quinta-feira, 28 de junho de 2012

Até Einstein comia vatapá...


Ponto de Baiano

Ó SALVE OS SANTOS DA BAHIA
Ó SALVE A MESA DE XANGÔ!
JUNTO COM SEU PATUÁ
NÃO HÁ MESA NA BAHIA
QUE NÃO TENHA VATAPÁ!
NÃO HÁ SANTO BEM SEGURO
QUE NÃO TENHA PATUÁ!


Quando eu comi vatapá pela primeira vez? Não sei precisar a data. Eu ainda era criança, mas me recordo o nome da feitora: Fátima do Sarafim – uma amiga de minha Tia Márcia. Lembro-me dos comentários que só a Fátima fazia um bom vatapá.
Acontece é que o vatapá da Fátima era o vatapá à cearense, feito com frango, em seu caldo temperado onde se acrescentava pão dormido amolecido com leite, para dar a liga, e molho das melhores pimentas para dar aquele "esquenta" no céu da boca.
À medida que o tempo foi passado, eu conheci o verdadeiro vatapá baiano, exótico e singular. É como diria Gregório de Matos: “O vatapá é o Brasil em forma de comida”. Ao contrario do que pensa a maioria das pessoas, o vatapá é legitimamente brasileiro. Tem na sua composição o reflexo do povo brasileiro, seus ingredientes apresentam cultivos indígenas e outros trazidos pelos europeus e africanos.
A lista de ingredientes do  vatapá baiano é diversificada: peixes, pão, fubá, farinha de mandioca, azeite de dendê, leite de coco, castanha de caju, amendoim, camarão, coco, gengibre, cebola, pimenta, coentro, etc. Na África o leite de coco não possui o prestígio que usufrui no Brasil. E apenas em Angola, alguns pratos se aproximam do vatapá, o muambo de galinha e o quitande de peixe. No entanto a receita foi evoluindo, ganhou adição de novos componentes e substituiu outros.

O vatapá é um dos recheios do acarajé.
A fama do vatapá vai longe. Dizem os historiadores da vida de Virgulino Lampião, que por superstição, ele não comia vatapá. E que por ordem de Lampião, ninguém do bando podia comer vatapá. Mereceu até receita-canção de Dorival Caymmi: Quem quiser vatapá, ô / Que procure fazer / Primeiro o fubá / Depois o dendê / Procure uma nêga baiana, ô / Que saiba mexer…
Muitos ainda sugerem a origem Yorubá, do vatapá. Mas esta versão foi desmentida por Câmara Cascudo, grande antropólogo e historiador nordestino, que durante uma viagem à África, descobriu que ninguém sequer sabia o que significava essa palavra. E mais, alguns dos alimentos que aqui reconhecemos como africanos, lá são reconhecidos como brasileiros. Assim é com o Vatapá, que o antropólogo afirma ser de origem Tupi. Porém não se encontrou o significado tupi para o vatapá.
Brasil sempre conquista os turistas com alguma particularidade, e nossas iguarias já levaram ilustres personagens ao deleite – quiçá ao pecado da gula. Foi justamente o vatapá a iguaria que agradou um dos maiores gênios da humanidade: Einstein.


Manchete de matéria no O Jornal - 12 de maio de 1925.
Extraída de: MOREIRA, I.C. e VIDEIRA, A.A.P.(Org.) Einstein e o Brasil. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1995.

Einstein comeu, ontem, vatapá com pimenta. A manchete é de O Jornal de 12 de maio de 1925. Albert Einstein estava no Brasil, e em meio a maratonas sem fim de homenagens, passeios e conferências – que ele achava um tanto chatas, diga-se de passagem. Num almoço, resolveram oferecer vatapá ao alemão. Com um aviso: “Cuidado com a pimenta”. Einstein, porém, não mediu a mão com o tempero. Queimou a língua e começou a suar. Educado, disse que apreciou o quitute, enquanto comia salada de folhas para aliviar o calor. Anotou em seu diário de viagem: “Visita ao manicômio, cujo diretor é mulato e uma pessoa especialmente virtuosa. Com ele, almoço brasileiro com muita pimenta”.
E se você ficou com água na boca, querendo  sentir a pimenta do vatapá queimando sua língua também, aqui  deixo duas receitas "simples" de vatapá baiano e uma de vatapá cearense.

Vatapá baiano
01kg-pão cortado em rodelas grossas
02-colheres de sopa de óleo de girassol
01-cebola grande picada
02-dentes de alho amassados
01-pimentão verde picado
01-tomate sem sementes picado
1/2kg-camarões salgados e escaldados para tirar o excesso de sal
sal a gosto (se precisar)
01-maço de cheiro-verde completo picado
01-garrafa média de leite de coco
azeite de dendê e pimenta-murupi a gosto

Preparo Coloque o pão de molho com água suficiente para cobri-lo. Deixe descansar o tempo suficiente somente para amolecer. Esprema bem o pão e amasse-o com as mãos, ou passe-o no liquidificador, ligeiramente. Reserve. Em uma panela grande, coloque o óleo e deixe aquecer. Junte a cebola, o alho e refogue rapidamente. Junte os tomates e os pimentões. Tempere com pimenta e junte cheiro-verde. Mexa bem por alguns minutos. Junte a massa de pão e misture. Acrescente o leite de coco, misturando a cada adição e logo em seguida junte os camarões. Junte o azeite-de-dendê aos poucos. Misture bem . Amasse bem a pimenta-murupi em um pires com uma ou duas colheres de sopa de água e junte somente essa água à panela de vatapá (sem as pimentas). Deixe ferver até que comece a formar uma leve crosta no fundo da panela. Retire e sirva quente.

