Há tempos venho pensando no
Halloween como quem observa uma festa bonita, mas alheia — como quem admira o
brilho de uma vela em casa vizinha. Entre abóboras entalhadas e bruxas de
chapéu pontudo, sempre me perguntei se haveria uma forma de tornar essa celebração
menos importada e mais sentida. Algo que falasse comigo, com meus medos de
infância, com os assombros da minha terra. E, claro, com meu paladar.
Para fazer isso, precisei
fechar os olhos e voltar: à serra, passear pelo litoral, às noites em que o
silêncio tinha cheiro de lenha e perigo. Foi então que compreendi que para
viver um Halloween meu — um Halloween de verdade — eu teria que invocar as bruxas
que falam a minha língua, os fantasmas que se escondem na mata e não nos porões
vitorianos – embora eu também os admire.
E então percebo: aqui também
temos abóboras, mas as chamamos de jerimum, e jamais lhes cortaríamos um rosto
amedrontador, pois nelas não mora o susto, mas o sustento. Imagine um jerimum
assado, cavado com delicadeza como quem escava a memória, recheado de creme de
carne seca, coroado com queijo coalho dourado pelo forno e com uma chuva de
coentro picado — uma oferenda tão potente quanto qualquer vela em caveira.
Aqui também há chapéus
pontudos, é verdade, mas nossos mais característicos são os de couro dos
vaqueiros sertanejos, adornados com moedas, búzios, espelhos e medalhas que
tilintam como orações antigas. Heranças que vieram no bolso dos judeus
marranos, silenciadas pela Inquisição e ressuscitadas nas abas largas desses
chapéus que enfrentam sol, vento e assombro.
Se eu quiser, de fato,
celebrar o mês das bruxas com fidelidade ao que pulsa em mim — ao que arde,
respira e rasteja sob a pele da minha terra — eu teria que calar os gritos dos
castelos e florestas europeias e aprender, outra vez, a escutar os assovios e
estalados do mato.
Porque aqui, o medo não se
fantasia: ele canta em tons agudos na garganta da rasga-mortalha, ele estala no
galho seco sob a pata de uma criatura que nunca se deixa ver por inteiro. Aqui,
o feitiço tem cheiro: de leite fervido com cravo e canela, de mingau grosso
servido em silêncio, como se cada colherada fosse um pacto.
Há uma magia antiga que
paira sobre essas terras, mesmo quando esquecida. Ela se esconde nas rachaduras
das pedras, no vapor que sobe dos grãos, na folha que se mexe sem vento. São os
encantados — os que não vivem como nós, mas nunca deixaram de estar aqui. Eles
andam sobre raízes, sopram sobre brasas, nadam sob a pele dos rios, e tudo o
que fazem tem uma única missão: proteger. Protegem as matas dos que arrancam
sem pedir, os bichos dos que caçam sem fome, as águas dos que sujam sem culpa.
E, mais sutilmente, protegem
a nós... de nós mesmos. De nossas ganâncias, de nossos esquecimentos, de nossas
pressas e descrenças. Às vezes, nos confundem com medo — para que paremos. Às
vezes, nos assustam — para que voltemos. Não querem aplausos, nem rezas
decoradas. Querem silêncio quando a mata fala. Respeito quando a noite cai. E
um olhar menos distraído para o milagre cotidiano de ainda estarmos vivos,
mesmo depois de tanto descuido. Os encantados não foram feitos para serem
entendidos. Foram feitos para serem sentidos.
E é neste caldo denso que
eles se aproximam — os encantados, os temidos, os que nunca morreram.
O Curupira chega sempre
primeiro — mesmo com os pés ao contrário, mas propósito direto. Cada passo seu
apaga rastros e confunde caminhos, como quem embaralha as trilhas da ganância.
O ar ao seu redor cheira a casca queimada, a cipó quente, a um fogo que não
destrói: vigia. Em vez de beber ou servir, ele apenas sopra para longe o que
não é puro, como quem afasta os maus pensamentos da panela. Seus olhos,
pequenos vulcões adormecidos, seguem atentos cada movimento do tempo.
Ao seu lado, firme como quem
nasceu das raízes, caminha a Caipora, de pele da terra e cabelos de mato. Traz
ao colo um tatu encantado que se enrosca em seu braço como pulseira viva. Em
silêncio, ela recolhe um punhado de cinzas do chão e sopra dentro de uma cuia
de casca escura — oferenda aos que vivem enterrados, mas escutam tudo. Ambos
não provam o que o homem prepara — não têm sede de panela, nem fome de
indústria. Alimentam-se do que a floresta dá de presente: o néctar das frutas
silvestres, o frescor das folhas recém-caídas, o aroma úmido das ervas
selvagens. São os zeladores que se sustentam no pulso vivo do mato, mantendo o
equilíbrio sutil entre a vida que brota e o silêncio que sustenta. Não agem por
vontade ou desejo, mas por um compromisso antigo, tecido na mesma fibra das
raízes, uma promessa invisível que persiste mesmo quando esquecemos de
respeitar o mundo que nos sustenta.
