e geralmente é um bolo comum ou outra preparação
simples, como pudim. Em suma, uma alimentação saudável e equilibrada, com as
devidas limitações para os alérgicos e os (muitos) cardeais que sofrem de
diabetes, pressão alta ou outras doenças típicas dos idosos.
Quem "criou" o
menu do conclave?
Esse esquema remonta a 1300,
quando Clemente VI deu regras muito precisas também sobre as refeições dos
cardeais eleitores: três pratos, dos quais um era sopa, carne, peixe ou ovos e,
finalmente, queijo ou fruta.
Que Papa colocou os
cardeais do conclave em restrição alimentar para que o resultado do conclave
saísse logo?
As regras de Clemente VI
tornaram-se necessárias após as restrições impostas por Gregório X, eleito após
o mais longo conclave da história (três anos inteiros). Para tornar a estadia
dos cardeais menos agradável, ele pensou em obrigá-los a comer pão e água se
não elegessem um novo papa em 8 dias.
Como que é a massa
servida no conclave?
A pasta del conclave é mais
uma lenda do que uma receita, que pode remontar às restrições impostas por
Gregório X: uma massa simples, com manteiga e parmesão. Simboliza a sobriedade
à qual os cardeais estão vinculados e a arte de se virar numa situação como a
do claustro, em que é preciso cozinhar com poucos ingredientes disponíveis.
Qual foi o conclave mais
saboroso?
O conclave em que Júlio III
foi eleito, de novembro de 1549 a fevereiro de 1450, também é famoso por ter
sido decididamente gourmet. Na época, o cozinheiro era Bartolomeo Scappi, o
chef mais famoso do Renascimento (e sem dúvida o primeiro chef mais famoso do
mundo), serviu aos Papas Pio IV e Pio V. Seu livro de 1570, Opera dell’Arte del
Cucinare – o primeiro livro de receitas publicado por um chef profissional – o
catapultou para a fama. Em seu livro, ele conta que os pratos preparados na
cozinha para os cardeais eram rigorosamente verificados pelos guardas antes de
serem colocados em uma espécie de roda giratória, com uma ordem estabelecida
por sorteio. Pelo mesmo motivo, pratos que pudessem conter uma mensagem
secreta, como bolos e frangos inteiros ou raviólis recheados, eram proibidos.
Até o vinho e a água tinham que ser servidos em copos transparentes (como
acontece até hoje). Portanto, parece que o ditado “confiar é bom, não confiar é
melhor” era tão verdadeiro naquela época quanto é agora. Em seu livro, Scappi
fala sobre refeições elaboradas e fartas, mesmo que sempre extremamente
"supervisionadas".
Quem cozinha para os
cardeais do Conclave?
Os cardeais eleitores sempre
comerão em Santa Marta (Domus Sanctae Marthae), a residência do Papa Francisco,
que agora hospeda a maioria dos cardeais do conclave. A preparação das
refeições é supervisionada pelas Filhas da Caridade de São Vicente de Paulo,
que foram chamadas para administrar a Domus Sanctae Marthae, a moderna
residência hoteleira onde a maioria dos 133 cardeais (não todos, pois há 105
suítes e 26 quartos individuais) viverão durante o conclave. Elas terão auxílio
de pessoal especializado.
Porque não é possível
saber exatamente quem cozinha para os cardeais?
Nada mais se sabe sobre os
detalhes dos menus diários ou sobre o chef - se houver algum famoso (embora
duvide, depois dos ensinamentos de Francesco) - que ficará encarregado de
cozinhar diariamente. Assim como os cardeais, os funcionários de restaurantes
também devem fazer um juramento de sigilo. Afinal, as refeições estão entre os
momentos mais delicados de um conclave.
Por que as refeições dos
cardeais eleitores do conclave devem ser silenciosas (e supervisionadas)?
Afinal, as refeições estão
entre os poucos momentos que os cardeais eleitores podem passar juntos fora da
Capela Sistina e, portanto, são potencialmente os mais arriscados, já que, ao
falarem entre si, podem violar seu juramento de sigilo ao planejar estratégias
de votação. Por esse motivo, as refeições são servidas em silêncio e o
refeitório é um dos locais mais vigiados. Scappi, por exemplo, também conta em
seu livro que, antes de serem colocados na cornuta (a cesta onde era colocado o
almoço de cada cardeal), todos os pratos eram verificados para garantir que não
continham mensagens ocultas. Além disso, durante séculos, até copos e
guardanapos foram verificados pelo mesmo motivo.