Vatapá baiano II
1 peixe de 2,5kg cortado em postas
1 cebola grande cortada em rodelas
4 tomates sem casca, em rodelas
5 colheres de coentro picado
4 colheres sopa de azeite de dendê
200g de camarão seco defumado, torrado e descascado
1 xícara de castanha de caju
1 xícara de amendoim torrado e descascado
1 pedaço de 7cm de gengibre
2 pães de fôrma sem casca
2 xícaras de leite de coco
4 xícaras de água
sal e pimenta-do-reino a gosto

Preparo Tempere o peixe com sal e pimenta. Arrume as postas numa panela fazendo camadas alternadas de cebola, tomate e coentro. Molhe com suco de limão. Acrescente o azeite-de-dendê por cima, tampe a panela e leve ao fogo. Cozinhe até que o peixe esteja macio. Retire o peixe dos temperos do caldo. Tire as espinhas e reserve o peixe. Passe os temperos de cozimento do peixe pelo liquidificador junto com o caldo, o camarão seco, a castanha de caju o amendoim e o gengibre. Reserve. Numa vasilha grande, coloque todas as fatias de pão, junte o leite de côco e amasse bem. Acrescente a água e mexa. Junte os temperos moídos e coloque tudo numa panela. Acrescente ½ xícara de azeite-de-dendê e leve ao fogo para cozinhar, mexendo com uma colher de pau. Deixe ferver por 15 minutos, mexendo até obter um creme brilhante. Acrescente os pedaços de peixe reservados e misture. Sirva quente.

Vatapá Cearense
10 pães cariocas/francês secos
1,5 litros de leite de vaca
1 peito de frango (cerca de 600 g)
2 tabletes de caldo de galinha
1 pimentão verde
2 maços de coentro
2 cebolas médias
1/2 (meio) vidro de azeite de dendê
1 lata pequena de milho verde
Pimenta e sal a gosto

Preparo Temos que primeiramente colocar os pães de molho no leite para umedecer; estando úmidos e desmanchando coloque uma das cebolas cortada grosseiramente na mistura de leite com pão e misture bem. Em seguida faça o mesmo com o coentro; Coloque um pouco de sal na mistura. Enquanto o leite e o pão ganham o sabor da cebola com o coentro, coloque o peito para cozinhar em pedaços junto com os 2 tabletes de caldo de galinha; Depois de cozido coloque-os para esfriar e reserve o caldo. Depois de frio desfie-o grosseiramente, porque se ficar muito fino você não consegue sentir o frango na hora de comer; No liquidificador coloque a mistura do pão e bata até ficar bem homogênea, bem misturada, faça isso com toda mistura e reserve. No fogão coloque uma panela de tamanho médio, que você veja que vai caber tudo e sobrar um pouquinho de espaço para que você possa ficar mexendo sem problemas. Na panela coloque o dendê, a outra cebola e o pimentão picadinhos e deixe dourar. Depois de dourada cebola coloque todo peito do frango que já foi desfiado e misture bem, deixe o frango ficar bem da cor de dendê, feito isso coloque o caldo, uns 400 ml que havíamos reservado, no frango e deixe pegar o sabor por uns 10 minutos. Feito isso coloque a mistura de pão que já foi passada no liquidificador e fique mexendo bem para que o pão não grude no fundo da panela, isso por uns 30 minutos, quando você perceber que está cozido o pão fica bem grosso e borbulhando, se você achar que não está grosso como você quer coloque uma colher de farinha de trigo num copo de 180ml de leite e coloque na mistura . Quando estiver bem grosso coloque o milho verde e corrija o sal e misture por mais uns 3 minutos Desligue o fogo e coloque a pimenta, a gosto.

terça-feira, 19 de junho de 2012

Os pirulitos de Dona Canô e as lembranças de minha infância...


Quando eu era criança, na cidade serrana de Guaraciaba do Norte, ( terra da atual Miss Ceará Milena Ferrer) onde morei boa parte da minha vida, sempre me deparei com guloseimas das mais variadas formas.
Lembro-me bem de tantas coisas gostosas que eu  comia, especialmente daqueles salgadinhos maravilhosos, que meu avô trazia da feira em sacos enormes - Eram simples, uma espécie de mini pastéis sem recheio, mas eu adorava; outra coisa deliciosa que ainda me recordo e me faz salivar até hoje,  e que se duvidar eu ainda consigo até sentir o cheiro no ar, são aqueles inesquecíveis sonhos portugueses (filhós no ferro – já postei a receita Clique aqui para ler) do meu aniversário de 3 anos.

Olha eu aí, usando suspensórios, no meu aniversário de 3 anos - o inicio das minhas memórias gustativas  (eu sempre achei que esta réplica da Monalisa me encarava - risos).
Nas épocas de festividades como festas juninas e a festa da padroeira da cidade – Nossa Senhora dos Prazeres (comemorada de 5 a 15 de agosto)., Guaraciaba parecia desencavar as receitas de família, que eram preparadas com esmero sendo levadas para serem vendidas nas barracas juninas ou nas da festa da padroeira e nos leiloes da igreja. 