O Saci, dança em seu
redemoinho travesso, e gira ao redor da panela como se a colher fosse um pião
ancestral — ele é o senhor das pequenas confusões, o artista das viradas do
destino doméstico. Quando o leite azeda na fervura, não é azar, é a travessura do
Saci que revela um segredo oculto: o azedume não é castigo, mas a semente de
uma doçura ancestral. Porque, na alquimia da minha cozinha, até o leite azedo
que parece estragado se transforma em doce de leite craquelado que embala a
noite com seu aroma de caramelo. É a poesia do inesperado, o encanto de
transformar o que parecia perder vida em sabor que conta histórias.
No coração dos bambuzais da
mata surge a figura do Saci. Dizem que o Saci não nasce como os outros. Não vem
do ventre de mulher nem da mão do homem — nasce do broto torto do bambu, aquele
que se dobra contra o padrão, que cresce errado como se escondesse um segredo.
É no silêncio dos bambuzais, onde o vento geme como um velho contando
histórias, que ele brota: pequeno, assobiando antes mesmo de ter boca. Vive
setenta e sete anos — número exato, místico, como uma sentença ancestral.
Depois, morre sem alarde e se transforma em cogumelo venenoso, desses que
ninguém ousa tocar, mas todo mundo reconhece. Sua existência é uma curva no
tempo, um ciclo que se alimenta da terra e volta pra ela. Ele não precisa de
espelho, documento ou altar — o Saci é memória viva, feita de broto, susto e
vento. E mesmo quando ninguém o chama, ele segue ali, esperando o próximo bambu
crescer torto de novo.
O Saci avança com uma perna
só — não por limitação, mas por um traço encantado, parte de sua essência
mítica. Na linguagem moderna, alguns poderiam tentar classificá-lo como uma
pessoa com deficiência (PCD), mas essa é uma visão limitada e inadequada para o
que ele representa.
Os ignorantes até poderiam
chama-lo de aleijado, mas sua única perna é como um tambor que marca o ritmo
dos segredos da floresta, um salto que desafia a própria gravidade e a lógica
dos homens. Ele é mestre da ausência, transformando o que falta em força e
mistério, navegando pelo mundo com a leveza de quem dança com o vento e ri da
própria sombra. Sua perna única é um convite a olhar além do visível e
encontrar beleza na diferença que o faz único.
O que o Saci teme não é a
ausência da perna, nem a busca incessante por uma nova — pois seu passo único é
dança ancestral, parte de sua essência indomável. Mais que tudo, teme ser
aprisionado, guardado dentro de garrafas, como se seu espírito pudesse ser
enjaulado, sufocado pela vontade alheia. Livre, ele é vento, sombra e riso;
preso, ele perde a chama que incendeia a mata e acende o mistério.
Seu medo real, é perder sua
carapuça vermelha, seu amuleto sagrado, a fonte de seu poder e liberdade. Quem
consegue roubá-la, domina o Saci, molda suas travessuras ao seu próprio
capricho. Sem ela, ele se torna apenas um sopro fugidio, uma sombra que dança
entre as árvores, uma alma inquieta que vaga, esperando o momento de
reencontrar sua força. Ele é a chama errante do fogo que tanto aquece quanto
brinca, o guardião invisível da cozinha, que zomba da ordem com sorrisos
travessos, mantendo vivo o feitiço do sabor e do mistério.
Em 2003, o Estado de São
Paulo aprovou a Lei nº 11.669, instituindo o Dia do Saci-Pererê e seus amigos
do folclore nacional para ser celebrado em 31 de outubro — a mesma data em que
o Halloween, com suas máscaras estrangeiras e abóboras alaranjadas, avançava
sobre nossas ruas e quintais. No mesmo ano, o deputado Chico Alencar apresentou
no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 2.479, propondo estender essa
celebração a todo o país. Esse gesto, embora cheio de intenção, acabou por
transformar o Saci em um verdadeiro boi de piranha cultural — lançado à frente
de uma batalha desigual, exposto e sacrificado para tentar frear o avanço
inevitável da festa importada.
Ainda assim, essas leis,
embora assinadas, nunca saíram do papel com o vigor de um redemoinho. A
tentativa foi uma oferta simbólica para que nossas crianças mantivessem viva a
lembrança dos seus próprios fantasmas, daqueles que sussurram nas noites de
vento e carregam histórias de matas para as nossas varandas. Porém, essas leis
ficaram no papel, silenciosas como uma memória que escapa.
Passaram os anos, passam os
dias 31, e o que se vê nas ruas são vampiros com dentaduras de plástico e
abóboras que piscam nas vitrines, enquanto o Saci — aquele que nunca precisou
de fantasia para assustar — permanece na penumbra, quase invisível — na sombra
que persiste mesmo quando ninguém mais olha. E talvez ele aceite isso com um
sorriso torto, daqueles que carregam segredos antigos, porque há personagens
que sabem que o esquecimento também é uma forma de magia — uma pausa silenciosa
antes do medo se tornar avassalador, quando, de repente, ele decide reaparecer
e perturbar o cotidiano, sussurrando em meio ao silêncio, reacendendo sombras
que nunca realmente partiram.
