Eu adoro sopas. E tem
dias, que uma sopa é a única coisa que serve para me confortar. Muitas vezes,
achamos que este tipo de preparação trata-se de, apenas, um grande misturado de
ingredientes e esquecemos, muitas vezes, importantes historias por trás dos
preparados, que influenciaram determinada cultura e carregam o prato com uma
força inigualável. Pesando nisso, hoje resolvi falar de uma sopa (sei que vai
ter gente que não gosta de sopa torcendo o nariz) que eu adoro: el chupe de camanones.
El Chupe é uma sopa
típica de Arequipa, no sul peruano, el
chupe de camarones é uma
preparação das que mais gosto, daquela região: talvez, pelas cores, pela
energia que me dá – mas, certamente, pelo delicioso sabor. El chupe nada mais é do que sopa de camarões, de origem mestiça, já
que sua origem está enraizada com a chegada dos colonizadores espanhóis.
A receita da sopa nos
faz lembrar à bisque de camarão, uma
sopa francesa com manteiga, creme de leite e conhaque; e ao "chupi", um guisado que existia nestas
terras desde tempos pré-hispânicos. O resultado, uma feliz e deliciosa
descoberta, que veio com adaptações: obviamente, os Incas tinham suas sopas e
ensopados, mas os espanhóis adicionaram outros ingredientes nessa mistura. Essa
sopa começa a ter registro apenas no início do século 19, na região de Callao.
No entanto os camarões de Arequipa, símbolo daquela região, deixou a receita
ainda mais conhecida. Inicialmente, essa sopa era consumida em casa, nos fins
de semana, mas pelos idos de 1950 a 1970 tornou-se popular nos restaurantes.
El chupe pode ser preparado com carne bovina, cordeiro,
frango, peixe e camarão, batatas, cereais, legumes como abóbora e batata-doce,
cozidos e acompanhado por uma pasta feita com alho, cebola, pimentão e
especiarias - sua versão mais primitiva só incluía batatas, pimentões e ervas.
Mas com a chegada dos espanhóis arroz, queijo, ovos e leite foram introduzidas.
Para chupar você pode adicionar carne bovina, cordeiro, frango, peixe e
camarão.
O termo chupe, deriva de um nome hispanizado de
um antigo ritual peruano. Diz uma antiga lenda peruana que, quando os filhos
dos chefes guerreiros atingiam a puberdade (entre 13 e 14 anos) eram submetidos
a jejum como parte de treino de guerra. Durante 15 dias, os jovens não podia comer
outras coisas que não fosses, bolos de farinha de milho, chicha (um refresco feito de milho roxo) ou água alimentos. E,
culminando a proeza, donzelas eram escolhidas e aproximavam-se deles com as
partes intimas untadas com uma substância feita a base de tomate, pimenta,
cravo de defunto e outras ervas como muña,
para que os rapazes chupassem. Esta cerimónia era chamada Chupe, pelo ato que o rapaz exercia, e significava que o jovem
tinha deixado a inocência, ido para a realidade do prazer humanos, estando pronto
para ser um guerreiro.
Felipe Mejía,
autoridade no estudo da cozinha peruana, em seu livro "De cocina peruana, Exhortaciones",
Afirma que o camarão foi um dos primeiros alimentos dos peruanos, sua carne
delicada e saborosa era de uso exclusivo de reis incas. Se pescava a milhões de
anos e para sua extração os antigos peruanos se valiam de uma espécie de rede
chamada atarraya, assim como cesta de
cana, chamadas izangas.
Os primeiros Chupes de Camarones receberam o nome quechua de Chuwa Masi, que significa "sopa amiga" ou "sopa
companheira de festa". Muitas
pessoas dizem que não existe sopa peruana mais bonita que esta, mas sabe-se que
não há região peruana que não tenha el Chupe, porque a preparação foi herdada
da cozinha dos Incas, que saboreavam o preparado feito por Kery Awicha, a deusa
da cozinha Inca, que tinha o encargo de "cozinhar para preencher a alma e
depois o estômago."
Talvez, a culinária
peruana me encante mais ainda, por ter sempre a mitologia para lhe dar
misticismo. Não bastasse a imaginação reproduzindo uma cena da deusa inca da
cozinha preparando el Chupe, mas há
uma lenda que explicaria todo o encanto e sabor inigualável que tem a comida
peruana. Fico sempre contente quando encontro preparações que, a partir dos
saberes antepassados, as pessoas sempre buscaram o melhor – em todos os
sentidos.
Em todas as mitologias
conhecidas pela história existe sempre um mensageiro dos deuses. Esses
personagens importantes do mundo mitológico têm certas características
semelhantes: são seres geralmente amigáveis, simpáticos, bem desenvolvidos na
sociabilização, extrovertidos, sensíveis, qualidades essas que em conjunto lhe
permite ganhar a confiança de deuses e homens.