Igreja matriz de Nossa Senhora dos Prazeres - Gba. do Norte - CE,
Pensando bem era justamente nestas duas épocas do ano que se poderia encontrar por lá os pirulitos “de papel” – era assim que a gente chamava eles naquela época. Na realidade tratava-se de pirulitos simples feitos de calda de açúcar que poderiam ser temperados com alguma essência e coloridos – para isso, naquela época se usava os sucos em pó, sobretudo o Q-Suco muito famoso na década de oitenta – e eram colocados pra secar em cones de papel oficio com um palito no centro.

Os pirulitos de mel
Vez por outra eu comprava desses pirulitos. E só não comprava  mais porque ele tinha defeitos:
Grudavam nos dentes – e eu ficava louco com isso, enfiava  a mão na boca a toda hora pra puxar o doce;
Por ser feito de açúcar, ganhava a forma de uma bala puxa-puxa ou endurecia e ficava difícil arrancar o papel – as vezes se chupava o pirulito com pedacinhos de papel por que eles teimava em não sair completamente;
E melava fácil – hoje sei o motivo disso, é que quem preparava os pirulitos não usava papel vegetal para fazer os conezinhos, e isso facilitava a meladeira de açúcar derretido.
Hoje quando me recordo daquele tempo dou boas gargalhadas. Dai eu  fuçando uns livros acabei encontrando a recita dos benditos pirulitinhos – que aproveito para passar para vocês com a indicação do livro no qual que a  encontrei sobre a culinária da matriarca dos Vellosos – Dona Canô.


O Sal É Um Dom: Receitas de Mãe Cano por Mabel Velloso,  Editora Nova Fronteira – 127 páginas, 2008
As receitas do recôncavo  baiano por Dona Canô

Nascida Claudionor Vianna Telles Velloso, a Dona Canô, respira esperança e mantém o olhar meigo mais vivo que nunca. Nasceu em Santo Amaro, no Recôncavo Baiano, teve oito filhos, entre eles os famosos Caetano Veloso e Maria Bethânia. Seenhora sempre muito prestigiada pelo povo  baiano, Dona Canô sempre buscou fortificar suas raízes e exaltar o amor por sua terra, seus filhos e sua cultura.

Dona Canô
Foi pensando no exemplo da mãe que Mabel Velloso, uma das filhas, resolveu escrever o livro O Sal é um Dom – receitas de mãe Canô, cujo foco é preservar o legado da matriarca através das memorias gustativas, trazendo ao longo do livro as receitas de um legado culinário-afetivo.
 As páginas revelam a bases de sua cozinha: a fartura – por la sobrar comdia é sinald e desfeita;  carnes bem temperadas - “Nas carnes, sempre, hortelã, folha de louro, cebola, pimenta-do-reino e cominho”, escreve Mabel; os mimos culinários para receber os filhos -   “Caetano, quando chega, come bem devagar, saboreando a moqueca de tainha. A frigideira de maturi é quase sobremesa”; compoteiras sempre cheias de doces de frutas da estação. Sem falar numa invenção simples que adoçou a infância dos filhos e faz a alegria de netos e bisnetos: os pirulitos de mel de Dona Canô.
O Sal É Um Dom mostra  a comida quase como um membro da família Velloso. Nelse encontra patos de festa e para o dia-a-dia. Trazem ainda  as raízes da comida do recôncavo baiano – embora muitos deles possam er encontrados em qualquer outra mesa.
O livro mostra que comida pra ser boa tem que ser gostosa e não difícil. Traz receitas intercaladas com fotos e textos, onde se tira a conclusão que levou ao titulo do escrito:
Certa vez quando Dona Canô foi indagada por causa de uma receita, falou todos os ingredientes até que fora questionada sobre a quantidade de sal no que respondeu com o título do livro – o sal é um dom.  assim sendo, quem vai discordar da sábia senhora que já passou dos cem anos?

Pirulitos de mel - Receita extraída do livro O Sal é um Dom 
Ingredientes
2 xícaras de açúcar
Água que baste para cobrir o açúcar
1 colher de vinagre
1 colher de mel de abelha

Modo de preparo Prepare a calda, colocando a água, o vinagre – para não açucarar – e o mel e deixe ferver até dar ponto de fio. Despeje a calda nos canudinhos de papel manteiga, preparados com antecedência. Se quiser fazer o pirulito com outro sabor, em vez de mel, coloque queijo ralado, ou gengibre, ou calda da fruta que desejar, ou amendoim torrado e moído, ou, ainda, chocolate.

Obs.: Para fazer o canudinho, corte a folha do papel manteiga em quadrados de mais ou menos 10 centímetros, enrolando-os na diagonal. Para os canudos ficarem abertos, esperando a calda, acomode-os numa vasilha com farinha. Despeje a calda nos canudos e, antes de endurecer, coloque os palitos.

sábado, 16 de junho de 2012

Le Marron Glacé: nome francês para um doce italiano.