Das profundezas das águas
sussurrantes, emergem os irmãos gêmeos encantados, tão opostos quanto as marés
que regem seus domínios. Cobra Norato (Honorato, para alguns), guardião
benevolente, desliza pelo chão com a graça silenciosa de uma cicatriz viva, envolvendo-se
nos pés da mesa como um laço de proteção. Ela traz consigo a bênção das águas
calmas, ofertando a paz e a cura a quem respeita a mata e seus segredos.
Já Maria Caninana, a irmã
sombria, brilha com olhos de lâminas afiadas, vertendo gotas de leite negro no
chão — um convite fatal para os mortos saciarem sua sede de mistério e
tormento. Ela é a sombra da serpente e da cascavel, a força perigosa que ronda
os limites entre a vida e a morte, entre o sagrado e o proibido. Juntos, são o
pulsar dual das águas brasileiras: a luz e a escuridão, o afago e o açoite, o
mistério eterno que envolve o que está por baixo, e o que nunca deve ser
completamente desvendado.
O Negrinho do Pastoreio
surge em silêncio, sombra que desliza entre o sonho e a memória. Em suas mãos
pequenas, um punhado de poeira e um cajado, símbolos de um fardo que nunca se
dissipou. E o fardo do Negrinho do Pastoreio não é feito de ferro ou madeira,
mas de lembranças dolorosas que ecoam nas sombras do tempo. Ele carrega o peso
de uma infância roubada, marcada pelo silêncio imposto da injustiça e da
servidão.
Seus passos, embora leves,
arrastam o grito mudo daqueles que jamais tiveram voz, e seu coração, embora
invisível, pulsa com a urgência de quem busca reparação. Seu olhar, distante e
ancestral, carrega o peso de uma dor antiga, mas também a chama tênue da
esperança que persiste, mesmo diante do esquecimento e da injustiça. Preso
entre o mundo dos vivos e dos mortos, seu espírito vagueia entre os campos e as
estrelas, uma alma errante que guarda a promessa de proteção aos perdidos, aos
abandonados — um guardião silencioso que transforma a dor em esperança e a
sombra em luz, com a paciência de quem sabe que o tempo também pode curar. Mas,
sempre lembrando que, mesmo na mais profunda escuridão, há sempre uma luz que
se recusa a apagar.
Do espelho embaçado do
banheiro, a Loira do banheiro surge — espectro pálido, úmido, como uma sombra
que o tempo tentou apagar, mas que insiste em habitar os cantos esquecidos da
casa. Ela nos observa, silenciosa, peloa vapores do chuveiro, atravessa paredes,
trazendo consigo memórias e segredos que se entrelaçam no ar. Lembro-me das
vezes em que, com um sorriso maroto e o brilho travesso no olhar, fiz meus
primos menores estremecerem com a simples menção dela — essa figura
inquietante, que dizem aparecer nos banheiros para sussurrar histórias que só
as paredes ousam guardar. Uma presença tão inconveniente quanto inesquecível,
que mistura o medo e a ternura num só suspiro de assombro.
No fundo das grutas, covas e
cavernas da mata, entre sombras e tralhas diversas, esconde-se a Cuca — aquela
bruxa antiga, que é um jacaré fêmea (ou jacaroa?) de cabelos loiro, metade
lenda, que minha infância aprendeu a temer pelas páginas de Monteiro Lobato.
Vive recolhida nas covas úmidas da mata, onde o tempo não entra, mexendo seu
caldeirão de feitiços que ora falham, ora fazem tremer até o chão. Atrapalhada,
sim — com suas unhas grandes demais e seu olhar vesgo de tanto ver o que não
devia —, mas perigosa quando quer. Basta um nome maldito sussurrado ou um sono
fora de hora, e lá vem ela, arrastando sua cantiga como um aviso: "Cuidado
com a Cuca, que a Cuca te pega... e pega daqui... e pega de lá." Era a
ameaça cantada que gelava a espinha e moldava o silêncio na hora de dormir — a
primeira bruxa que aprendemos a respeitar antes mesmo de entender o que era o
medo.
E então, chegam os filhos
das águas doces — belos demais para serem confiáveis, encantados demais para
serem apenas lenda. O Boto, de camisa alva como neblina sobre o rio, olhos
escuros de espelho partido, assovia entre os dentes como quem chama sem pedir
permissão. Seu sorriso é reza e armadilha, e seus passos, mesmo em terra firme,
ainda têm o ritmo lento das correntezas. Surge nas festas, dança com quem se
esqueceu de duvidar, e some na primeira luz do dia, deixando saudade e suspeita
no lugar do beijo.
A Yara vem logo atrás, com
cabelos longos como rios noturnos e uma voz moldada no afogamento dos sentidos.