Na mitologia peruana
não seria diferente. No entanto, aqui o mensageiro dos deuses não tem forma
humana, mas de ave, mais exatamente um beija-flor (colibri), e tinha
características similares aos demais mensageiros mitológicos: inteligência,
simpatia, sociabilidade, mas o mensageiro dos deuses peruanos, Chiwake, tem
ainda mais estilo, como pronunciarei com base em uma lenda extraída da tradição
oral da região Sul peruana, exatamente de Nasca, e tem cerca de 2.500 anos de
tradição.
Certa manhã de um
rigoroso inverno, os deuses estavam reunidos formando o antigo Peru, decidiram
atender aos pedidos dos homens que solicitavam maior quantidade e qualidade de
alimentos. Os deuses enviaram com Chiwake, o mensageiro divino, um caldeirão
mágico de onde sairiam as mais deliciosas sopas já conhecidas.
Mas Chiwake era
Travesso e brincalhão e acabou perdendo pelo caminho o tão afortunado presente.
Com remorso pelo descuido, se apresentou ante os homens e lhes disse que os
deuses queriam que ele mesmos preparasse seus alimentos e lhes ensinou como
escolher cada ingrediente, como combinar sabores e aromas de mil maneira
diferente e apresentá-los com elegância e harmonia. Desta maneira, os peruanos
aprenderam a cozinhar com a mesma arte e tecnologia dos deuses. Isso explicaria
por que a comida peruana tem tanto sabor, já que aprenderam o oficio com o
representante divino, e assim, pode-se dizer, que cozinham como os deuses.
. Assim, se construiu a
história peruana desde os tempos pré-Inca, com conceitos mágicos e religiosos
que fizeram nascer as primeiras opiniões sobre as leis da natureza. Em todo o
antigo Peru foram surgindo inúmeros deuses, os bons se unem a vida, a saúde, a
alimentação, os maus a enfermidade e a fome. Começou-se a relacionar
sistematicamente vida e morte com fenômenos naturais, por exemplo o dia e o
calor são associados com a saúde e o positivo, e a noite e o frio com a
enfermidade e o negativo.
Os deuses enviavam
espíritos malignos para pegar os corpos designados por má conduta, geralmente
por terem um juízo passional. Para contrariar esta energia negativa existiam os
deuses que protegem a natureza, alimentam a evolução, alimentam e se encarregam
de curar o corpo humano.
Alguns personagens
muito importantes, ao longo da história têm sido os magos, feiticeiros,
curandeiros e sacerdotes, com diferentes características, nomes e graus de
aprendizagem - mas com um denominador comum, muito especial - eram os intermediários
do divino na terra. Representam o veículo de comunicação entre a triste
realidade do enfermo, do faminto, do amor não correspondido, da esperança de
cura, da satisfação, mediante os poderes supremos que poderiam transformá-los a
uma simples vontade. Este esquema básico
teve grande importância no âmbito social, político e econômico. Tais
personalidades se encarregaram de concentrar em uma elite exclusiva de
conhecimento e práticas referentes a atividades dedicadas a recuperação da
saúde e da alimentação do corpo e da alma.
As cerimônias e ritos
foram melhorados pela adição de simbolismo e protocolo, que misturam sonhos e
realidade com a firme intenção propósito de ocultar, de maneira sistemática, as
evidências naturais encontradas como causas, para enfatizar apenas os aspectos
mágicos e religiosos, transformando-os em instrumentos de grande poder. Sempre
a atitude humana sempre foi fundamental para enfrentar doença e desespero. Com
o mesmo conceito e realidade, no mundo da gastronomia, atitude, personalidade,
cultura e simpatia do chef influenciam na magia que envolve uma boa mesa, sem
dúvida, o sabor, aroma, textura e cor são presentes dos eternos deuses do bem.
Bom, agora que a
historinha foi contada, que tal preparar essa sopinha deliciosa. Garanto que
você vai viciar. E, quando for ao Peru, não esqueça de provar el Chupe
original.
½ quilo de camarão
4 batatas inglesas
2 ovos
1 espiga de milho cortada em pedados
¼ xícara de favas ou de ervilhas
¼ xícara de arroz
1/2 xícara de leite
½ xícara de queijo (do seu gosto, mas queijo
prato fica muito bom) em cubos ou ralado
1cebola
1 tomate
1 colher de chá de alho picado
2 colheres de sopa de pimenta-aji (uma pimenta
tradicional peruana, mas coloque a que tiver)
¼ xícara de óleo ou azeite
1 colher de sopa de manteiga
Um raminho de Huacatay (uma erva tradicional
peruana parecida com a hortelã, na falta use esta última), hortelã, orégano,
salsa, pimenta do reino, sal a gosto.
4 xicaras de agua
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