Caríssimos Confrades e Consórores, tudo bem? Espero que sim.
Estava aqui relendo um material sobre os hábitos alimentares da Família Imperial Brasileira que foi me enviado pelo arquivo histórico do Museu Imperial a meu pedido para fundamentar uns artigos científicos que estou escrevendo... e aproveito esta oportunidade para agradecer, especialmente, à Sra. Fátima Argon, que realizou o levantamento preliminar das comidas e bebidas do século XIX, a partir da Família Imperial do Brasil, cuja pesquisa contou com a colaboração de Átila Beppler Meirelles, Fernanda Moutinho de Almeida e Mônica Salem de Zayas. Meus sinceros agradecimentos a vocês.

No conteúdo do material recebido encontrei muitos fatos interessantes que, ao longo do tempo, irei compartir estas curiosidades com vocês. Começarei isso hoje, revelando uma peculiaridade gastronômica da princesa Isabel: o fascínio da princesa pelos doces.

Trechos extraídos da obra de Guilherme Auler A Princesa e Petrópolis:


Comentários da princesa Isabel sobre a festa de aniversário sua mãe, a Imperatriz Dona Teresa Cristina: [...] “Ontem me diverti muito e também dancei muito. Vou lhes contar o que fiz: primeiro, toquei de quatro mãos com a Mana, dancei a Favorita, a Polca, a valsa lisa e a valsa pulada, o schottish, a varsoviana, duas contra-danças, os lanceiros a galope figurado, tomei sorvete, bebi meia xícara de chá com pão-de-ló."

Na quaresma de 1858 ela confidencia: “Hoje fiz uma verdadeira penitência; como não me deram senão peixe de lata, que não gosto nada, não comi senão arroz de manteiga e batatas”.

“Eu lhe mando estes marrons-glacês para Mamãe, posto que Papai não gosta de castanhas”.

No verão de Petrópolis, em 1860: “Acabo de tomar sorvete; desejava que Papai estivesse aqui para tomar conosco”.

No dia 28/03/1860: “Não vão os figos, porque não se puderam achar em Petrópolis”.

Ao longo dos meus estudos o doce sempre se fez muito presente, principalmente, pelo fato do Brasil já ter sido uma “Açúcarocracia”. Em função disso o nordeste brasileiro, até hoje, exibe sua doçaria com orgulho e revela seu potencial nato para a fabricação de doces.

Porém, é sabido que o povo brasileiro comemora muitas datas especiais com simbologia importada, principalmente vindas da Europa. Não se pode negar este fato, e bata-se olhar para as nossas mesas onde as preparações iram nos denunciar (por conta de suas influências). Assim, hoje tratarei de um dos doces bastante citado nas frases de Isabel, princesa imperial do Brasil, em suas cartas a parentes: o Marrom Glacê.

Marrom Glacê
O Marron Glacê já foi uma sobremesa muito cobiçada em outras épocas: era preparação cara, geralmente importada, e com requeria habilidades de confeiteiros com experiência na técnica delicada do preparo para sair um produto final bem-feito. Se pudesse lhe comparar, bem genericamente, o seu sabor com algum doce típico brasileiro, estaria próximo a um doce de batata doce bem elaborado – mas as castanhas em glacê não devem ter comparações.
Contudo, trata-se de um doce ainda refinado e delicado, preparado a partir das castanhas europeias inteiras. O doce tem nome francês, a escrita original é Marron Glacé. Mas, apesar do nome francês, ele surgiu na Itália.
Acredita-se que o Império Romano já preparava sobremesas semelhantes, onde as castanhas eram cozidas e mergulhadas numa ânfora abundante em mel. Tal doce romano fazia o deleite da bela Amarílis, personagem cantada nas Bucólicas, primeira obra importante do poeta latino Virgílio, entre os séculos 42 e 39 a. C.
Entretanto, a receita contemporânea teria surgido em Turim, no fim do século XVI, na corte dos Savoia, antiga e poderosa família feudal do Norte do país. A ela pertencia Vittorio Emanuele II, o rei que unificou a Itália em 1861.
Mas se o marrom glacê nasceu em terras italianas, por que batizá-lo com um nome francês? 
Em italiano, o doce deveria chamar-se de marrone candito, mas os Savoia julgavam mais elegante falar francês. E assim, o resultado final para batizar o doce que surgiu por acaso, quando um cozinheiro distraído que trabalhava para o duque Carlo Emanuele I de Savoia (1562-1630), cozinhou na calda, em vez de água, as castanhas destinadas ao recheio de um javali.
A história nos conta que a cidade italiana de Turim comprava açúcar de Veneza, também ao Norte da Itália e, por muito tempo, conservou seu monopólio na Europa. Ao ser incorporado pelos confeiteiros da corte de Luís XIV (1651-1715), o marrom glacê adotou cidadania francesa.
Posteriormente, a receita foi aperfeiçoada na Ardèche, pequena região do sudeste do país, com fama de produzir as melhores castanhas. Assim a França se encarregou de difundir este doce pelo mundo como forma de valorizar suas castanhas.
A técnica contemporânea de preparo do doce começa com uma rígida seleção das castanhas: somente as maiores, perfeitas e macias - cerca de 20% de um total - se transformarão em doce.

Depois de descascadas, as castanhas são envolvidas em véu de tule para serem, em seguida, cozidas na água quente por um tempo preciso. Posteriormente, eliminam-se as que não resistiram ao calor e racharam. O passo seguinte consiste em colocar as castanhas numa grelha, onde elas receberão um banho de xarope de açúcar. Depois de alguns instantes no forno, o preparo termina.