Canta baixinho para quem se aproxima da margem — e quem ouve, raramente volta.
É bela de um jeito que dói, de um jeito que arrasta. Seus olhos prometem
ternura, mas escondem vertigem. Ela não precisa tocar: basta sussurrar, e o
corpo que a escuta já não pertence a si. São os encantados do desejo — tão
sedutores quanto perigosos. E como toda beleza selvagem, exigem reverência ou
distância.
E lá no alto, quase
confundida com o breu que cobre os telhados, a Matinta Pereira sobrevoa a cena
em silêncio — coruja, rasga-mortalha, ave de presságios. Suas asas não batem:
deslizam, cortam o ar com um som grave, meio lamento, meio sentença. Ela observa
tudo com olhos que já viram demais — olhos de fogo antigo que atravessam
telhas, janelas, segredos. Não precisa pousar. Basta que veja. Basta que sinta.
Quando o céu escurece de um
jeito estranho e o vento sopra como se carregasse recados de longe, ela desce.
E o que antes era ave — coruja de olhos de brasa, rasga-mortalha com penas que
sussurram presságios — começa a se desfazer em silêncio. As asas se recolhem
como véus antigos, as penas caem como folhas secas, e no lugar da ave, surge a
velha. Magra, encurvada, os olhos acesos de um saber que arde. Veste o tempo
como manto e fala pouco, mas quando fala, é sempre para pedir: fumo ou comida.
Não pede com súplica, mas com a firmeza de quem cobra o que lhe é devido. E ai
de quem negar — porque ela não esquece. E volta. Sempre volta.
Assim, se houver fumo sobre
a mesa, se um prato simples lhe for deixado com reverência, então ela aceita. E
ao aceitar, não é apenas alimento: é pacto. É o silêncio que se firma entre
mundos. Uma trégua entre a noite e os vivos. Uma pausa naquilo que, de outra
forma, viria cobrar com uivos, assobios e assombrações.
Aqui, a bruxa não cavalga
vassouras — ela veste penas, gira o pescoço como se os olhos pudessem colher o
mundo por todos os lados, e se anuncia num voo cortante que atravessa a noite
como faca sobre tecido.
A Matinta Pereira... ela não
é uma história. Ela é uma presença. E como toda presença antiga e respeitável,
não se oferece a qualquer um.
Na encruzilhada entre o
lirismo nordestino e o pavor sussurrado das noites de lua minguante, ergue-se,
quente e espessa, uma tigela fumegante de mingau de tapioca. E não se trata
aqui de qualquer iguaria trivial de final de tarde — não, senhor. Este é um
prato cerimonial, um convite tácito à paz com o invisível, um acordo silencioso
entre o humano e o encantado.
A MÚSICA COMO PREÂMBULO DE
FEITIÇO
Foi num fim de tarde sem
pressa, entre um gole de café e o descanso dos olhos cansados, que me vi
mergulhado num vídeo no YouTube: estrangeiros ouvindo música brasileira como
quem toca pela primeira vez na pele quente de uma memória que não é sua. O canal
mostrava suas reações, suas expressões pasmas, seus olhos arregalados. Mas o
que me prendeu foi o que disseram — e como disseram.
“Os brasileiros têm um jeito
peculiar de tratar a dor”, observou um deles, meio chocado, meio encantado.
Eles não compreendiam como letras que falavam de abandono, perda e saudade
podiam soar tão dançantes, tão cheias de luz. Como pode uma dor ser cantada
como se fosse festa?
Falaram de Luiz Gonzaga — o
eterno Gonzagão — e riram, espantados, quando “Asa Branca” tocou. Um deles
achou que era música de carnaval. Mas, ficou ainda mais chocado ao saber que a
origem de todo aquele balanço e da sanfona festiva se escondia na dor de um
sertão de secas, e que a Asa-branca não é só uma ave — é um presságio. Uma
pomba do sertão (Patagioenas picazuro), de olhos atentos e voo resignado, que
parte quando o chão racha e o céu se recusa a chover. Seu nome, quase sussurro,
guarda o estalo seco da partida. Quando ela vai embora, é sinal de que o
sertanejo também há de ir.
Na canção de Gonzaga, a
asa-branca não voa sozinha: leva consigo a alma do homem que deixa sua terra,
não por escolha, mas por necessidade. A ave torna-se espelho — símbolo do
retirante que carrega saudade nos ombros e esperança nos calcanhares, partindo
na direção de um verde que só existe na lembrança.
Em seguida, ouviram
Dominguinhos cantando “Eu Só Quero Um Xodó” — uma canção que é ao mesmo tempo
um lamento e uma festa. A suavidade da voz, repleta de carinho e melancolia, se
entrelaçava com o balanço vibrante da sanfona, que parecia pulsar como o coração
acelerado de quem vive só, mas insiste em celebrar a vida. Ali, a tristeza não
se afundava em lágrimas silenciosas, mas ganhava corpo, movimento, dança.