Vinho no conclave: quais
são as regras?
Os cardeais podem tomar um pouco de vinho, mas bebidas destiladas são excluídas. Uma regra que algumas pessoas aparentemente violaram no passado ao carregá-los na mala. Parece que os cardeais gostam muito de conhaque, e que alguns até o beberam na companhia do papa eleito.
Assim, por mais de 750 anos,
regras rígidas protegeram o que os cardeais podiam ou não comer, para evitar
mensagens ocultas não apenas na comida, mas também nos guardanapos (uma espécie
de pizzini ante litteram). Embora a comida historicamente sempre tenha
representado um risco potencial, comer na cantina continua sendo um dos
contextos em que as negociações entre cardeais podem ocorrer.
Basta pensar no filme
lançado em 2024, Conclave, onde quase todos os diálogos não acontecem nas salas
eleitorais, mas sim no refeitório. As refeições barulhentas contrastam com o
conclave em si, que é quase completamente silencioso. No entanto, mesmo em torno
do silêncio cerimonial, ocorre muita comunicação, grande parte da qual ocorre
com e por meio da comida.
Mas o filme tem licença
poética criativa e, mesmo, que se possa presumir que o ele não represente com
precisão o que acontece a portas fechadas, é indubitavelmente verdade que na
cultura gastronômica papal — assim como na cultura em geral — o que você come,
como você come e com quem você come diz muito.
O código de sigilo do
conclave remonta a 1274, quando o Papa Gregório X estabeleceu as regras que
ainda hoje, em parte, ditam como as eleições papais são conduzidas. Além do
protocolo rigoroso e das restrições alimentares, as refeições que o “chef”
Scappi descreve mais tarde em seu livro parecem substanciosas e equilibradas, e
incluem salada, frutas, frios, vinho e água fresca. Da mesma forma, Scappi
também fala sobre as acomodações confortáveis para os cardeais. Cada um tinha
sua própria cela grande, decorada com seda e mobiliada com bom gosto, com uma
cama, uma mesa, um cabideiro, dois bancos, um penico e um jarro trancado, entre
outros itens. Segundo Scappi, servir em um conclave papal renascentista não era
um trabalho desagradável, desde que não se preocupasse com a vigilância
constante, que instilava certo medo.
As regras do falecido Papa
Gregório X incluíam o isolamento do conclave — uma regra ainda em vigor hoje —
e o racionamento de comida para os cardeais. Após três dias sem consentimento,
os cardeais recebiam apenas uma refeição por dia; depois de oito dias, apenas
pão e água. Ou seja: mexa-se.
Em meados de 1300, essas
regras foram relaxadas por Clemente VI, que permitiu refeições de três pratos
consistindo de sopa; um prato principal à base de peixe, carne ou ovos; e uma
sobremesa, que pode incluir queijo ou fruta. Embora o racionamento não tenha
durado, ainda há um controle rigoroso sobre os conclaves hoje, tanto à mesa
quanto em espaços compartilhados dentro dos muros do Vaticano.
Voltando aos dias de hoje, a
comida dos cardeais, como previsto, continuará frugal e preparada de acordo com
um protocolo rigoroso e sob supervisão rigorosa. A Igreja Católica moderna –
especialmente sob a liderança do Papa Francisco – espera comunicar uma imagem
simples e genuína. As preocupações de que alimentos (frangos inteiros, em
particular, como os servidos no filme Conclave) pudessem conter mensagens
secretas reais desapareceram. Mas, enquanto o Vaticano está sendo revistado em
busca de dispositivos eletrônicos escondidos em preparação para o próximo
conclave — algo que se tornou impossível devido ao desligamento de repetidores
em toda a área — os cardeais se prepararão pessoalmente para se aventurar por
Roma após as eleições, antes de retornar às suas respectivas dioceses, talvez
parando em uma das tavernas da cidade e, quem sabe, se perguntando se esta será
sua última ceia após a eleição do novo Papa.
A suposta receita da “pasta
del Conclave” é tão nobre quanto básica, dados seus apenas três ingredientes:
massa longa ou curta — não há especificação sobre o formato — para ser cozida e
depois mexida em uma panela com um pouco de manteiga e uma generosa pitada de
parmesão. Longe das liturgias, não faltam versões mais saborosas, facilmente
replicáveis, que incluem a adição de pimenta-do-reino moída na hora ou
revisitadas com pecorino em vez de parmesão.