Os marrons glacês são acondicionados individualmente em papel alumínio (ou papel manteiga ou em papel encerado) e colocados em embalagem de papelão ou vidro.
Uma variação do doce é apresentá-lo macerado em calda, licor, rum ou cerveja. Existe também o creme de marrons (um tipo de geleia feito com açúcar), o purê de castanhas (o mesmo produto, sem açúcar) e a conserva de castanhas em pedaços.
Não existe relação, entretanto, entre o marrom glacê e o doce homônimo brasileiro, feito à base de batata-doce, xarope de glicose, espessante e acidulante. Não que o doce de bata seja um doce ruim ou sem qualidade. Mas é um marrom glacê tão falso quanto uma nota de três reais.


As castanhas europeias (portuguesas)


Castanheira
A castanha é o fruto de uma árvore de origem asiática, do gênero Castanea. Foi levada para a Líbia e dali se alastrou pela bacia do Mediterrâneo.

Hoje, encontra-se desde o Norte da África à Dinamarca, dos Estados Unidos ao Brasil. Alcança de 20 a 30 metros de altura e passa a dar frutos aos 25 anos. No início, cada pé fornece de 15 a 20 quilos anuais de castanhas. Aos 50 anos, a produção sobe para 80 a 110 quilos.


No Sul da Itália, perto do Monte Etna, o maior vulcão europeu, existe uma castanheira com mais de 400 anos de idade. Isso lhe confere o status de árvore longeva.
O fruto se desenvolve no interior de uma carapaça espinhosa, conhecida como ouriço. No outono, amadurece e despenca dos galhos. Não pode ser comido cru. Só quando assado ou cozido revela suas deliciosas características.
Divide-se em dois tipos: a castanha propriamente dita e o marrom. No primeiro, o ouriço acomoda dois ou três frutos. O marrom nasce solitário.

A castanha-do-Pará (ou Castanha do Brasil) e a castanha de caju têm papéis importantes na economia brasileira. Mas não pertencem ao mesmo gênero. A castanha europeia contém elevado teor calórico: é ainda, rica em proteínas, vitaminas A, B e C; além de ser dotada com sais minerais, magnésio, enxofre e cloro, ajudou populações inteiras de camponeses franceses e italianos do passado a enfrentar a fome no inverno europeu.

Marrom Glacê de Castanha (simples)
Ingredientes:
40 unidades de castanha portuguesa grandes
quanto baste de açúcar

Preparo: Escolha 40 castanhas bem grandes e robustas. Tire as cascas grossas e retire as peles, deitando-as em água fervendo e deixando amolecer. Trabalhe sem deixar a água esfriar. Feito isso, coloque as castanhas, duas a duas, em quadrados de filó, e amarre com linhas, como trouxinhas. Então, pese as trouxinhas e, com o mesmo peso, pese a quantidade de açúcar. Deite as castanhas num tacho cubra com bastante água morna e deixe cozinhar até ficarem bem tenras, que cedam ao apertar com os dedos. Do açúcar, faça uma calda em ponto de pasta, com uma fava de baunilha. Escorra as castanhas e deite-as bem quentes na calda também quente, leve-a a tomar ponto de novo e guarde. No dia seguinte, repita a operação, juntando 1/2 kg de açúcar e guarde. No terceiro dia, leve o tacho ao fogo, apure mais o ponto e retire as castanhas para uma peneira. Junte as partidas, a fim de colocá-las com a calda. Leve de novo a calda ao fogo, tome ponto de açúcar e enrole-os em papel alumínio. No dia seguinte o açúcar se funde e elas ficam no ponto.

Marron Glacê com whisky
Ingredientes:
1 ½ kg de castanhas portuguesas
500 g de açúcar
250 ml de água
1 colher de sopa de whisky
1 colher (chá) de essência de baunilha
Prepare: Coloque as castanhas para cozinhar na panela de pressão; Após a panela pegar pressão, deixe cozinhar por mais 30 minutos; Depois de cozidas, descasque as castanhas e passe-as pela peneira ou pelo multiprocessador e reserve; Em uma panela, coloque a água, o açúcar, o whisky e a baunilha; Leve ao fogo e quando a calda estiver bem dissolvida, acrescente a massa da castanha, sem parar de mexer para não empelotar; Quando estiver desgrudando do fundo da panela, tire do fogo; Coloque em uma vasilha para esfriar e sirva.

Marron-Glacê de Batata Doce
Ingredientes
1 1/2 kg de batata doce
1 kg de açúcar
200 ml de água de coco fresca
2 colheres (sopa) cheias de cacau em pó
2 colheres (sopa) de óleo
1 colher (chá) de essência de baunilha
100 g de coco ralado
Coco ralado ou açúcar para enfeitar
Preparo: Cozinhe as batatas descascadas com 1 colher de açúcar até que fiquem macias, mas não totalmente cozidas. Escorra bem a água e passe no espremedor de batatas. Coloque numa panela a massa da batata doce, adicionando o restante dos ingredientes. Cozinhe em fogo brando, mexendo sempre com colher de pau até soltar do fundo da panela. Deve ficar bem firme. Com uma colher de sobremesa, pegue pequenas porções de massa e enrole na palma das mãos untadas, dando a forma que desejar. Ou, se preferir enforme no formato que desejar. Passe no açúcar ou no coco e deixe secar. Deixe pernoitar na geladeira antes de servir.