O desejo simples e profundo
— “Eu só quero um amor que acabe o meu sofrer” — era um sussurro cheio de
esperança, um convite para resistir ao vazio com um ritmo que balança entre a
dor e a alegria. Na música brasileira, a tristeza se disfarça de festa, e o
sofrimento encontra nos passos do baile a coragem para continuar, como se o
próprio folclore dançasse entre sombras e luzes, com um sorriso triste e um
olhar que sabe que o viver é essa mistura complexa de dor e encantamento.
Mas foi quando Elba Ramalho
surgiu cantando “Ai Que Saudade D’Ocê” que algo silencioso aconteceu. Um deles
fechou os olhos, como se rezasse para um passado invisível. Outro sorriu, sem
entender direito o porquê. No início, a voz de Elba era uma névoa tênue,
suspensa sobre águas paradas — um sussurro carregado de saudade: “Não se admire
se um dia um beija-flor invadir / A porta da tua casa, te der um beijo e
partir...”
A melodia, lenta e
envolvente, parecia trazer à tona a doçura amarga da ausência, o peso suave do
desejo que não se apaga. Mas quando o ritmo subiu, quando a batida ganhou corpo
e pulsação, todos estremeceram — como se fossem embalados por uma tristeza que
acolhe, que envolve e protege. Sem perceber, haviam tocado o centro do
mistério: o amor que parte, a saudade que fica, o trabalho que afasta, e o
coração que insiste em amar, mesmo quando tudo parece dizer o contrário. Era a
música brasileira em sua essência — uma festa para o sofrimento, um convite
para dançar entre as sombras da memória e a luz da esperança.
Desde então, essa ideia —
uma frase ouvida da boca dos gringos, quase como um alerta: “Os brasileiros têm
um jeito peculiar de tratar a dor” — não saiu mais da minha mente. Carreguei
comigo a urgência de falar dessa “dor alegre”, e agora juntei com o meu desejo
profundo de trazer o mês das bruxas para perto, mas não qualquer Halloween, e
sim um Halloween meu, do meu Brasil, tecido com os fios vivos e antigos do
nosso folclore.
Foi na música, como sempre,
que encontrei a chave para essa busca — aquelas melodias que guardam em si a
alma do nosso chão, o pulsar silencioso e oculto das matas, dos sertões e das
noites imemoriais, onde as histórias se entrelaçam com o vento e o tempo.
E lá estava ela, clara e
forte, como um sopro vindo do Nordeste que não me nega. Na voz inconfundível de
Polyana Resende, nascida no Recife e radicada em João Pessoa, “VaiTimbora”
ganhou vida em 2017, no álbum Samba Teimoso — uma verdadeira celebração sonora
que, no meu ouvido, mistura samba, choro, batuque, uma brasilidade que escorre
como suor quente da terra (Você pode ouvir aqui, sentir a pele arrepiar: https://www.youtube.com/watch?v=tWRw5brbM_E ).
Mais de uma década depois,
em 2025, a magia da música brasileira ganhou novos encantamentos. Do cerrado
goiano, Mariana Froes — ou simplesmente Mari Froes — trouxe à tona um remix de
“Vaitimbora”, uma reinterpretação que reverberou além das fronteiras, conquistando
as pistas de todo o mundo graças a ajuda da bruxaria eletrônica do grupo
francês Trinix, mestres em ressuscitar vozes esquecidas e cotidianas e tecer
feitiços sonoros (ouça : https://www.youtube.com/watch?v=qQ2DZEnVL3k ).
Trinix já havia feito com
que Emoriô, lançada por Fafá de Belém em 1975. A música foi composta por
Gilberto Gil e João Donato, uma joia há muito adormecida — conquistasse
corações distantes, provando que a alma brasileira pode ser tanto raiz quanto
vento que atravessa continentes (veja aqui https://www.youtube.com/watch?v=ZdAb9Ipn9xs ). Agora, com VaiTimbora, eles lançam
uma nova invocação, onde o velho e o novo se encontram, e a ancestralidade
pulsa no ritmo hipnótico e misterioso que só a verdadeira magia pode criar.
Ambas as versões carregam o
mesmo fio invisível — aquele sentimento estranho que causava espanto aos
gringos, como se não pudessem entender o modo com que lidamos com o medo e o
mistério por aqui.
A letra, essa joia de aviso
ancestral, é um convite — um chamado e um alerta — para que se corra dos
perigos que espreitam na mata. Ela canta com voz firme e ancestral, nomeando as
criaturas que habitam nossos medos e nossas histórias:
Pio de sabiá, sariguê
Caxinguelê, maracajá
Voo de matita perê
Saci-pererê, Boitatá
Quando os bichos e seres
Saírem de dentro da mata
fechada
Se ouvirão gritos na noite
Estalos de açoite pela
madrugada
Arrepiou? Vai-te embora
Assobiou, a caipora
Arrepiou? Vai-te embora
Assobiou, a caipora
Assobiou, a caipora
Quando esses seres saem da
mata fechada, dizem as vozes antigas, os gritos ecoam na noite, estalos de
açoite rasgam a madrugada. Se o corpo arrepia, é hora de partir; se ouvir o
assobio, fuja, esconda-se, pois, a Caipora vigia, e o que anda na mata não perdoa.