O certo é dizer que nas
origens do prato reina a incerteza: A receita não parece estar de forma alguma
formalmente ligada à liturgia do Conclave. Mas, por outro lado, nem mesmo a
dieta em si, à qual os cardeais terão de aderir, é regulamentada. Não há dúvida
de que se trata de uma receita pobre, cuja simplicidade de ingredientes e de
preparo contrasta com pratos mais elaborados e deliciosos, longe da sobriedade.
Também se pode levantar a hipótese de que este nome lhe foi dado em referência
a um prato de "regime de clausura". Nasce de poucos e pobres
ingredientes, tal como quando nos encontramos confinados à força e sem uma
despensa bem abastecida para nos servirmos.
No entanto, parece haver
alguma hipótese histórica que justificaria a ligação entre a receita e o
claustro cardinalício. O prato pode ter se consolidado na tradição no final do
século XIII, com a instituição do próprio Conclave — em 1274 — a mando do Papa
Gregório X. Eleito após quase três anos de consultas, o pontífice — na
constituição apostólica Ubi Periculum — ditou regras rígidas para acelerar o
processo eleitoral, usando a comida como ferramenta de pressão. Em particular,
o racionamento progressivo das refeições a serem servidas aos cardeais: de três
por dia para apenas uma, se o escrutínio durasse mais de três dias, até apenas
água, pão e vinho se o conclave durasse mais de oito dias. Mesmo em caso de
desacordo, teria sido a fome que teria levado os cardeais a um acordo sobre o
nome do pontífice em pouco tempo. E nesse sentido, após três dias de análise, a
substancial "massa do Conclave" teria sido o compromisso certo para
servir como única refeição do dia. Mas o segredo que cerca a eleição do
pontífice é o mesmo que cerca os livros de receitas do Vaticano.
As Filhas da Caridade de São
Vicente de Paulo preparam refeições a serem servidas aos cardeais durante o
período de clausura, de acordo com rigorosos ditames. Um cardápio marcado pela
sobriedade e leveza para não forçar a digestão dos cardeais, mas acima de tudo
uma alimentação nutritiva para auxiliar a concentração. Receitas inspiradas na
tradição gastronômica italiana, propostas em sua versão mais leve. Cereais,
carnes brancas, peixes, vegetais e frutas da estação. Tudo preparado dentro do
Vaticano, para evitar contaminação.
Qualquer dispositivo
eletrônico é proibido, nem mesmo bolos em camadas ou bolo de carne serão
servidos aos cardeais: nada que possa conter mensagens secretas em seu
interior, sob pena de excomunhão. Uma questão de comida e religião: dois cultos
que se entrelaçam e que, no caso da "pasta del Conclave", deram vida
a uma tradição romantizada. Mistérios que não excluem, contudo, a possibilidade
de que o prato, simbolicamente branco, possa ser o último prato servido às
mesas antes do aguardado "Habemus papam".
Logo, a Pasta del Conclave é
muito mais que um simples prato de massa in bianco: é uma história, um símbolo
de sobriedade e decisão, um sabor que vem de séculos distantes para nos lembrar
como, às vezes, até a simplicidade pode ter um peso decisivo. A Receita de
Pasta del Conclave é uma preparação essencial, feita apenas com massa, manteiga
e parmesão, mas que traz consigo o sabor do tempo e a disciplina da escolha.
Não é apenas uma questão de gosto, mas de memória. Esta massa leva o nome de um episódio histórico emblemático.
Pasta del Conclave
(Ingredientes para 4 pessoas)
360g de massa a sua escolha.
100 g de manteiga
perguntas de Parmigiano Reggiano
(Se você quiser incrementar, pode
colocar um pouco de pimenta do reino moída na hora)
Preparo: cozinhe a massa em bastante
água quente com sal e, quando estiver cozida, escorra-a e coloque-a em uma
tigela com a manteiga. Misture bem, adicione o Parmigiano Reggiano, um pouco da
água do cozimento do macarrão ainda quente e misture bem. Depois de obter uma
massa cremosa, coloque-a em um prato, polvilhe com pouco de parmesão – e se você
quiser burlar a regra, coloque um pouco de pimenta-do-reino moída, e sua Pasta
del Conclave estará pronta.