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Doce seco: luxo gastronômico e resgate da tradição gastronômica do Seridó


E a temporada junina chegou para animar o nordeste brasileiro. Como sempre, o resgate da tradição junina à vista, é tempo bom para relembrar momentos antigos e gravar novos na memória. É bonito ver as pessoas resgatando as tradições: comendo receitas típicas, brincando nas quermesses como brincadeiras ancestrais, dançando as quadrilhas – dança de origem europeia que foi trazida com a colonização, e que se transformou numa dos ícones nordestinos; se deleitando com comidas típicas deliciosas; embalados por uma música pra lá de animada, com muita gente querendo diversão.

Depois de eu ter dedicado boa parte das minhas pesquisas cientificas aos estudos culturais com foco na gastronomia, é sempre um prazer quando chega junho, ou qualquer outra data comemorativa, pois com ele sempre despontam as  comidas típicas.


Nos festejos juninos, por exemplo, é sempre uma fartura de bolos: de milho, de aipim, de batata, de massa puba, de amendoim; e ainda tem paçoca carne feita no pilão; pé de moleque, pamonha, canjica, aluá, e tantas outras guloseimas que enchem os olhos de alegria por saber que a tradição, a cultura, está sendo de alguma forma mantida. No entanto isso ainda é pouco, considerando a imensidão do Brasil, com suas cozinhas distintas e cheias de pratos que podem levam qualquer um a cometer o pecado da gula sem culpa, e que são parte da identidade cultural de um povo.
Eu fico me perguntado: - quando as ações do IPHAN vão dar vez para a preservação de mais bens gastronômicos brasileiros? Se realmente há um interesse nesse campo, será que não existe ninguém interessado em aprender as receitas tradicionais da sua região?  Será que a educação, com suas instituições variadas, não poderia ajudar nesta preservação?

Pensando nisso hoje eu resolvi trazer um doce especial para apresentar a vocês: o Doce Seco. Parece estranho o nome, mas é uma das maravilhas da doçaria nordestina que está se perdendo no ostracismo.

Doce Seco
Você sabe onde fica o Seridó? Por que é de lá que vem a origem do doce seco.
Seridó é uma região interestadual localizada no sertão nordestino brasileiro. Oriunda da antiga região da "Ribeira do Seridó". Abrange vários municípios do Rio Grande do Norte e da Paraíba, onde é oficialmente dividida pelo IBGE em Seridó Ocidental Potiguar e Seridó Oriental Potiguar, Seridó Ocidental Paraibano e Seridó Oriental Paraibano. No entanto, outros municípios costumam se identificar como "Seridó" ou seridoense, o que agrega um total de 54 municípios, sendo 28 potiguares e 26 paraibanos, o que levou a uma subclassificação realizada pelo Ministério da Integração Nacional. Mesmo sendo uma das regiões mais áridas do Nordeste, o Seridó, principalmente o potiguar, apresenta a melhor qualidade de vida do interior nordestino.
Há divergências quanto a origem do topônimo Seridó, segundo o folclorista e historiador Luiz da Câmara Cascudo, vem do linguajar dos tapuias transcrito como "ceri-toh" e que quer dizer "pouca folhagem e pouca sombra", em referência as características da região. No entanto, existe a teoria que os colonizadores tenham sido cristãos-novos, descendentes de judeus, os termos "sarid" e "serid", seriam oriundos do hebraico, que significaria "sobrevivente" ou "o que escapou". Ou ainda "she'erit" no sentido de "refúgio Dele" ou "refúgio de Deus".
Quando eu cursava o bacharelado em Turismo, tive a oportunidade de conhecer o Rio Grande do Norte, desde a sua capital até boa parte de suas cidades interioranas. E numa dessas viagens me apresentaram ao doce seco
A tradição nordestina para a fabricação de doces é nítida deste a época do período açucareiro, quando as brancas portuguesas introduziram o açúcar na nossa alimentação e passaram seus conhecimentos para escravas que viraram eximias doceiras, e sinhazinhas mantinham seus livros de receitas guardadas a sete chaves.

Aliás, os portugueses tem influência direta na confecção do doce seco, considerando que esse tipo de doce, pelo formato, lembra os Ovos moles de Aveiro, um doce tradicional da doçaria conventual portuguesa. Porém o doce seco tem toda uma técnica diferenciada, sem falar que não leva ovos.
Ovos moles de Aveiro
O doce seco apresenta-se na forma de um pequeno pastel. Porém, não é frito e nem assado. Sua massa crocante e delicada com recheio cremoso esteve presente nas mesas comemorativas do Seridó. E por estar cada vez mais raro de ser encontrado, acabou se tornando puro luxo gastronômico para aqueles que que tem a oportunidade de se deleitar com essa iguaria  que, geralmente marca datas comemorativas como o São João, o Natal e o Ano Novo, períodos nos quais os parcos conhecedores da técnica do preparo do doce seco, no Seridó, resolvem presentear aos amigos com a guloseima.