O refrão ressoa como um
feitiço repetido — um mantra de proteção e respeito:
“Arrepiou? Vai-te embora.
Assobiou, a Caipora.”
Essa canção não é só música,
é um fragmento vivo da mitologia brasileira, que revela uma festa de Halloween
tropical, onde os sustos vêm de dentro da alma da mata, e o mistério é quente,
feito suor e fogo. Ela nos adverte: ouvir o assobio que nasce do nada não é
mero acaso, é o prenúncio de um perigo — e embora os tempos mudem, o medo
antigo permanece vivo, cuidando para que ninguém se esqueça de respeitar as
sombras que nos cercam.
Mas ouça. Escute com
atenção. A letra não é só música. É ritual. Os versos não nomeiam apenas
animais ou lendas — eles invocam. Eles chamam. Eles abrem a trilha para o que
vem do mato escuro, para o que se esconde nas frestas do real.
A canção é um desfile de
mitos em forma de assombro:
a coruja rasga-mortalha
sobrevoando os telhados,
o assovio agudo da Caipora
cortando a mata,
a pegada invertida do
Curupira confundindo o tempo,
a sombra zombeteira do Saci
girando o ar como redemoinho.
E a letra adverte — não com
medo, mas com respeito:
Quando os bichos e seres /
Saírem de dentro da mata fechada,
Se ouvirão gritos na noite /
Estalos de açoite pela madrugada.
Sim, é assustador. Mas é
também belo.
Porque aqui, o medo é uma
parte da festa. Aqui, o assombro dança.
O MENINO DA SERRA E SEUS
ASSOMBROS TROPICAIS
Foi aí que a memória fez seu
próprio assovio. Voltei à serra da Ibiapaba, onde as lendas pareciam mais
assustadoras do que hoje. Onde o silêncio das noites era rasgado apenas pelos
gritos dos bichos e o assobio do vento entre as folhagens.
Falo disso com alguma
intimidade, porque fui criança na Serra da Ibiapaba, um mundo em que o tempo
parecia respirar devagar, como se o relógio esperasse o sol se pôr para contar
suas horas. Naquela época, o mundo era outro — e Guaraciaba do Norte, a cidade
mais alta da serra e de todo o Ceará, ainda guardava uma beleza rarefeita: o ar
era mais fino, mais frio, e à noite, os vagalumes ainda desenhavam constelações
vivas no escuro.
Um dos meus primeiros
horrores veio deles. Não dos grandes mitos, nem das lendas perigosas que eu já
adorava ler — mas de um gesto pequeno, íntimo, cheio de riso infantil. Magal,
diminutivo de Magalhães, era um amigo da família. Tinha um gosto particular por
me pregar travessuras. Uma de suas brincadeiras preferidas era apanhar
vagalumes e colocá-los dentro da minha roupa — pequenos pontos de luz vivos,
fervilhando por dentro da minha camisa, da minha calça. Eu gritava, me debatia,
ficava possesso. Nunca os machuquei — o terror não era contra eles, mas contra
a sensação de ter o escuro aceso dentro do corpo.
Hoje, olhando de longe,
entendo: aquilo era um encantamento. O medo e o riso, juntos, ensinando que o
assombro mora também no que é bonito. Que há algo de profundamente brasileiro
nessa mistura — o susto que brilha, a infância que assovia, a sombra que dança.
Depois dos vagalumes dentro
da roupa, o medo ganhou novas formas: as borboletas gigantes e as mariposas.
Nas temporadas de inverno da
Serra da Ibiapaba, elas apareciam aos montes, pesadas e silenciosas, cobrindo
paredes, varandas e postes de luz. Aquelas asas largas, cobertas de poeira
fina, sempre me causaram um desconforto que beirava o pavor. Diziam que soltavam
pelos capazes de cegar quem as tocasse — e eu, criança, acreditava com devoção.
Bastava imaginar uma delas pousando no rosto, suas asas abertas, os desenhos
arredondados formando olhos onde antes havia olhos humanos — uma metamorfose de
pesadelo, a própria Cuca ou Matinta Pereira disfarçada de mariposa. Corria
léguas quando uma dessas criaturas se aproximava, e havia muitas.
Mas nada, absolutamente
nada, se comparava ao grito das rasga-mortalhas — aquelas corujas escandalosas
que pareciam nascer do próprio vento. Elas apareciam do nada, lançando aquele
som agudo e comprido que, segundo os mais antigos, anunciava a morte de alguém
conhecido. “Quando a rasga-mortalha grita perto da sua casa, é sinal de que
alguém da família vai morrer”, diziam. Não sei se era destino, coincidência ou
o poder do medo que fazia o presságio funcionar — mas, naquela época,
funcionava.
Já adulto, morando no
litoral leste do Ceará, nos anos 2000, comecei a pensar que talvez houvesse
algo mais por trás daquilo — não apenas medo, mas presença, memória, lenda
viva.
O folclore brasileiro está
cheio de bruxas disfarçadas em formas inesperadas. A Cuca, por exemplo, eu
aprendi nos livros de Monteiro Lobato, já vinha na forma de uma jacaroa — um
jacaré fêmeo, figura tão grotesca quanto mágica. Na série do Sítio do Picapau
Amarelo que eu via na infância, ela me parecia engraçada e até simpática, com
seus feitiços atrapalhados; já nas versões mais modernas, vestiram-na de
vermelho, como uma Jessica Rabbit tropical, exagerando no corpo e esvaziando o
mistério. Continuava poderosa, sim, mas de um outro modo — menos encantada,
mais caricata.
Outra bruxa, porém, sempre
me inspirou um medo verdadeiro: a Matinta Pereira. Diziam que se transformava
em pássaro — muitas vezes em uma coruja, uma rasga-mortalha — e que voava sobre
os telhados à noite, pedindo fumo e comida. Quem não atendesse, sofria as
consequências.
Uma das minhas histórias de
terror aconteceu justamente com ela, ou com algo que eu só posso chamar pelo
seu nome. Foi em Aracati, nos idos de 2000, quando eu morava com meu pai.
A casa era um tríplex, e o
último andar, todo aberto, servia de quarto para mim. Era um espaço amplo,
coberto, mas arejado dos dois lados. Além da cama e do banheiro, meu pai havia
colocado ali uma bicicleta ergométrica, pesada como um elefante, e todos os
dias, por volta das seis da tarde, eu subia para pedalar. O sol se despedia, o
vento trazia o cheiro salgado do mar, e — não sei bem por quê — eu sentia olhos
me observando.
Procurava, não via ninguém.
O espaço era aberto, e às vezes eu descia da bicicleta, percorria os cantos,
examinava as vigas. Nada. Voltava a pedalar, fingindo normalidade. Isso se
repetiu muitas vezes, até que, certa noite, ouvi o grito da rasga-mortalha.
Distante, mas inconfundível.
Fez anos desde a última vez
que eu escutara aquele som, e ainda assim ele me atravessou como uma lâmina.
Tentei me convencer de que era apenas um pássaro, mas o som voltou, mais
próximo, até que um grito explodiu acima da minha cabeça, seguido de um voo rasante.
O susto foi tanto que perdi
o equilíbrio e fui ao chão com bicicleta e tudo. O barulho fez meu pai e outros
lá embaixo subirem correndo. Contei que uma coruja me atacara — riram, claro.
Quando desceram, fiquei ali, sozinho, tentando entender o que acontecera. Foi
então que ouvi outro grito. Olhei para o alto e a vi: posada na viga de
madeira, enorme, de penas densas e olhos de fogo.
Naquele instante, entendi:
era a Matinta Pereira, e estava me pedindo comida. Pedi licença em voz baixa,
desci, peguei alguns biscoitos e voltei. Coloquei-os sobre o parapeito e me
afastei. Ela mergulhou num voo rápido, passou rente ao meu rosto — o vento das
asas quase um toque — e, com delicadeza sombria, pegou os biscoitos e sumiu na
noite.
Desde então, vez ou outra,
percebo sua presença.
Às vezes, voltando das
madrugadas de Canoa Quebrada, sintia seu olhar me seguindo — aquele pescoço
girando devagar, os olhos que me acompanham sem mover o corpo. E era ela. A
pelagem era única — escura, quase líquida sob a luz pálida — e talvez as penas sejam,
afinal, as digitais dos pássaros, a marca invisível que os distingue como a nós
o destino.
Não sei. Só sei que, desde
aquele dia, sempre que algo estranho acontece, e eu ouço aqueles gritos,
preparo uma pequena oferenda: um pedaço de pão, um biscoito, qualquer coisa que
traduza respeito. Porque se a Matinta Pereira resolve aparecer, o mínimo que se
pode fazer é saudá-la com deferência.
Não sei se vocês já viveram
algo assim, algo que mistura o folclore e o real, o sagrado e o medo. Eu apenas
agradeço por ainda ter minha cabeça inteira — vocês já viram o tamanho das
garras de uma coruja? São lâminas de silêncio. E há também o pescoço — aquele
movimento impossível, girando devagar, me acompanhando com os olhos sem sair do
lugar. Um gesto tão pequeno e, ainda assim, assustador o bastante para congelar
o fôlego.
Desde então, aprendi a aceitar: há visitas noturnas que não se explicam, apenas se acolhem. E, quem sabe, respeitar o medo seja a mais antiga forma de sabedoria que herdamos dessas terras. Um pouco de comida, um gesto de respeito. Afinal, o Brasil é um país onde as sombras ainda têm fome — e, às vezes, nos observam de cima, esperando o momento certo de pedir o que é delas.
O MINGAU DE TAPIOCA: RECEITA PARA SOBREVIVER A UMA VISITA NOTURNA
Não se negocia com o
sobrenatural de barriga vazia.