O doce seco também é conhecido como doce de espécie. Isso deve se por seu recheio ser bastante temperado, à base de especiarias como cravo, canela, erva-doce e pimenta do reino, gengibre. E para deixara  mistura ainda mais saborosa, nela ainda se adiciona o mel de engenho (feito da rapadura escura), coco ralado, gergelim, castanha de caju e farinha de mandioca.

o doce de espécie  que serve de recheio para o doce seco
O grande trunfo do doce seco é o casamento perfeito entre sua massa fina e crocante com a cremosidade do doce especiarado. A massa crocante é simplesmente feita com farinha de trigo e água (esta última em pouquíssima quantidade, inclusive). Depois de recheado, o doce fica maturando em temperatura ambiente, que na região se entende pelo clima seco e quente, para em seguida transformar-se numa delicia crocante.
E é impressionante que todo mundo que não conhece esse doce, ao prova-lo, se questiona se ele é frito ou assado, pela crocância. O mistério é revelado ao inquisidor com uma simples resposta:  - o segredo é do vento. Apenas o vento é o responsável por deixar o doce no ponto certo (se o ar estiver úmido, como no nosso litoral, o doce “chora”, como dizem as doceiras mais experientes, ou seja, não seca e o recheio termina molhando a massa. E perde-se o encanto).
Quando eu digo que o doce seco é luxo gastronômico isso tem fundamentação: tanto é raro encontrar na atualidade quem o prepare, quanto é raro encontrar pessoas das novas gerações que o tenham provado. Só os mais velhos, os sertanejos do Seridó e os sortudos (me enquadro nesta categoria) conhecem o sabor especial deste doce. E dá um aperto no coração constatar isso. Porque daqui alguns dias, não se vai mais ver o doce circulando por aí; e o que se vai ouvir, caso alguém questione sobre a existência do doce seco, é a seguinte frase: - ninguém faz mais esse doce, não (frase que já escuta por lá).

 Por sorte, ainda encontramos três pessoas que fazem o doce seco, pelo Seridó: Dona Vandilza, doceira,  em Jardim do Seridó; Dona Zélia Fernades e sua filha Desterro Costa (Morena), em São João do Sabugi.

Zélia Fernandes - guardiã da gastronomia tradicional  no Seridó
No aroma e no sabor, o doce seco lembra o bolo pé-de-moleque nordestino. Isso se deve a presença de especiarias como cravo, canela, erva-doce, pimenta do reino, gengibre (além das castanhas e/ou do gergelim que, quanto mais tiver, mais saboroso fica) que estão presentes nas duas receitas e que dão o aroma e gosto inconfundível do recheio, mas que pode ser consumido as colheradas como um doce normal.
Essas referências de especiarias são associadas à península ibérica numa clara origem árabe, como o livro “História da Alimentação no Brasil”, de Luís da Câmara Cascudo, refere-se no capítulo sobre a doçaria portuguesa. “Espécie para recheio é um doce composto de pão duro ralado, mel, cravo-do-maranhão, etc.”. O farelo do pão duro teria sido substituído pela farinha de mandioca aqui no Brasil. Embora não conste o nome doce seco e nem doce de espécie no livro, que elenca vários doces e suas localidades de origem há o registro da espécie como recheio de receitas de sobremesas.

A tradição dos cadernos de receita e preservação das iguarias no Nordeste virou até motivo de livro – como alguns escritos por Cascudo e Freyre. A receita do doce seco vem passando, ao longo dos anos, de mãe para filha e sabemos que está, pelo menos, na quarta geração.

Vandilza Gonçalves da Silva, 47, conta que não sabe ao certo quando começou a fazer o doce, já que sempre esteve na cozinha, desde a infância, ajudando a avó Josefa Elvira, a separar e moer os ingredientes. “E minha avó já aprendeu com a mãe dela, Francisca Elvira de Freitas”, fala. Depois que a avó não pôde mais continuar como doceira, a mãe de Vandilza, Francisca das Chagas da Silva, passou a tomar conta da receita, mas por pouco tempo. Logo a quarta geração de doceiras de Jardim do Seridó, Vandilza, tomou conta da feitura do doce e vem sendo a preferida de muitas famílias que guardam a tradição de ter a iguaria na mesa de Natal e Ano Novo.

Sempre servido em ocasiões festivas, o registro do consumo deste doce ainda é relacionado também a festas de santos padroeiros de cada localidade. Se perguntado aos seridoenses mais velhos sobre o que constava numa mesa de aniversário, festa de padroeira ou ceia de Natal, sempre vem a doce e temperada lembrança do doce seco como sobremesa. Os mais antigos também falam que doce seco era comida de mulher parida: “Isso é muito forte, tem mel de rapadura e dá muito leite”, afirma Francisca das Chagas, mãe de Vandilza.
 O modo de fazer o doce seco e o doce de espécie não constam do registro do inventário de referências culturais realizado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan, em sete municípios do Seridó — Caicó, Acari, Currais Novos, Carnaúba dos Dantas, Cruzeta, Jardim do Seridó e Timbaúba dos Batistas —, em 2007. Constam chouriço, filhós (que também vem desaparecendo das cozinhas tradicionais) e doce de jerimum, além dos variados biscoitos de Caicó.
A alternativa inicial para fazer com que o doce seco perdure é passar a receita e o preparo, a cada geração. Mas, infelizmente, não existe muita gente interessada nos estudos pela gastronomia tradicional – ou pelo menos é isso o que me pareceu quando estive por lá.
O doce seco faz parte das lembranças de infância do escritor e sertanejo — como ele próprio define — Pery Lamartine. Em um artigo publicado em seu blog, escrevendo sobre o reencontro com um amigo dos tempos das festas animadas em São João do Sabugi, o dito doce é citado e elogiado. Lembra quem o fazia e onde a negra já de idade e detentora do mistério do doce crocante que não leva fogo, morava. “No fim da rua”, tenta lembrar um conterrâneo enquanto consultava sobre o nome da cozinheira que andou por várias cozinhas das tradicionais famílias daquele pedaço de Seridó.
Na fazenda Timbaúba, do avô materno Zuza Gorgônio, em Ouro Branco, sua mãe, Maria de Lourdes, também fazia a receita. “Ela modificava para ficar mais prática”, diz, explicando que no lugar da rapadura, colocava açúcar bruto, o escuro, e também nunca usou a crueira, como os mais antigos usavam, sempre usou a farinha. Crueira, segundo explica Pery Lamartine, é a parte ralada mais grossa da mandioca, geralmente colocada como ração para o gado. Mas a receita de dona Maria de Lourdes, nos idos dos anos 20 para 30, sempre levava gengibre. “Se não tivesse ela nem fazia porque ficava sem graça”, diz.
A lembrança dele também remete o sabor do doce às festas juninas, mais precisamente à noite de São João, festa típica do município de São João do Sabugi. Lá, os festejos eram mais animados, diferente da programação de sua cidade, a vizinha Serra Negra do Norte: “Tinha orquestra na praça, diferente de Serra Negra que era mais programação de igreja”, relembra.
Menino criado em fazenda até os dez anos de idade, Pery Lamartine avalia como natural a perda de costumes típicos. Antigamente, sem industrialização de alimentos cozinhava-se tudo em casa. Hoje, a facilidade dos produtos prontos e a vida corrida, para ele, concorrem para o fim do conhecimento de receitas de família. Embora diga que antes era bem melhor, com sabores incapazes de serem esquecidos.
 Para garantir a continuidade do doce seco deixarei a receita, obtida com o custo de pesquisas naquela região. E deixo aqui um agradecimento particular aos autores das fontes por mim consultadas. São iniciativas como a de vocês que fazem valer a pena o meu trabalho de pesquisador. Obrigado!

FONTES:




Doce Seco
Ingredientes:
1 e ½ rapadura
2 xícaras de farinha de mandioca bem fina
2 colheres (sopa) de: cravo
2 colheres (sopa) de canela
2 colheres (sopa) de erva-doce
1 colher (chá) de pimenta do reino
1 colher (chá) de gengibre (se preferir)
1 coco ralado e tirado o leite
100g de castanha de caju
1 pitada de sal
Para a massa
700g de farinha de trigo
Água até dar o ponto de soltar das mãos


Preparo: O primeiro passo é fazer o mel com uma rapadura bem escura. Coloca-se no fogo com um pouco de água a rapadura quebrada em pedaços grosseiros e vai mexendo para ela desmanchar e dar o ponto de mel, um pouco grosso. Depois, rala-se o coco para tirar o leite. As especiarias são trituradas: cravo, canela, erva-doce, gengibre (para quem preferir) e pimenta do reino. As castanhas também são trituradas, mas algumas ficam inteiras para enfeitar. Depois de tirar o leite do coco passando no liquidificador, côa-se e acrescenta-se os ingredientes secos, as especiarias, a castanha triturada e a farinha de mandioca. Leva-se ao fogo em uma panela com o cuidado de sempre mexer para não deixar a farinha sentar no fundo da panela e não queimar. Nesta quantidade, quando começar a fervura espera-se mais ou menos meia hora para desligar o fogo, sempre mexendo. Quando desgrudar do fundo da panela, está no ponto. Coloca-se em tigela e o ideal é esperar até o dia seguinte para montar os doces, pois a espécie tem que estar fria. Massa: Numa superfície lisa e enfarinhada, abre-se a massa aos poucos. Feita de farinha de trigo e um pouco de água, é amassada na mão e deve ter consistência macia e firme. Pequenas quantidades da massa, mais ou menos do tamanho de uma bola de pingue-pongue, são abertas para serem recheadas e cortadas com formas de pastel. Depois de montados, os doces recebem generosa quantidade de farinha de trigo polvilhada para ajudar a secar a massa, sempre em local arejado. De vez em quando é recomendável virá-los de lado.  O mais importante: não pode ser guardado na geladeira para que a massa não molhe e não amoleça.

Doce de Espécie de Gergelim
1 copo de gergelim
1 copo de farinha de mandioca
1 colher de sopa de manteiga
1 colher de sopa de cravo da índia torrado
1/2 copo de castanha de caju assada
4 copos de mel de rapadura
canela em pau


Preparo: Colocar o gergelim numa panela e torrar. Quando estiver estalando, retirar do fogo e continuar mexendo até esfriar um pouco. Misturar ao gergelim, a farinha de mandioca, o cravo e as castanhas e misturar bem. Bater aos poucos essa mistura no liquidificador (ou no mixer, ou em um moinho manual para triturar) para evitar que a massa grude demais. Verta a massa triturada em uma panela, juntar o mel de rapadura e a manteiga, acrescentar a canela em pau e levar ao fogo mexendo sempre. Retirar do fogo quando começar a ferver e colocar em um recipiente de vidro para esfriar. Para guardar melhor que o recipiente onde estar o doce tenha tampa para preservar os aromas.