Por isso, a receita vem como
antídoto. Uma oferenda fumegante. Uma prece em forma de mingau.
Sendo honesto, se a Matinta
Pereira resolvesse passar aqui hoje, talvez eu estivesse em apuros — as compras
ficaram para amanhã, a despensa está quase vazia, e tudo que tenho é um
restinho de mingau de tapioca, ainda quente, ainda doce, ainda mágico.
Não sei se a Matinta Pereira
gosta de mingau. Para ser honesto, nem eu gosto de todos — tem uns que fazem a
gente torcer o nariz antes mesmo do cheiro subir da panela. Mas, às vezes,
quando bate uma doida inexplicável, eu me vejo ali, no meio da cozinha, quase
em transe, preparando um mingau como quem invoca alguma coisa antiga. Talvez
seja feitiço da Cuca, talvez sejam travessuras do Saci, talvez só saudade
disfarçada de fome.
Mas há um segredo que agora
precisa ser revelado: meu mingau de tapioca é outro bicho. Não é aquele mingau
sofrido, ralo, com gosto de infância doente. Não. O que eu faço tem alma de
sobremesa — daquelas que ninguém torce o nariz. É cremoso, quente, levemente
doce, com o brilho pálido das pérolas de tapioca se abrindo translucidas no
leite como se fosse neve derretendo. Um feitiço branco.
Então, se a Matinta resolver
aparecer por aqui hoje... talvez ela sorria torto, mas aceite. Porque até o
sobrenatural reconhece quando há afeto no fundo da panela. E, a gastronomia da sobrevivência é também
feitiço aprendido com o tempo — e com um pouco de manteiga de garrafa, uma
pitada de sal e a lembrança certa, até o improviso vira ritual. Porque há
visitas que não se recebem com explicações: se recebem com comida, com
respeito, e com um certo tremor nas mãos.
Hoje entendo que a Matinta
Pereira não é vilã — ela é ancestral. Ela não vem para levar, mas para lembrar.
Ela nos visita para dizer: “Você se esqueceu da mata. Do canto. Da história. Da
sua avó que acendia a lamparina. Do cheiro do mingau. Do medo que te mantinha
vivo.”
Ela pousaria com aquele
pescoço de giros infinitos, os olhos flamejando calma. Avaliaria a cremosidade
do mingau com a autoridade de quem já viu panelas ferverem em séculos que
esquecemos. Talvez torcesse o bico para a quantidade de canela — caso fosse, como
o chef Erick Jacquin, injustamente contra essa especiaria mística —, mas
aceitaria a oferenda. Porque ali, naquele prato, está tudo o que ela precisa:
memória, medo, doçura — e o meu reconhecimento de que o Brasil é mais encantado
do que parece.
E se ela aceitasse?
Talvez puxasse uma cadeira
com as garras. Talvez falássemos sobre os novos tempos, sobre como os
redemoinhos estão ficando raros e como os meninos de uma perna só agora correm
nos videogames, invisíveis.
Talvez ela me contasse o que
comeu na última casa que visitou. Talvez gargalhasse, rouca, pousando as mãos
sobre a barriga cheia.
Talvez eu perguntasse o que
ela é de verdade. E talvez ela não dissesse — apenas me olhasse. E isso
bastaria.
Então eu te alerto:
Ouviu um assovio agora? Melhor correr pra cozinha. E capricha. Porque respeito se serve quente...
MINGAU DE TAPIOCA PARA MATINTA PEREIRA
1 litro de leite frio (como o sopro da madrugada na serra)
1 xícara de leite de coco (a gordura dos
sonhos)
1 xícara de tapioca granulada (precisa
ser a tapioca granulada ou aquela em pérola/sagu, fazer com aquela de tapioca
comum, fininha não funciona do mesmo jeito)
1 pitada de sal (como se faz com todo
feitiço)
¼ de xícara de açúcar (doce, mas não demais
— ela não gosta de exageros)
5 cravos (olhos de bicho encantado)
1 pau de canela (para espantar o que a
gente não entende)
Canela em pó (porque toda oferenda
precisa de um toque final de mistério)
Preparo: Coloque o leite frio numa
panela funda. Junte o leite de coco, a farinha de tapioca, uma pitada de sal, o
açúcar, os cravos-da-índia e o pau de canela. Leve ao fogo médio. Quando
começar a ferver, abaixe o fogo e mexa com calma, sem pressa, até a mistura
engrossar e perfumar a cozinha inteira. Quando estiver no ponto — cremoso,
quase querendo se apegar à colher — despeje em uma tigela grande ou em canecas
individuais. Polvilhe com canela em pó, e sirva bem quente.
Dica: eu gosto muito de castanhas. Então, quando o mingau ainda está quentinho no meu prato, salpicado com canela generosa, costumo jogar por cima umas castanhas de caju torradas e picadas. Às vezes, lascas de coco. Fica com cara de sobremesa de festa — daquelas que ninguém torce o nariz.
















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